Segundo o IPEA, a elevação dos preços da comida pesa mais no bolso dos mais vulneráveis
A inflação sentida pelos brasileiros mais pobres foi equivalente a quase o dobro da verificada entre os mais ricos no começo de 2022, aponta estudo mensal divulgado nesta terça-feira (15) pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).
Em janeiro, o avanço dos preços atingiu 0,63% para as famílias com renda considerada muito baixa. Enquanto isso, as famílias com renda alta tiveram inflação de 0,34% no mesmo período, diz o instituto.
Conforme o Ipea, a alta entre os mais pobres foi influenciada especialmente pela carestia de alimentação e bebidas. O segmento respondeu por quase metade da inflação do grupo com menos recursos (0,31 ponto percentual).
A compra de alimentos costuma consumir uma parcela maior do orçamento das famílias com renda mais baixa. Por isso, a elevação dos preços da comida pesa mais no bolso dos mais pobres.
Em janeiro, houve aumentos em produtos como cenoura (27,6%), laranja (14,9%), banana (11,7%) e batata (9,7%), além das carnes (1,3%), do café (4,8%) e do óleo de soja (1,4%).
A alta dos alimentos in natura ocorreu em meio aos efeitos adversos do clima no país. Enquanto estados como Minas Gerais e Bahia sentiram os reflexos de chuvas intensas, a região Sul amarga estiagem na largada de 2022.
O estudo do Ipea mede a inflação de acordo com seis faixas de renda domiciliar. As famílias com rendimento considerado muito baixo recebem menos de R$ 1.808,79 por mês.
A outra ponta da lista é ocupada pela renda alta, cujos integrantes têm ganhos superiores a R$ 17.764,49.
Na margem, as seis faixas tiveram desaceleração nos preços de dezembro para janeiro. Ou seja, os aumentos continuaram, mas em um ritmo menor na média.
Na renda muito baixa, a inflação passou de 0,74% para 0,63%, a maior da pesquisa. Já na camada mais alta, a alta dos preços pulou de 0,82% para 0,34%, a menor do levantamento.
Em parte, a perda de fôlego dos preços para os mais ricos foi influenciada pelos recuos de combustíveis, como gasolina (-1,1%) e etanol (-2,8%), das passagens aéreas (-18,4%) e do transporte por aplicativo (-18%).
ALTA EM 12 MESES É MAIOR PARA RENDA MÉDIA-BAIXA
O estudo do Ipea também traz o acumulado de 12 meses até janeiro. Nesse recorte, a maior inflação foi a das famílias de renda média-baixa, com taxa de 10,8%. Até dezembro, estava em 10,4%.
O grupo de renda média-baixa é formado por brasileiros com rendimento domiciliar entre R$ 2.702,88 e R$ 4.506,47 por mês.
A segunda maior variação em 12 meses é observada na faixa de renda média (10,6%), que reúne famílias com ganhos entre R$ 4.506,47 e R$ 8.956,26. Nesses grupos, há fortes influências da inflação de transportes e de habitação.
A taxa acumulada pela renda muito baixa foi de 10,5%. Está acima da variação registrada em 12 meses pelo grupo de renda alta, de 9,6%, a menor do estudo.
“Os dados desagregados revelam que, para as famílias de renda mais baixa, a maior pressão inflacionária nos últimos 12 meses reside no grupo de habitação, impactado pelos reajustes de 27% das tarifas de energia elétrica e de 31,8% do gás de botijão. Para o segmento de renda mais alta, o foco está no grupo de transportes, refletindo, sobretudo, no aumento de 42,7% da gasolina e de 55% do etanol”, diz a pesquisa.
“Além da alta desses dois grupos, deve-se pontuar que os alimentos no domicílio, em especial os reajustes de 10% das carnes, de 21,7% de aves e ovos, de 44% do açúcar e de 56,9% do café, também provocaram impactos altistas significativos sobre a inflação no período, sobretudo para as camadas de renda mais baixa”, acrescenta.
No ano passado, o Ipea passou a projetar que a diferença entre a inflação dos mais pobres e a dos mais ricos seria encurtada ao longo de 2022.
Além de uma desaceleração dos alimentos, que ainda pressionam os consumidores com renda menor, o instituto apostava em uma aceleração dos preços de serviços, que pesam mais entre os mais ricos.
A inflação persistente causa preocupação no país. Como mostrou reportagem da Folha na semana passada, o avanço dos preços ficou mais espalhado pela economia nos últimos meses. Assim, brasileiros decidiram rever a rotina, com cortes no consumo diário, e postergar planos, como cursos e viagens.
Fonte: Folha SP