Como bem disse a Ministra Simone Tebet, a reforma tributária que se propõe com a criação do IVA Nacional pode ser a bala de prata para estimular investimentos e consumo, e assim proporcionar um ciclo de crescimento econômico para a economia brasileira como há muito tempo não se vê. A simplificação de unir 5 tributos num único imposto de consumo a ser cobrado no destino ao invés da origem parece ser unanimidade quase absoluta.
Acontece que na PEC45 em tramitação no Congresso Nacional fala-se em alíquota única. Se esta alíquota fosse módica, digamos até 10% do produto consumido, a tese da alíquota única poderia fazer sentido, como acontece em alguns países europeus como a Dinamarca. Mas aqui no Brasil diante da elevada carga tributária vigente por conta da hipertrofia do aparato estatal, fala-se numa alíquota básica entre 25% e 29%. Aí começa o problema. Como tributar champanhe e leite, feijão e caviar, com a mesma alíquota?
Por óbvio seria uma estrutura tributária extremamente regressiva que puniria os mais pobres e beneficiaria os mais ricos. Os mais pobres gastam quase a totalidade de sua renda em consumo, especialmente de alimentos da cesta básica, de remédios, e serviços essenciais. Já os mais ricos gastam, dependendo da faixa de renda, de 20% a 50% em bens de consumo e serviços. Em itens da cesta básica gastam ínfimos 5% se tanto. Ora parece o óbvio ululante que deveria haver alíquotas múltiplas do IVA a serem destacadas por critério de essencialidade. Mas nas discussões em curso, as autoridades fazendárias, se revestindo de boas intenções, propõe uma fórmula do velho assistencialismo populista: cobra-se o IVA dos mais pobres nos itens da cesta básica e depois devolve-se o que não deveria ser cobrado, na forma de um generoso cashback para aqueles milhões de integrantes do cadastro único do Bolsa Família.
Esqueceram-se de descer ao mundo real aonde os também pobres que ganham pouco acima do teto do Cadastro Único ou vão reduzir drasticamente sua dieta e passar fome, ou vão pedir demissão do emprego formal e correr para a informalidade do emprego, ou vão comprar gêneros alimentícios de seus parentes, amigos, e vizinhos no florescente “mercado negro” do cashback. E quanto aos milhões de invisíveis pedintes nas esquinas das grandes metrópoles ou esquecidos nestes rincões do Brasil profundo? Bem estes parecem condenados a pagar mais caro pelos alimentos e vão morrer de fome.
Se a legítima preocupação dos defensores do cashback for a distribuição de renda, existem outras formas de redistribuir renda, incluindo imposto progressivo sobre a renda. Mas através do cashback a ineficiência será enorme.
O modelo proposto pela Fazenda não considera o custo de gestão do sistema, pressupõe que não existe corrupção nem desvios no processo, e nem que diante do aumento do preço relativo de alimentos haverá por consequência um impacto negativo sobre a saúde da população, concentrado na população mais pobre.
Um único imposto de consumo com múltiplas alíquotas seria com certeza o caminho lógico a ser adotado na reforma tributária brasileira, especialmente levando em conta a tipificação das cadeias produtivas e o perfil de consumo das classes mais pobres. O tema precisa de uma abordagem lógica e realista, tendo como base modelos bem sucedidos já existentes em outros países como é o caso do IVA da União Europeia. Se ao contrário formos pela rota da utopia e do populismo, a “bala de prata” será um “tiro no pé”.
Roberto Giannetti da Fonseca, economista e empresário, ex Secretário Executivo da CAMEX no governo FHC.