Moda investe no potencial do algodão sustentável

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O documentário “For the Love of Fashion”, realizado em 2016 pela varejista C&A e a National Geographic, afirma que o algodão é a fibra natural mais usada no mundo para a confecção de roupas e está em 35% de todas as peças produzidas. Se o percentual for aplicado nas 80 bilhões de peças compradas anualmente, chega-se a um montante de 28 bilhões de roupas feitas de algodão. Trata-se de um potencial bilionário para a adoção de algodão sustentável na indústria da moda.



De acordo com a Better Cotton Initiative (BCI), organização que certifica produtores que aplicam princípios socioambientais no plantio de algodão, o Brasil é o principal fornecedor de algodão BCI. Conforme a organização, o país produz 30% do algodão certificado no mundo, com um milhão de toneladas. Além disso, a meta da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa) é plantar 100% de algodão certificado até 2020.



Nos próximos anos, roupas feitas com algodão sustentável ocuparão cada vez mais espaço no catálogo das marcas e lojas de departamentos, que começam a comercializar roupas feitas com o material. Isso vai provocar mudanças na indústria têxtil e no cultivo da fibra, de acordo com Aron Belinky, coordenador do Programa de Desempenho e Transparência do Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getúlio Vargas (GVces). “O impacto do algodão orgânico nas roupas será grande. É uma questão de o mercado incentivar a produção e o consumo em grande escala para a cadeia se desenvolver”, afirma.



No Brasil, grandes varejistas e startups começam a aplicar conceitos de sustentabilidade nos produtos e começam a influenciar a cadeia de produtores do segmento. É o caso da multinacional holandesa C&A, que se comprometeu a comercializar mundialmente apenas roupas de algodão proveniente de cultivos orgânicos (sem uso de químicos e transgênicos) ou sustentáveis (com sementes geneticamente modificadas e uso racional de insumos, como a água) até 2020. Outra grande varejista, a Lojas Renner, e a fabricante Adidas, também trabalham com algodão sustentável nas peças.



Na cadeia de moda, onde os varejistas de roupas têm mais poder de decisão do que os fabricantes, a iniciativa do setor de aplicar conceitos de sustentabilidade na cadeia sinaliza mais equilíbrio na relação entre os dois elos da cadeia, de acordo com Hélio Mattar, diretor-presidente do Instituto Akatu. “Quando uma empresa como a C&A anuncia que vai trabalhar com matéria-prima sustentável, então precisará de produtores. Que, por sua vez, só se sentirão seguros a produzir caso as condições de preço e prazo forem compensadores”, argumenta.



Mais de 25% dos produtos vendidos pela C&A brasileira são produzidos com algodão mais sustentável. Eles estão presentes em linhas de roupa infantil & bebê e em uma categoria de jeans sustentáveis que incluíam calça, camisa, shorts e macacão. Lançada em abril, as 36 mil peças da coleção jeans foram comercializadas com os mesmos preços praticados pelos demais produtos, segundo a companhia.



Com técnicas de plantio sustentável dos parceiros, o uso de insumos foi menor. Houve redução de 10% no consumo de água durante o cultivo do algodão, bem como do uso de pesticidas (50%) e fertilizantes (26,5%). A economia de recursos também foi significativa na produção: o consumo de água foi praticamente reduzido (92%) e a energia gasta foi 30% menor. Pelo projeto, a C&A venceu o Prêmio ECO 2016 na categoria Produtos.



Para entender o impacto do uso do jeans no meio ambiente, a concorrente Renner realizou um estudo em parceria com o programa CiViA (Ciclo de Vida Aplicado), da GVces, sobre a pegada de carbono que uma calça jeans produz. Dependendo da intensidade no processo de lavagem, uma calça pode gerar de 9 kg a 25 kg de gás carbônico. O cenário menos poluente é quando uma calça é apenas lavada na máquina, secando no varal e sem passar no ferro. Se todos os processos de lavagem forem cumpridos a emissão de gás quase triplica, segundo o estudo.



Os resultados sinalizam a necessidade de maior racionalização e conscientização do uso, de acordo com a Renner. “A Lojas Renner entende ser necessário investir esforços para atuar em todas as etapas da cadeia de produção com o objetivo de reduzir a pegada de carbono das calças comercializadas por ela”, atesta a varejista no estudo. Também entende que “deve atuar como disseminadora de informação, orientando e educando seus consumidores para que adotem práticas mais sustentáveis de uso de seus produtos”.



Além do jeans sustentável, há exemplos bem sucedidos de negócios no setor têxtil que respeitam princípios socioambientais. O Banco de Tecido é um deles. A startup foi criada pela cenógrafa e figurinista Lu Bueno a partir do reaproveitamento das sobras de material cenográfico. Bueno percebeu que os tecidos não utilizados na produção de cenários poderiam ser aproveitados como matéria-prima de novas roupas e calçados. “Cheguei a ter 600 quilos de sobras guardadas no depósito, incluindo peças usadas por mim no acústico da Gal Costa na década de 1990”, recorda a cenógrafa.



Desde 2015, o Banco de Tecido funciona como plataforma que recebe sobras têxteis da rede de participantes e os revende para confecções. É comum receber cortes de algodão, sintéticos, popelines, flanelas, feltros, napa e couro. Além disso, quem fornece tecido ganha créditos por quilo entregue e pode trocar por outros materiais, conforme disponibilidade de estoque. Entre os clientes, estão confecções como Insecta Shoes, Karmen, Panaceia e Dog Care, que produz roupas para pets.



Para Bueno, o reuso é uma forma de diminuir os impactos negativos da cadeia têxtil, além de possibilitar a compra de tecidos que de outra forma seriam importados de regiões com alta incidência de trabalho análogo à escravidão. A questão do reaproveitamento de roupas e tecidos foi abordada em outro texto do Ecoando, que pode ser acessado clicando aqui.



A sustentabilidade empresarial é um caminho sem volta e as empresas estão convictas de que cuidar do meio ambiente faz parte do negócio, afirma Mattar. “Se isso não acontece, o consumidor vai saber cedo ou tarde quais produtos são poluentes na produção, uso ou descarte. Com isso, as empresas não sustentáveis vão sofrer.”

 




Fonte: O Estado de São Paulo


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