Análise de pedidos de patentes de medicamentos deve ser retomada com acordo entre Anvisa e INPI

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Instituições assinaram portaria conjunta definindo as atribuições de cada entidade nesta atividade

 

BRASÍLIA - A análise de pedidos de patentes de medicamentos deverá ser retomada no Brasil. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) assinaram nesta quarta uma portaria conjunta definindo as atribuições de cada entidade nesta atividade, colocando fim a um impasse que se arrasta há mais de uma década. Ao longo dos anos de paralisia,  30 mil pedidos de patentes se acumularam (23 mil no INPI e 7 mil na Anvisa). O acordo entre as duas entidades foi antecipado pelo Estado há um mês.

 

A rapidez  na análise de patentes de medicamentos está longe de ser um problema apenas da empresa fabricante. Quanto maior o tempo para que o pedido  seja analisado, maior a demora  para a entrada no mercado de versões genéricas do produto, que por lei são  mais baratas.

 

Há pedidos de patentes de medicamentos que esperam anos para começar a ser avaliados. Somente depois da análise completa e da patente concedida é que o prazo da patente, de 10 anos, começa a ser contado. "Com a indefinição, em alguns casos é necessário esperar 15, 16 aos para a entrada de um genérico no mercado", afirma o diretor da Anvisa, Jarbas Barbosa.

 

Os prejuízos são incalculáveis. Um estudo feito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro dá, no entanto, alguns indicativos sobre  o impacto da demora. A análise mostrou que, o Sistema Único de Saúde teve um prejuízo de R$ 2 bilhões com a extensão da patente de apenas sete medicamentos.

 

O presidente do INPI, Luiz Pimentel, afirmou não haver estimativa sobre quanto tempo será necessário para que todo o passivo seja resolvido, com o novo formato de análise definido pela portaria. Especialistas ouvidos pelo Estado afirmam que essa é uma tarefa para vários anos.

 

A polêmica entre Anvisa e INPI teve como ponto de partida um mecanismo previsto em lei que permitiu à Anvisa opinar sobre os processos para concessão de patente de remédio, a chamada anuência prévia. O INPI considerou a mudança como uma espécie de "intervenção" em seu trabalho. Isso porque a avaliação da Anvisa era feita somente depois da avaliação do INPI.

 

A portaria assinada nesta quarta determina que caberá à Anvisa analisar apenas  se o produto cuja patente é reivindicada poderia trazer algum tipo de risco  à saúde. Caberá ao INPI analisar os critérios de patenteabilidade: se o produto é inovador, se houve uma atividade inventiva para que ele pudesse ter sido produzido e se o produto tem aplicação industrial.

 

Em 16 temas, considerados de fronteira e de grande interesse para saúde pública, a Anvisa deverá fazer um parecer, para que haja um entendimento comum. Nesses casos, a análise vai além dos critérios de risco à saúde. Nesta lista está, por exemplo, a patente de segundo uso. Assim são chamados os remédios já patenteados para um determinado uso que acabam sendo alvo de um novo pedido de patente, desta vez, para tratamento de novas doenças. 

 

Entidades que lutam pelo maior acesso da população a medicamentos condenam essa estratégia e afirmam que ela é apenas um recurso para estender ao máximo o direito de estender ao máximo a patente do medicamento - e, com isso, o monopólio do mercado.

 

O diretor da Anvisa, Jarbas Barbosa, afirma que o fim da anuência prévia não reduz o poder da Anvisa. "A agência foi criada para fazer todo o processo de análise, de registro, de monitoramento de medicamentos. Não é de interesse da agência e nem da sociedade que a Anvisa tente ser um segundo INPI. Isso é bom para instituição, ela se fortalece."

 

O coordenador do Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids, Pedro Vilardi, no entanto, criticou o novo formato proposto e o fim da anuência prévia. "Essa mudança foi feita sem nenhuma transparência, sem ouvir os setores interessados. Patente de medicamentos envolve acesso", observou. Vilardi disse temer que, com a redução da participação da Anvisa, pedidos de patentes que, em tese, não deveriam ser deferidas acabem sendo aprovadas pelo INPI. "Ao longo dos anos da anuência prévia, ficou claro que a Anvisa tinha critérios mais rígidos para fazer a análise."

 

A presidente da Pró-Genéricos (associação que reúne produtoras de genéricos), Telma Salles, por sua vez, comemorou a portaria. "O impasse terminou, as análises foram retomadas. Isso traz mais tranquilidade para o setor", afirma. Para Telma, o argumento de que o fim da anuência prévia aumentaria risco de concessões de patentes indevidas, não justificaria uma participação maior da Anvisa. "Hoje temos paralisia. Isso é muito pior", disse. Ela argumenta que, em casos de patentes indevidas serem concedidas, há a possibilidade de se recorrer à Justiça. "Há outros mecanismos. Do jeito que está, estamos imobilizados."

 

Lígia Formenti

 

 

Fonte: Estadão (12.04.2017)


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