Pesquisa indica que houve uma migração de categorias para o autosserviço devido a queda na renda, o que fez com que o volume comercializado nos supermercados recuasse 4,3% no ano
São Paulo - Apesar do crescimento de 1,58% no faturamento dos supermercados no ano passado, o volume de produtos vendidos caiu. Segundo levantamento da Nielsen, a queda em número de unidades foi de 4,3% de janeiro a novembro de 2016, puxada, principalmente, pela migração de categorias para o atacarejo. Para a gerente de atendimento da Nielsen, Lenita Mattar, além da migração de algumas categorias para o cash&carry, outro fator que explica o recuo visto em 2016 é a forte retração tanto da renda quanto do consumo do brasileiro. De acordo com a pesquisa, a renda caiu 12% em 2016, frente ao ano anterior, voltando ao patamar de cinco anos atrás. Em relação ao gasto, o recuo foi ainda maior, de cerca de 16%.
"Essa queda da renda foi impactada pela alta do desemprego, e pelas pessoas que perderam o emprego e empreenderam com um negócio com uma renda menor", explica Lenita. Outro fator que influiu, segundo ela, é o fato de a classe C, que em anos anteriores foi um grande motor da economia brasileira, ter diminuído drasticamente seus gastos. Ainda de acordo com o levantamento da Nielsen, pela primeira vez nos últimos quatro anos a classe C teve um gasto inferior a sua renda, já que a renda média foi de R$ 2.584, e o gasto médio ficou em R$ 2.552. "Antes esse consumidor se endividava e fazia compras a prestação. No ano passado ele gastou menos do que sua renda para pagar as dívidas", afirma.
Migração para atacarejo
Sobre a migração da compra de algumas categorias para o atacarejo, ela diz que o movimento, iniciado nos últimos anos, se acelerou ainda mais em 2016. "Em 2015 os hipermercados já tinham sido impactados pela expansão do atacarejo, mas os supermercados ainda cresciam. No ano passado esse canal também foi impactado", afirma Lenita. Enquanto os supermercados, hipermercados e mercados de vizinhança viram uma retração de 4,3% no volume de produtos vendidos, em comparação com 2015, no mesmo período o atacarejo avançou 12,5% na mesma base.
Apesar da forte expansão, Lenita afirma que a tendência é de que haja uma desaceleração do crescimento desse canal. "Com a melhora da economia algumas dinâmicas do consumo vão retornar. Nesse cenário, a tendência é de que o atacarejo se estabilize. Ele não vai continuar se expandindo nesse ritmo", afirma. Ela acrescenta que em termos de aberturas de lojas já houve uma diminuição na intensidade, mas que a expansão de vendas ainda impulsiona. "O atacarejo ainda está em desenvolvimento e o varejo está se readequando a isso", diz.
Um dado da pesquisa da Nielsen que comprova a migração para o cash&carry é relativo as categorias de produtos. De acordo com o estudo, ao mesmo tempo em que categorias como leite, iogurte, sorvete, biscoito e papel higiênico tiveram uma retração considerável no setor de supermercados, no de atacarejo todas apresentaram um forte crescimentos no volume de vendas. "Com a crise ocorreram esses movimentos: o consumidor migrou de canal, fez downgrade das marcas, mudou o tamanho das embalagens e por fim reduziu o volume de suas compras", enumera.
O presidente da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), João Sanzovo Neto, também aponta para a mudança no hábito de compra do brasileiro. "No ano passado o consumidor fez 'uma ginástica': mudou os hábitos, parou de consumir fora do lar, substituiu produtos e fez downgrade para economizar", afirma.
Faturamento
Em relação ao faturamento do setor, o executivo sinaliza que houve um incremento de 1,58% em 2016, em termos reais, na comparação com o ano anterior. O crescimento se deu, no entanto, por conta da alta dos preços. "A receita dos supermercados só cresceu porque o preço dos produtos vendidos nas lojas também cresceu bastante no ano passado", diz Sanzovo. Ainda assim, ele diz que o resultado ficou acima da expectativa da entidade, e que ele foi impulsionado pelas vendas do Natal e do Réveillon. "O ano foi difícil, mas conseguimos um resultado satisfatório."
As vendas dos supermercados também apresentaram crescimento em dezembro de 2016. Quando comparado com o mês anterior a alta foi de 20,89% (reflexo das vendas do Natal), e na comparação com o mês de dezembro de 2015, o avanço foi de 2,23%. Com a divulgação do resultado do ano, a Abras também revisou sua previsão para o desempenho do setor em 2017. A expectativa, que em outubro do ano passado era de um crescimento de 1,5% para este ano, passou para 1,3%. Em termos nominais, a projeção da entidade é de um crescimento de cerca de 6% no setor.
"O desemprego foi o grande determinante na revisão para baixo da previsão para 2017", afirma o presidente da Abras. Ele acrescenta ainda que as previsões para o Produto Interno Bruto (PIB) para este ano também pioraram desde outubro, e que isso aumenta o risco de que a taxa de desemprego supere o patamar de 13% este ano (a perspectiva anterior da entidade era de 12,5%).
"O nosso setor depende do crescimento da renda, que por sua vez depende do emprego e do aumento dos investimentos. A previsão que estamos fazendo de 1,3% é otimista, considerando o cenário atual", diz. O executivo acrescenta, no entanto, que a perspectiva da Abras para a economia brasileira é de que ela ainda 'ande de lado' neste ano.
Pedro Arbex
Fonte: DCI - São Paulo