Bovinos geram biogás em fazendas do Paraná

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Com 10,5 mil habitantes, o município de Céu Azul, localizado no Oeste paranaense, abriga a primeira experiência brasileira de fornecimento de esterco de gado leiteiro para a rede pública de energia. "Pode parecer muito investir R$ 300 mil num sistema que trará economia mensal de R$ 2,5 mil/mês, mas estamos resolvendo um problema ambiental", justifica Mario Sossella, proprietário da fazenda StarMilk, onde o processo foi implementado.

 

As 400 vacas em lactação da propriedade de 900 hectares produzem 13 mil litros de leite por dia e geram cerca de 80 toneladas diárias de estrume. O destino dos dejetos era a compostagem, para adubar as plantações próprias de milho e soja. Mas parte do material orgânico poluia os cursos d´água da bacia Paraná 3, que abastecem a hidrelétrica Itaipu Binacional. "Em vez de nos multarem, os técnicos trouxeram a solução", diz Sossella.

 

Dois terços do investimento foram para o sistema de biodigestão onde se forma o gás, e para o gerador de 40 kVA, que produz a energia. Os R$ 100 mil restantes pagaram o sistema bidirecional que, em momentos de baixo consumo, remete o excedente da fazenda para a Companhia de Energia do Estado do Paraná (Copel), invertendo o fluxo, quando o consumo da fazenda supera a produção. "A Copel paga a diferença entre o que fornecemos e o que consumimos".

 

A produção de energia com biogás para uso próprio já era realidade, sobretudo em suinoculturas, informa a assessoria de comunicação da Copel. Mas, para viabilizar o encaminhamento da eletricidade à concessionária de energia, foram necessários ajustes nas redes elétricas. Algo bem mais complexo do que ocorre com a cogeração das usinas de cana-de-açucar, sistema produtivo mais concentrado.

 

Só no Paraná existem 350 mil pequenas e médias suinoculturas que podem agregar renda com a atividade. Na busca de volume de produção, começam a ser testados os condomínios de produtores de energia a partir do biogás. A ideia é que gasodutos de pequeno porte façam a interligação entre as propriedades e uma única unidade geradora de energia.

 

Com autorização prévia da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), além da StarMilk e da Granja Colombini, também foram contratadas como fornecedores de energia a companhia de saneamento do Paraná (Sanepar) e a Cooperativa Lar. Com vigência até 2012, as iniciativas somam a capacidade de 524kW, com remuneração de cerca de R$ 128 o MWh.

 

Apesar de capturar metano, um gás de efeito estufa (GEE) 21 vezes mais danoso ao aquecimento global que o CO2, o projeto com bovinos ainda não pode ser enquadrado como Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), para venda de créditos de carbono. Isso porque não há metodologia validada como a que existe para as usinas de cana-de-açúcar e granjas de suínos. Apresentado em 19 de agosto, o mais recente relatório da Comissão Interministerial de Mudança Global do Clima do Brasil revela que a captura do metano em atividades de suinocultura já representa 15% do número de projetos brasileiros de MDL, à frente dos aterros sanitários, que somam 9%.

 

Já, entre os projetos de geração de energia aprovados, quase um terço da capacidade instalada, de 3,5 mil MW, corresponde à cogeração com biomassa. Volume próximo ao da energia gerada por hidrelétricas (36%), mas ainda pequeno diante do potencial existente com o uso do biogás para gerar energia. Essa perspectiva foi identificada no estudo ´Agroenergia da Biomassa Residual´, produzido pelos especialistas Cícero Bley Jr., José Carlos Libânio, Maurício Galinkin e Mauro Márcio Oliveira, com apoio da Itaipu Binacional e da Organização para a Alimentação e a Agricultura (FAO).

 

A partir de sistemas de produção animal em estábulos, os pesquisadores concluíram que o país poderia produzir 12 bilhões de kWh/ano a partir do biogás. Seria o suficiente para abastecer uma cidade com 4,5 milhões de habitantes. Em percentuais, equivaleria a 2,4% da oferta de energia no Brasil, ou à capacidade de produção da futura Usina de Jirau, no Rio Madeira (RO), cuja construção deve consumir R$ 13 bilhões. Ainda segundo eles, ao contrário do que acontece com a construção da barragem, o processo mitigaria impactos ambientais e sequestraria 71,3 milhões de toneladas de CO2 por ano (TCO2e).

 

Os aterros sanitários também são subaproveitados em processos de sequestro de metano. Segundo especialistas, cerca de cem aterros brasileiros poderiam se candidatar ao MDL, mas menos de um terço investiu na opção. Destes, uma minoria se propõe a utilizar o metano para gerar energia.

 

Dados do Panorama dos Resíduos Sólidos do Brasil 2008, elaborado pela Associação Brasileira das Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), mostram que o volume de resíduos sólidos despejados nos aterros sanitários, e não em lixões ou aterros controlados, subiu de 38%, em 2007, para 54,9% no ano passado. De outro lado, caiu de 3.593 para 3.109, o número de municípios com programas de coleta seletiva no Brasil, o que poderia ter reflexos no volume de materiais aterrados. A pesquisa tem como base uma amostragem em 352 municípios das cinco regiões do país, onde vivem 53% da população brasileira. (S.C.)
 


Veículo: Valor Econômico


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