Rio - O varejo se prepara para o primeiro Natal no azul após dois anos de recessão. Mas, para dar conta desse aumento de demanda, terá de driblar desafios, principalmente no Rio, onde a crise de segurança pública é entrave para as entregas. Só entre janeiro e outubro, foram registrados 8.508 casos de roubo de cargas no Estado, aumento de 14,3% em relação a 2016, conforme dados do Instituto de Segurança Pública (ISP). Segundo empresas e analistas do setor, a operação especial para lidar com esse cenário já começou. De acordo com levantamento da empresa de logística Intelipost, feito a pedido do GLOBO e baseado em cinco milhões de pedidos, 12,9% das entregas dos Correios no Estado, nos últimos três meses, foram feitas com algum tipo de medida adicional de segurança, em geral escolta armada. Na média nacional, esse percentual é de apenas 1,6%. O uso de escolta se soma a outras estratégias para garantir a segurança da mercadoria, como ampliação de frota própria, geolocalização e serviços que permitem comprar on-line e retirar em lojas físicas.
Garantir que essas compras cheguem em segurança aos clientes é prioridade das varejistas no Natal da retomada. A Confederação Nacional do Comércio (CNC) prevê alta de 4,8% nas vendas. Enquanto isso, o comércio eletrônico deve crescer de 15% a 20%, segundo estimativa da VTEX, plataforma de e-commerce usada por 2.300 lojas.
FROTA PRÓPRIA REDUZ VALOR DOS SEGUROS
Uma das estratégias é o uso de frota própria para abastecer melhor as redes de distribuição, solução adotada pela Via Varejo, dona das Casas Bahia e do Ponto Frio, segundo consultorias do setor. O objetivo é minimizar o risco de desvio de produtos e driblar a alta do valor dos seguros. Mas há empresas que preferem se afastar do Estado. Segundo fontes, a Magazine Luiza está deixando de entregar no Rio. Procuradas, Via Varejo e Magazine Luiza não quiseram comentar.
— Quando você está na malha de uma transportadora, não domina as rotas e pode estar sujeito a ataques e preços mais elevados de seguros. Os investimentos são no sentido de garantir a logística e alguma exclusividade na gestão de risco — explica Ana Paula Tozzi, diretora executiva da AGR Consultores.
Outra medida é recorrer a transportadoras locais, em vez de aos Correios. Normalmente, são empresas menores, que conhecem bem as áreas de risco e têm como entregadores moradores dessas regiões, que costumam ter melhor trânsito.
— Saímos da solução convencional. Não trabalhamos mais com parceiros globais (transportadoras grandes), que, na nossa visão, têm mais dificuldade de circular pela cidade. É normalmente um pouco mais caro, mas é mais especializada — afirma Luís Fernando Miller, sócio-diretor da Tatix, especializada em gestão de e-commerce.
A transportadora SpeedLog percebeu esse fenômeno, ao registrar alta de 20% nos pedidos no Estado. Com operações apenas em Rio e São Paulo, a empresa se especializou em entregas regionais. Transporta cosméticos, eletrônicos e brinquedos, sem restrições.
— Temos uma estratégia de tentar buscar entregadores do local. Se tenho uma operação em São Gonçalo (na Região Metropolitana do Rio), contrato um transportador de lá, que sabe andar na região. É melhor do que colocar alguém de Caxias (Baixada Fluminense), por exemplo — conta Márcio Mazzei, sócio da SpeedLog, que também usa acompanhamento em tempo real da carga e GPS para facilitar a recuperação de produtos em caso de roubo.
Mas não necessariamente a encomenda irá até a porta do consumidor. Serviços em que o cliente compra pela internet e retira nas lojas físicas estão em alta. É o chamado “clique e retire”. Segundo o balanço mais recente da Via Varejo, as entregas pelo Retira Rápido responderam por 22% das vendas do e-commerce no terceiro trimestre deste ano. Nos três meses anteriores, o patamar era de 17%. Na Saraiva, que trabalha com 11 companhias de transporte, cerca de 20% dos usuários do site já optam pela modalidade.
— Essa prática traz uma perspectiva de tecnologia, porque o consumidor dá as cartas de onde ele quer retirar seu produto, de modo mais conveniente, e beneficia o vendedor com a gestão de riscos — afirma Ana Paula, da AGR.
LIVRO SIM, GELADEIRA NÃO
Segundo Alessandro Gil, diretor de Experiência da VTEX, essa prática se soma a outras restrições adotadas pelas varejistas:
— Restringir o modal de entrega também é opção em alguns casos, especificando um motoboy. Ou então produtos: entrego livros, mas não entrego geladeiras.
As restrições de entregas são feitas com base em monitoramento de ocorrências registradas em cada área. E ocorrem principalmente nos itens de maior valor. Muitas vezes, a experiência pode ser frustrante para o consumidor.
— Primeiramente, a loja precisa informar ao consumidor quando ele se encontra em área de entrega diferenciada (de risco), que muitas vezes pode estar a poucos metros de um outro CEP com entrega regular. Isso pode ser motivo de frustração para consumidores, mas transparência é algo crítico — afirma Gabriel Drummond, diretor da Intelipost.
Foi exatamente o que ocorreu com o técnico de TI Jorge de Lima, de 42 anos. Ele comprou um monitor e precisou alterar o endereço de entrega para a casa da sogra, a apenas dois quilômetros de onde mora, devido à restrição de local.
— O CEP da residência dela foi aprovado, mas com uma taxa de entrega de R$ 20 e um prazo de entrega de 15 dias. Sempre compro produtos pela internet, e essa foi a primeira vez que encontrei uma restrição tão severa assim — conta.
Os Correios informaram manter o serviço de “clique e retire” em mais de 6.700 agências no país. A Netshoes, uma das parceiras, informou que está investindo em outras formas de entrega, como um serviço próprio. O Netshoes Entregas, segundo a empresa, permitirá ao cliente ter “o rastreamento completo do seu pedido”.
Fonte: O Globo - Rio de Janeiro