Proposta de reforma extingue tributos e reduz burocracia

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O deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR) vem percorrendo o país em busca de apoio para colocar de pé uma proposta que prevê mudanças profundas nas regras tributárias da União, Estados e municípios. A reforma, segundo ele, facilitaria a vida do contribuinte, com menos impostos e burocracia, reduzindo não só o contencioso, mas também a sonegação (hoje estimada em R$ 460 bilhões) e a elisão fiscal (que chega a R$ 3 trilhões).

 

Para o deputado, a origem de tantos questionamentos na Justiça e na esfera administrativa – processos que somam R$ 2 trilhões – é o "manicômio tributário" em que se transformou o sistema de arrecadação de impostos e contribuições do país. Hauly – que já foi relator das proposições que criaram o Simples Nacional e o Microempreendedor Individual e das duas leis de S.A. – vem pregando a simplificação.

 

A proposta é por uma mudança radical. Toda a base de consumo (ISS, ICMS, IPI, PIS/Cofins, Cide e Salário-educação) seria extinta. Esses sete tributos dariam lugar a um único: o Imposto sobre Valor Agregado (IVA). A competência tributária desse imposto único seria dos Estados.

 

Seria cobrado no princípio do destino e com alíquotas por fora – sem imposto sobre imposto. O IVA, no entanto, seria regulado por lei federal e a cobrança seria centralizada. O deputado propõe que, para isso, seja criado um "SuperFisco". O órgão reuniria auditores estaduais e ficaria com a responsabilidade de tributar, arrecadar e fiscalizar. Seria, segundo Hauly, uma forma de acabar com a guerra fiscal.

 

Os municípios perderiam o ISS, que seria incorporado ao IVA, mas ficariam com todos os impostos de propriedade: IPVA, IPTU, Imposto sobre Propriedade Territorial Rural (ITR), Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) e Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI).

 

Já a União teria sob a sua competência o Imposto de Renda, com a absorção da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, a CSLL. E outros dois novos: o Imposto Seletivo Monofásico – que incidiria sobre energia elétrica, combustíveis, comunicações, transportes, cigarros, bebidas, veículos, pneus e autopeças – e uma contribuição social sobre operações financeiras (uma espécie de nova CPMF), que substituiria o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).

 

Hauly, que recentemente havia se manifestado contra o retorno da CPMF, justifica que a contrariedade se deu pela "mera função arrecadatória do imposto". Agora, defende, teria um outro propósito: permitiria reduzir alíquotas da contribuição previdenciária sobre a folha de salários.

 

Ele argumenta ainda que o novo formato possibilitaria reduzir a quase zero a tributação de remédios e alimentos. "A carga tributária dos medicamentos é de 33% e a dos alimentos também mais de 30%. Uma família com renda de R$ 2 mil e que gasta R$ 1,2 mil com esses dois itens teria uma economia de cerca de R$ 300 com a desoneração. Seria uma grande injeção de dinheiro na economia do país", disse o deputado em apresentação do projeto ao Conselho Superior de Direito da Federação do Comércio do Estado de São Paulo (FecomercioSP).

 

Equipamentos e máquinas, pela proposta do parlamentar, também ficariam livres de impostos. Esse, afirmou Hauly, seria o plano de desenvolvimento industrial para todas as regiões do país.

 

O novo sistema tributário seria completamente regulado por leis federais. Segundo o deputado, a equipe que trabalha no projeto deve apresentar, juntamente com a proposta de reforma tributária, cerca de 12 leis infraconstitucionais, que vão regular os novos impostos. Um relatório prévio já foi apresentado na Comissão Especial da Reforma Tributária, na Câmara, às vésperas do Carnaval e com pouco quórum.

 

Como haveria a alteração do sistema como um todo – e extinção de tributos -, teriam de ser feitas alterações na fiscalização, de acordo com a proposta. Além da criação de um "SuperFisco", haveria mudanças no trabalho da Receita Federal. O órgão passaria a ter sob o seu escopo somente a tributação, arrecadação e fiscalização do Imposto de Renda, do Imposto Seletivo Monofásico e das contribuições ao INSS.

