Uma rivalidade de séculos na ponta do lápis

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Esqueça tudo o que você sabe sobre rivalidades entre empresas. Apple contra Microsoft, Ford e General Motors, Coca-Cola e Pepsi: todas estão atrasadas.

 

Duas fabricantes de lápis nesta cidade batalhavam antes que qualquer uma dessas marcas - ou mesmo que sua terra natal, os Estados Unidos - sequer existisse.

 

O mais recente duelo das duas tem a ver com aniversários. A Staedtler Mars GmbH celebra este ano seu 175o aniversário. No ano que vem, a rival Faber-Castell AG festeja seu 250o.

 

Mas a Staedtler não se faz de rogada, porque em 2012 ela celebrará o 350o aniversário de seu primeiro antecedente. Registros municipais de 1662 mencionam um artesão de lápis chamado Friedrich Staedtler, ao qual a empresa traça sua linhagem.

 

"É uma concorrência ao longo dos séculos", diz o diretor-gerente da Staedtler, Axel Marx. Uma "guerra do lápis" sobre qual empresa pode alegar ser a mais antiga levou as duas ao tribunal 15 anos atrás.

 

Cada uma delas trompeteia marcos históricos: Friedrich Staedtler foi o primeiro produtor dedicado de lápis de madeira de que se tem registro, e seus descendentes foram pioneiros em lápis de cor em 1834. Na década de 1840, Faber foi o primeiro a pôr sua marca em lápis de alta qualidade, e em 1870 registrou uma das primeiras marcas registradas dos Estados Unidos.

 

Hoje, as rivais ainda brigam para dominar o mercado de lápis, digladiando-se pelos coloridos das crianças e os hobbys manuais de aposentados. Os moradores de Nuremberg tomam partido na briga. "São como times de futebol - as pessoas gostam de um ou do outro", diz Anja Hofmann, uma balconista da livraria Thalia no centro da cidade.

 

A Faber-Castell domina o mercado de lápis de luxo no mundo, oferecendo madeira refinada e acabamento em platina. Ela desenvolveu uma linha de lápis ergonômicos com três lados e patenteou os pontinhos salientes para facilitar a empunhadura.

 

"Em nossa indústria, não há dúvida de que a Faber-Castell é a Mercedes", diz o conde, ou graf, Anton-Wolfgang von Faber-Castell, que tem um Audi pintado com o verde escuro que é típico de sua empresa.

 

A Staedtler é "a que impulsiona a tecnologia", rebate Marx. Em 2007, a empresa apresentou um método para fortalecer as frágeis pontas dos lápis de cor. Agora a Staedtler pretende revolucionar a indústria com um lápis extremamente ecológico feito de um subproduto da madeira exclusivo dela, o Wopex.

 

Dois séculos atrás, a concorrência na cidade era tão acentuada que as rivais roubavam artesões uma da outra, diz Henry Petroski, um professor da Universidade Duke, dos Estados Unidos, e autor de "The Pencil" (O Lápis), um relato de 400 páginas sobre o instrumento de escrita.

 

Na década de 1970, os tempos eram mais difíceis. "Eu queria fugir do negócio de lápis", recordou recentemente, no castelo de sua família, o conde Von Faber-Castell. "Disse que não era apenas sem graça, mas perigoso", porque os lápis eram commodities e a operação de réguas de cálculo da empresa, líder mundial, havia sido demolida pelas calculadoras de bolso.

 

Mas oito gerações de tradição o arrastaram de volta. Incapaz de encontrar um bom gerente para a empresa familiar, o conde Von Faber-Castell abandonou relutantemente sua carreira em banco de investimento em Nova York. Ele retornou à cidade de Stein, para onde o marceneiro Kasper Faber havia escapado em 1761 do rígido sistema de corporações de ofício da vizinha Nuremberg para registrar um ateliê de lápis.

