Arroz, feijão, pão, detergente, xampu... e balas, revistas e brinquedos. O carrinho de compras do vigilante Diego Marins, de 27 anos, vai muito além da lista feita em casa. O rapaz, porém, está longe de ser exceção. A cada R$ 100 gastos nos supermercados por famílias da nova classe média (com renda mensal de até R$ 3 mil), até R$ 25 são destinados a itens que fisgam o consumidor em meio a gôndolas e cartazes de ofertas. A estimativa é do professor de Varejo da Fundação Getulio Vargas (FGV) Daniel Plá, com base em estudos encomendados pelas próprias redes, para aumentar suas margens de lucro.
— Minha filha é pequena, mas já aponta e pede as coisas — conta Diego, que acaba não resistindo aos apelos: — Dos R$ 300 que gasto por mês, até R$ 100 vão para esses extras.
Segundo Daniel Plá, a compra de pouquinho em pouquinho pode causar um rombo no orçamento. Uma família com renda mensal de R$ 3 mil deixa até R$ 900 no supermercado. Do total, em média, R$ 225 são gastos com itens comprados por impulso.
— Em um ano, R$ 2.700 são desperdiçados com produtos que não fariam qualquer diferença, se não fossem comprados — afirma Plá.
Resistir às tentações, porém, não é fácil. Tornar os produtos mais atraentes é missão que recebe investimentos maciços das redes. Programas sofisticados de computador e até mapeamento cerebral são usados para avaliar quais os pontos mais “vendáveis”:
— O tempo que se espera na fila para pagar as compras chega a aumentar em 15% o impulso de pegar revistas e petiscos — diz o professor de merchandising da ESPM Eduardo França.
A força das áreas nobres — como pontas de gôndolas e caixas rápidos — é tão grande, que esses locais são disputados por fornecedores, e chegam a ser alugados para uso exclusivo de certas marcas, dizem os especialistas.
Consumismo pode virar doença
Segundo pesquisa do SPC Brasil, os supermercados superaram os shoppings em quantidade de compras por impulso. O levantamento revela que 85% dos consumidores admitem comprar por impulso em supermercados e shoppings, segundo o gerente financeiro da instituição, Flávio Borges:
— O consumo por impulso acaba usado como um tapa-buraco. A estimativa é que sete em cada dez pessoas consomem mais para lidar com problemas, como ansiedade, frustrações e autoestima.
Esse descontrole nos gastos acaba se intensificado nos supermercados, onde os produtos, normalmente, não têm preços unitários tão altos, como nos shoppings.
— A pessoa compra sem avaliar muito bem o custo. E os supermercados sabem como atrair esse consumidor. Os itens básicos dão uma margem de lucro já esperada às redes. O diferencial no faturamento vem desses produtos comprados sem necessidade — ressalta Borges.
Às vezes, a compra por impulso vira uma doença e é tratada em grupos de ajuda, como os Devedores Anônimos (DA). No Rio, a entidade funciona em três endereços. S., de 52 anos, frequenta as reuniões do grupo desde 2004. Com uma dívida que chegou a R$ 20 mil, ela precisou vender um apartamento em Ipanema e viu seu primeiro casamento chegar ao fim. Segundo ela, o supermercado é o pior lugar para se controlar.
— Para mim, ir ao supermercado é um risco, porque comida você tem que comprar, e acaba usando isso como desculpa para comprar além da necessidade. Às vezes, vou colocando, colocando produtos no carrinho. Depois, conforme vou caminhando em direção ao caixa, vou devolvendo... Sempre faço uma lista e evito ir com meu filho — diz ela, que é servidora pública.
Veículo: Portal Globo