O vazamento de uma das propostas de reforma da Previdência em estudo no governo deixou claro que as ambições da equipe econômica e do Palácio do Planalto em relação ao tema são diferentes. Enquanto o time do ministro da Economia, Paulo Guedes, quer ousar mais, fixando idade mínima de aposentadoria igual — de 65 anos — para homens e mulheres, a ala política pisa no freio, preocupada com a resistência que a reforma pode enfrentar. Diante disso, começam a aparecer sinais de negociação dos pontos mais controversos, em versões alternativas a um texto mais duro. Como resumiu Guedes após encontro com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para tratar de Previdência, a reforma está sendo “calibrada”.
- Saindo da cirurgia, ele (Jair Bolsonaro) olha e diz: isso aqui, sim; isso aqui, não. Ele tem o cálculo político dele. Estamos calibrando - disse Guedes, em referência ao fato de o presidente estar internado em São Paulo.
A idade mínima, um dos pontos sensíveis, já conta com duas alternativas mais amenas. Uma opção é que a idade mínima de 65 anos só valha para trabalhadores que ingressarem no mercado após a aprovação da reforma. Além disso, existe a possibilidade de que a idade mínima seja diferente para homens (65 anos) e mulheres (63 anos).
Para quem já está no mercado de trabalho, não haverá idade mínima expressa em lei. Estes trabalhadores deverão seguir regras de transição, num sistema de contagem de pontos similar à norma 86/96 (que soma idade e tempo de contribuição), mas com parâmetros mais duros.
O texto final, no entanto, ainda será submetido a governadores e a lideranças no Congresso. Mesmo assim, fazer uma reforma mais dura não será fácil. O vice-presidente Hamilton Mourão reiterou nesta terça-feira que Bolsonaro não concorda com Guedes sobre a idade mínima:
- O Guedes tem a visão dele, mas é o presidente que vai decidir. Na visão dele (Guedes) é todo mundo igual. Não é isso que se busca hoje? A igualdade? Mas o presidente (Bolsonaro) não concorda.
Ele negou, porém, que a divergência entre os dois em um dos pontos principais da reforma possa trazer atrito:
- Não vai trazer problema. Quem decide é o presidente, ele que foi eleito, nós aqui somos só atores coadjuvantes.
O ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, deixou clara a preocupação do Planalto com uma proposta mais dura . Ao falar sobre a minuta que veio a público, afirmou em entrevista à radio CBN:
- Não, não é. Asseguro que não é. Vocês vão ver quando o projeto chegar que ele é muito diferente do que está publicado no jornal. Ali era um dos ensaios, mas ensaio não é jogo.
O porta-voz da Presidência, Otávio do Rêgo Barros, afirmou nesta terça-feira, após visita ao presidente no Hospital Albert Einstein, que Bolsonaro está se empenhando para apresentar a reforma ao Congresso “no menor prazo possível”.
Guedes afirmou que o importante é que a reforma da Previdência faça uma economia significativa aos cofres públicos:
- A ideia é que ela (a economia) chegue a pelo menos R$ 1 trilhão. Isso é o valor hoje em dez anos. Há simulações de R$ 1 trilhão em 15 anos também. O importante é que ela tenha potência fiscal para resolver o problema.
O ministro não deu certeza sobre qual idade mínima será apresentada ao Congresso e lembrou que Bolsonaro já defendeu patamar de 62 anos para homens e 57 para mulheres.
Novo projeto na câmara
Após encontro com Guedes, o presidente da Câmara afirmou que a reforma pode ser votada na Casa ainda em maio e, no Senado, até julho. Mas defendeu que todos os partidos tenham tempo para debater a matéria — o que implicaria na reabertura das discussões nas comissões. Isso indica que o governo pode ter de enviar novo projeto de Previdência, no lugar de aproveitar a proposta do governo Michel Temer, o que aumentaria o tempo de tramitação.
- Não vou dar uma sinalização hoje que mostre um desrespeito ao regimento e que vai criar um ambiente de muito tensionamento com a oposição, com a minoria, no plenário da Câmara. E não é esse o nosso problema. É discutir que em dois meses tenha 320, 330 deputados a favor - afirmou o parlamentar, que disse que o país teria expansão da economia de 6% em 12 meses após aprovar a reforma.
A reforma da Previdência é importante porque ajudará a equilibrar as contas públicas. Só neste ano, o governo precisará desembolsar R$ 218 bilhões para cobrir o rombo no INSS, que paga os benefícios dos aposentados no setor privado. O problema de gastar tanto com aposentadorias e pensões é que sobra pouco para investir em outras áreas. Em 2019, despesas com Previdência consumirão 32,6% do Orçamento da União. Os investimentos ficarão restritos a 8% do total.
Fonte: O Globo - Rio de Janeiro