 

Isso foi quase 200 anos depois que uma tempestade em Borrowdale, uma cidade no norte da Inglaterra, derrubou um carvalho e revelou uma substância escura que os pastores locais começaram a usar para marcar seus rebanhos. Logo pedaços de grafite estavam sendo vendidos pela Europa como um impressionante novo meio de escrita.

 

Os escribas inicialmente embalaram o "chumbo negro" em cordas para protegê-lo e manter os dedos limpos. Logo, marceneiros começaram a criar recipientes de madeira para feixes cada vez menores do cada vez mais caro carvão. O primeiro homem conhecido por ter registrado um negócio de lápis foi o carpinteiro Friedrich Staedtler, de Nuremberg.

 

Em 1995, a empresa que agora leva seu nome decidiu marcar 333 anos de história. A Faber-Castel celebrou com um processo.

 

Os advogados do conde argumentavam que lacunas de vários anos entre os negócios controlados pelos vários descendentes de Staedtler por volta de 1800 interromperam a linhagem empresarial antes de 1835. Foi aí que Johann Sebastian Staedtler estabeleceu a empresa que continua até hoje.

 

"Acho que deixamos isso claro em relação à Staedtler no tribunal", diz o conde Von Faber-Castell, que obteve uma liminar.

 

"Não podemos dizer que somos a mais antiga empresa de lápis", admite Marx. "Mas nosso nome é a origem documentada dos lápis encapsulados em madeira."

 

As duas empresas também colidiram nos EUA. Em 1849, Lothar von Faber, um bisneto de Kasper Faber, enviou seu irmão mais novo, Eberhard, à Flórida para garantir suprimentos de cedro para a fábrica em Stein. Lothar foi um globalizador precoce, comprando grafite de uma mina siberiana perto da Mongólia, que ele promoveu com lápis mongóis.

 

Lothar havia desenvolvido a primeira produção industrial de lápis. Ele também foi o primeiro a comercializar lápis de alta qualidade, estampados com o nome de sua empresa, A.W. Faber. Para proteger a marca, os Faber a registraram em 1870 como uma das primeiras marcas registradas nos EUA.

 

Os lápis Faber eram preferidos por notáveis, como o presidente americano Ulysses S. Grant e o pintor holandês Vincent van Gogh. Mas brigas familiares e a Primeira Guerra Mundial dividiram as marcas Faber. Em 1920, a empresa americana de Eberhard Faber não tinha laços com os Faber alemães.

 

Quando os direitos europeus ao nome Eberhard Faber foram colocados à venda em 1978, a Faber-Castell estava fraca demais para pagar, por causa do colapso das réguas de cálculo. A Staedtler a adquiriu e começou a fabricar produtos Eberhard Faber perto de Nuremberg, concorrendo com a Faber-Castell.

 

"Detestei aquilo, mas não havia outras opções", relembra o conde Von Faber-Castell, de 69 anos.

 

Sem se intimidar, o conde fez a Faber-Castell atuar num mercado mais sofisticado ao ressaltar a longevidade da empresa, enfatizando sua tradição aristocrática e posando para fotos publicitárias diante do castelo da família.

 

No ano passado, a Staedtler e a Faber-Castell deram um basta a seu passado de atritos quando Marx entrou em contato com o conde para discutir a venda da Eberhard Faber. "Cheguei à conclusão de que estávamos colaborando para o nome Faber", diz Marx.

 

Em 1o de janeiro, pela primeira vez em mais de um século, a Faber-Castell retomou os direitos europeus à marca. O conde pretende ressuscitá-la com novo marketing.

 

Marx, enquanto isso, está levando a Staetdler ao mercado de canetas de computador, ou stylus, que possam digitalizar a escrita manual.

 

Ambas as empresas afirmam que são rivais amigáveis no momento, mas isso pode mudar agora que a Staedtler avalia como marcar o 350o aniversário do registro de Friedrich em 1662.

 

"Estamos pensando em como fazer isso sem começar uma nova guerra", diz Marx.

 

Veículo: Valor Econômico


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