Governo deve enfrentar forte oposição para aprovar a reforma da Previdência no Legislativo; ela é considerada pelo Copom como fundamental para o avanço dos cortes nos juros ao longo do ano
São Paulo - A dificuldade do governo federal para aprovar a reforma da Previdência Social pode impedir uma redução mais acelerada da taxa básica de juros (Selic). A mudança do sistema é defendida pelo Comitê de Política Monetária (Copom).
Em ata divulgada ontem, os diretores do Banco Central (BC) destacaram que a "aprovação e a implementação" das medidas fiscais são necessárias para "a sustentabilidade da desinflação" e para a redução da taxa de juros.
Em outro ponto do comunicado, o Copom apontou que o processo de ajuste fiscal "tem sido positivo", mas ponderou que a consolidação da reforma previdenciária pode levar mais tempo e "envolve incertezas".
De acordo com especialistas consultados pelo DCI, o projeto para alterar o sistema de seguridade social será o maior desafio do governo de Michel Temer.
Além do conteúdo sensível da proposta, o Executivo pode se complicar com o avanço das investigações da Operação Lava Jato, que se aproxima de alguns dos principais nomes do governo.
Um deles é o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha. Um dos principais interlocutores da presidência com o Legislativo, ele passou a ter a sua continuidade no Planalto questionada, depois dos desdobramentos mais recentes da investigação.
"Vejo com ceticismo a possibilidade de o projeto de lei [da reforma da Previdência] ser aprovado do jeito que foi enviado ao Congresso", avaliou Paulo Dutra, coordenador do curso de economia da Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP).
Uma forte alteração na proposta original poderia afetar a intensidade dos cortes na Selic, impedindo que a taxa encerre 2017 em 9,25% ao ano, projeção atual do mercado.
Segundo Dutra, deputados e senadores devem incluir várias emendas na reforma apresentada pelo governo, tornando a projeto "menos eficaz".
Um levantamento divulgado nesta semana pelo jornal Folha de São Paulo mostrou que metade dos deputados da comissão especial responsável por analisar a proposta é contrária à fixação da idade mínima de 65 anos para a aposentadoria.
E a oposição no Legislativo ainda poderá ser reforçada nas ruas, ressaltou Antônio Correa de Lacerda, professor da faculdade de economia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
"Entre as unidades sindicais há quase um consenso de que a reforma, do jeito que está, é muito drástica. Por isso, devemos ter uma pressão bastante grande, várias manifestações."
Críticas à medida também já foram feitas por outros representantes da sociedade civil, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Defensoria Pública da União.
Sobre a necessidade dos ajustes para a redução dos juros, os entrevistados apresentaram posições distintas.
Após concordar que alterações na seguridade social são importantes para o equilíbrio das contas públicas, Lacerda disse que a reforma, "nos termos colocados" pelo governo federal, não será positiva para a economia do País.
"Alguns pontos precisam ser levados em consideração, como a alta taxa de desemprego, que afeta a arrecadação, e as dívidas que muitas empresas têm junto ao INSS. Se elas fossem pagas, poderíamos ter um ajuste menos extremo."
Na opinião de Dutra, por outro lado, a reforma "é imperativa" para o País. "Precisamos dessas mudanças inclusive para gerar maior credibilidade nas contas públicas, para mostrar que temos uma gestão séria", disse Dutra.
Ele defendeu que os processos inflacionários, no Brasil, decorrem de desequilíbrios fiscais que têm como consequência a elevação dos juros. "Se não tivermos tantos problemas com as contas, haverá mais espaço para cortes na Selic."
Em queda
A ata do Copom também justificou o corte de 0,75 ponto percentual na taxa de juros, agora em 12,25% ao ano realizada na última quarta. Os diretores do BC voltaram a destacar a desaceleração do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Eles ressaltaram que a inflação apresenta "dinâmica favorável" e apontaram uma "retomada na desinflação dos preços de alimentos". A perspectiva do mercado é de IPCA em 4,4% neste ano.
Sobre o cenário externo, o quadro foi considerado "bastante incerto". Entretanto, foram destacadas uma "atividade econômica global mais forte" e seu "consequente impacto positivo nos preços de commodities".
Renato Ghelfi
Fonte: DCI - São Paulo