Vanessa Stecanella
Corte de despesas, redução de investimentos e uma base de comparação fraca contribuíram para importantes empresas brasileiras entregarem resultado positivo aos acionistas no segundo trimestre. A produção, entretanto, ficou abaixo do esperado.
"A indústria realmente tem desaquecido", afirma o analista de investimentos Clodoir Vieira. Para ele, a forte redução da produção de bens de capital mostra que o empresariado está deixando de investir. "É muito preocupante quando um empresário deixa de investir na produção futura por falta de confiança", disse.
A percepção do especialista pode ser notada na Gerdau, por exemplo. A siderúrgica teve queda de 2% no lucro líquido do segundo trimestre ante igual período do ano passado, para R$ 393 milhões, devido ao recuo de 8,9% nas vendas domésticas de aço. Já nos Estados Unidos os negócios subiram 6,9%, mas não foram suficientes para compensar a queda dos negócios no Brasil.
Segundo o diretor-presidente da empresa, André Gerdau Johannpeter, a redução da atividade econômica no Brasil tornou o ambiente desafiador, o que também colaborou para a empresa operar no segundo trimestre com 70% da sua capacidade. A companhia ainda reduziu em R$ 500 milhões o seu programa de investimentos para este ano.
Clodoir Vieira acredita que, principalmente, a falta de confiança na condução do governo atual e da política econômica "está deixando o empresariado cauteloso". "Só teremos um sinal de quando isso vai terminar após a indicação dos novos ministros. Ou seja, depois das eleições".
Embalada pela China, a Vale apresentou produção recorde de minério de ferro. O desempenho positivo, aliado a disciplina nos investimentos e a eficiência no corte de custos, levou a mineradora brasileira a um lucro líquido de R$ 3,2 bilhões, alta de 283%.
Analistas destacaram também que a companhia conseguiu compensar a queda do câmbio e dos preços do minério, variáveis fora de seu controle, com a maior produção de minério de ferro da história em um segundo trimestre (79,4 milhões de toneladas).
Investimentos
As categorias de bens de consumo duráveis e os bens de capital mostraram claramente que a atividade industrial teve uma queda mais disseminada em junho, segundo o coordenador da Pesquisa Industrial Mensal (PIM) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), André Macedo.
As duas categorias foram impactadas pela produção de veículos, sendo que a fabricação de automóveis afetou bens de consumo duráveis e caminhões prejudicou os bens de capital.
Macedo observa, porém, que a queda não é pontual visto que desde outubro do ano passado a indústria automotiva acumula queda de 33,1% na produção.
A atividade caiu 6,9% em junho, na série sem ajuste sazonal, quando compara do ao mesmo mês do ano passado - quarta taxa negativa seguida e a mais intensa desde setembro de 2009 (-7,4%).
Na visão da economista-chefe da XP Investimentos e ex-diretora do Banco Central, Zeina Latif, a reação do governo às dificuldades da indústria não tem sido frutífera. "Apostou-se na proteção do setor e na adoção de políticas setoriais. Ou seja, em vez de corrigir as distorções, criam-se outras. Barreiras tarifárias e não tarifárias ao comércio, política de conteúdo nacional, isenções tributárias a produtos, crédito subsidiado a empresas desestimulam a inovação e a busca de eficiência. Políticas setoriais muitas vezes acabam protegendo o produtor menos eficiente e punindo aqueles que não obtiveram benefícios e proteção. O resultado para a economia como um todo pode ser perverso. Jogo de soma negativa", avaliou a economista, em comunicado ao mercado.
Efeito Copa
Especialistas afirma também que a Copa do Mundo no Brasil acabou prejudicando a atividade indústria, que teve de dispensar mais cedo os trabalhadores em dia de jogos e recebeu menos encomendar no período.
A fragilidade ficou evidente na divulgação dos números da Ambev. A maior fabricante de bebidas do mundo decepcionou ao revelar alta de 7% no volume de cerveja vendido no Brasil no segundo trimestre ante igual período do ano passado. Segundo o analista da Safra Corretora, Alan Cardoso, volumes e preços ficaram abaixo da expectativa tanto para cerveja quanto para refrigerantes, considerando que o trimestre deveria ter sido impactado positivamente pelo Mundial.
BRF, por sua vez, lucrou R$ 267 milhões entre abril e junho, alta de 28% ante os mesmos meses de 2013 - efeito do foco em mercados (externos) e itens mais rentáveis. Para os analistas do Bank Of America Merrill Lynch, Fernando Ferreira, Isabella Simonato e João Almeida, resultado mostra que o plano de recuperação da empresa está funcionando, mostrando até um ritmo mais rápido do que o esperado por especialistas.
A fabricante de papéis para embalagens Klabin lucrou R$ 244 milhões no segundo trimestre, revertendo prejuízo de R$ 130 milhões em igual período de 2013. Contribuiu para o bom desempenho o resultado financeiro positivo em R$ 137,5 milhões, ante R$ 418,2 milhões em perdas no ano passado. As vendas da empresa, porém, recuaram 2% ante um ano antes, para 419 mil toneladas.
Veículo: DCI