 

"A desburocratização será radical", afirmou o deputado Hauly no evento da Fecomercio. "Algumas empresas, hoje, chegam a ter mais de 30% dos seus escritórios dedicados à burocracia tributária. Esse é o caos que nós estamos enfrentando", acrescentou.

 

Para o advogado Ives Gandra Martins, que preside há quase 30 anos o Conselho Superior de Direito da FecomercioSP, a confusão tributária é tão grande que, atualmente, nenhum consultor jurídico consegue assegurar com certeza uma solução tributária aos seus clientes. "Pega-se, por exemplo, um tributo simples, como o que rege o PIS e a Cofins, e o que nós temos? Uma tal complicação que qualquer advogado tem muitas vezes insegurança em dar o conselho", ponderou.

 

Ives Gandra pediu ao parlamentar que encaminhasse cópia das apresentações para que os conselheiros pudessem estudá-la. Antecipou, contudo, que "valeria a pena o apoio da entidade, que tem 156 sindicatos em sua composição", a uma reforma que consiga equalizar dois dos que considera os principais problemas: a simplificação do sistema e o combate à guerra fiscal.

 

A equipe econômica do governo, por sua vez, vem defendendo uma reforma mais suave, fatiada. A primeira parte seria a simplificação do PIS e depois da Cofins. Por último, mudanças no ICMS.

 

Hauly, no evento da Fecomercio, classificou como "bobagem" a reforma pontual. E ele foi ouvido pelo assessor especial da Presidência da República, Gastão Alves de Toledo, que também estava no local.

 

Gastão, ao contrário do que especula-se no governo, afirmou que seria mais interessante se o Executivo, em vez de apresentar uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC), apoiasse um projeto que partisse do Legislativo. "O Congresso estuda esse assunto há 25 anos e os trabalhos produzidos são muito bons", disse aos que estavam presentes no evento.

 

Ele deu a entender que haveria apoio ao projeto do deputado. Primeiro elogiou a proposta: "Hauly tem um projeto bastante bom." E, depois, falou em trabalhar em conjunto com o parlamentar, com a Receita Federal e com a Fazenda. "É uma medida que poderá surtir efeito quando houver condições políticas ideais para que isso seja implementado."

 

O assessor especial do presidente Michel Temer entende que há necessidade de a proposta ter o apoio dos governos estaduais. "Porque estamos mexendo exatamente no maior imposto brasileiro, que é o ICMS", disse.

 

Ele acrescentou que "uma das tarefas do grupo de trabalho é encontrar uma fórmula para que não haja perda de receita na mudança do sistema". "As mudanças implicam em uma fase de transição e essa fase de transição tem que ser muito bem estudada para que não existam solavancos", afirmou.

 

Mas a reforma tributária, segundo Gastão, ainda "está na fila". Ele tratou o assunto como sendo o terceiro da lista de prioridades do governo: depois da reforma da Previdência Social e das mudanças na legislação trabalhista. "Os esforços agora estão direcionados para isso. O que quer dizer que nós não vamos enviar ao Congresso nenhuma proposta [de reforma tributária] ou apoiar alguma proposta do Congresso antes que se resolvam."

 

O deputado Luiz Carlos Hauly frisou que, mesmo "chegando atrasada", a reforma deve tramitar com rapidez no Congresso. Isso porque em vez de começar do zero, seria incluída como um projeto de conversão a uma PEC aprovada em 2007 nas comissões temáticas. Essa PEC, antiga, teve a relatoria do ex-deputado peemedebista Sandro Mabel e já previa a criação de um IVA.

 

Se a proposta for incluída como substitutiva, irá direto à votação nos plenários da Câmara dos Deputados e do Senado.

 

(Joice Bacelo | De São Paulo)

 

Por Joice Bacelo | De São Paulo

 

 

Fonte : Valor Econômico (20.04.2017)


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