China mais lenta muda cenário para o Brasil

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                                       Desaceleração do país asiático já tem efeito sobre comércio, mas impacto no investimento divide analistas
 


Com indicadores que confirmam cada vez mais a desaceleração da atividade econômica chinesa, que impulsionou países emergentes na última década, cresce o debate sobre, afinal, qual será o efeito no Brasil. Desde 2009, a China é o principal destino das exportações brasileiras. No ano passado, um quarto ( 24,3%) de tudo o que o país vendeu foi para lá. Mas, se o impacto do esfriamento da China já aparece nos dados de comércio exterior, especialistas estão divididos sobre o efeito real nos números dos investimentos e financiamentos.

Parte dos especialistas acredita que um efeito direto será a redução do ritmo de concessão desses recursos, enquanto outros defendem que, por outro lado, poderá haver até um aumento no montante — diante do interesse de empresas chinesas reforçarem suas marcas no mundo e de os bancos de investimento buscarem formas de diversificar suas aplicações financeiras além dos títulos do Tesouro dos Estados Unidos.

Dados compilados pelo American Enterprise Institute/ Heritage Foundation mostram que, entre 2009 e o primeiro semestre deste ano, os investimentos da China por aqui chegaram a US$ 30,5 bilhões. Isso faz do Brasil o quarto principal destino dos recursos chineses no mundo, atrás apenas de EUA, Austrália e Canadá. Já levantamento feito pelo professor da Universidade de Boston ( EUA) Kevin Gallagher mostra que a China concedeu US$ 21,9 bilhões em empréstimos ao Brasil entre 2005 e 2014. O valor representa 18,5% dos US$ 118,5 bilhões concedidos em financiamentos à América Latina no período.

Economista do Ipea e professor da PUC- Rio, Marcelo Nonnenberg aponta que o ritmo menor de crescimento chinês já se reflete na balança comercial brasileira e que haverá mais impacto pela frente. De 2013 para 2014, caiu de US$ 46 bilhões para US$ 40,6 bilhões o valor das exportações do Brasil para o país asiático.— Vamos assistir à redução do valor das exportações para a China, tanto pelos preços menores de commodities quanto pelo crescimento reduzido das importações chinesas — diz Nonnenberg.

Com relação aos investimentos, alguns analistas acham que o cenário pode retardar as expectativas de avanço. Mesmo vendo com cautela o discurso de desaceleração da China — ao lembrar que o crescimento menor se dá sobre um Produto Interno Bruto ( PIB) de US$ 10 trilhões —, o professor da Universidade de Columbia e diretor do BRICLab, Marcos Troyjo, vê risco de demora, ou ritmo menos intenso, no crescimento dos investimentos chineses no Brasil, principalmente em infraestrutura.

— A opacidade da economia chinesa ainda é muito grande. Como eles são prudentes, é natural que tirem o pé do freio neste aumento de investimentos que vinha sendo esperado. Os investimentos vão ocorrer, mas em velocidade mais lenta. Até porque está ficando muito caro produzir na China — aponta o economista.

No levantamento do AEI/ HF, os números de 2015 já mostram alguma desaceleração. No primeiro semestre, foram anunciados US$ 270 milhões de investimentos chineses no Brasil, frente a US$ 390 milhões em igual período de 2014. Em relatório, o grupo destaca que grandes produtores de commodities,

como o Brasil, estão perdendo força e não mais lideravam o ranking. Para efeito de comparação, os EUA atraíram US$ 11,1 bilhões apenas este ano.

Um pouco mais otimista, o professor do Instituto de Economia da UFRJ Eduardo Costa Pinto não acredita em redução do ritmo de investimentos chineses. Segundo ele, a China ainda precisa assegurar acesso a recursos naturais, e as empresas chinesas querem construir marcas mundiais. Ele também não vê dificuldades no que se refere a financiamentos por parte de fontes chinesas.

— Os chineses têm muitos recursos e querem diversificar. Hoje, muito disso está investido em títulos do Tesouro americano, com baixo rendimento — pondera o professor da UFRJ.

OPORTUNIDADE PARA SETOR DE ALIMENTOS

Gallagher, da Universidade de Boston, também mostra otimismo. Ele afirma que o Brasil não é dependente da China, mas que a combinação das relações de comércio, investimento e financiamento mostra que “a China é essencial para o Brasil”.

— Se o comércio pode cair , os investimentos e financiamentos para o Brasil podem aumentar. Empresas chinesas buscam elevar a participação no mercado quando os preços declinam, e companhias com ativos vão querer vender. Ao mesmo tempo, bancos de desenvolvimento podem querer oportunidades para diversificar seus investimentos — diz Gallagher, que em 2016 lançará livro sobre as relações da China com a América Latina.

O embaixador Luiz Augusto de Castro Neves, presidente do Conselho Empresarial BrasilChina ( CEBC), lembra que cada setor sentirá um efeito diferente. No que se refere à balança comercial, “alguns ganham, outros perdem”. Se por um lado a demanda por minério de ferro será menor, há potencial para quem produz alimentos e bens de consumo duráveis.



Veículo: Jornal O Globo


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