O juiz Manuel Eduardo Pedroso Barros, substituto da 19ª Vara Cível de Brasília, resolveu inovar e sugeriu que uma parte fizesse um pedido liminar. Na sentença, ele adiantou que a tutela provisória seria concedida, caso fosse de interesse do autor.
O caso envolve uma disputa entre dois irmãos por frações do aluguel de um imóvel herdado. O réu tinha poderes para administrar os valores em nome de seus quatro irmãos, mas o autor revogou essa autorização.
Na decisão, o juiz explicou que o autor deveria ter notificado o banco que alugava o imóvel, para que a instituição financeira lhe transferisse diretamente o valor correspondente à sua cota-parte.
O autor apenas pediu que o réu informasse o montante recebido, a forma de divisão para repasse, eventuais abatimentos etc. Não havia nenhum pedido referente à instituição financeira — e sequer poderia haver, pois se tratava de uma ação de exigir contas direcionada a seu irmão.
Mesmo assim, Barros disse que, se o autor quisesse, ele autorizaria a imediata expedição de ofício ao banco para determinar o pagamento direto da sua cota. O magistrado alegou que a medida teria "a finalidade de sanar problemas com as prestações futuras".
O advogado do réu, Matheus Barra de Souza, já informou que moverá uma representação no Conselho Nacional de Justiça contra a decisão. Ele afirma que o juiz concedeu um pedido extra petita, extrapolando o limite do processo, sem que a questão fosse discutida nos autos.
"A imparcialidade do juiz é elementar a qualquer processo judicial. A conduta de sugerir a uma das partes o que pedir nos autos e antecipar qual será o seu juízo sobre tal pedido fere este pilar do devido processo legal. É necessário que o exercício da função judicante se dê com o mesmo rigor, técnica e atenção à lei exigidos por ocasião dos concursos públicos para ingresso na magistratura", assinala o advogado.
Contexto
O autor e o réu são, respectivamente, o terceiro e o quinto de um total de cinco irmãos, todos proprietários de diversos imóveis que herdaram dos pais.
Em 2018, os irmãos firmaram um acordo para que o caçula recebesse e administrasse 50% dos aluguéis de um imóvel que era alugado pelo banco. O irmão mais novo deveria depositar eventual saldo remanescente nas contas bancárias dos demais.
Para viabilizar a operação, os quatro primeiros irmãos lavraram uma procuração pública e conferiram ao mais novo os poderes de gestão dos valores.
No entanto, após divergências quanto às receitas e despesas, o terceiro irmão revogou os poderes conferidos ao quinto. Na Justiça, ele pediu uma prestação de contas adequada, sob pena de pagamento de multa.
Em sua defesa, o réu alegou que não haveria motivos consistentes para dúvidas na relação contratual e apontou falta de lógica no pedido de prestação de contas voltado a alguém que não administra mais o patrimônio do autor. Na contestação, também alegou que o autor deve dinheiro para o réu, já que o irmão mais novo haveria adiantado despesas em nome do patrimônio comum.
O caçula foi condenado a prestar contas da administração do imóvel. Mais tarde, o autor impugnou as contas apresentadas e o juízo confirmou que elas não eram válidas, pois não foram apresentadas no formato mercantil e nem acompanhadas de documentos que comprovassem todos os créditos e gastos efetuados.
Na sentença, Barros confirmou que a planilha de cálculos trazida pelo réu não veio acompanhada de "documentação idônea a corroborar todos os lançamentos indicados".
Assim, o magistrado declarou a existência de saldo devedor do réu no período de julho de 2020 em diante, determinou a apuração da cota do autor por meio de perícia contábil e condenou o réu a restituir o montante.
Barra de Souza ainda lembra que, pelo artigo 552 do Código de Processo Civil, a sentença em uma ação de exigir contas precisa ser líquida. Dessa forma, segundo ele, o juiz não poderia ter deixado a apuração do valor a cargo da perícia contábil.
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Processo 0721386-75.2020.8.07.0001
José Higídio – Repórter da revista Consultor Jurídico.
Fonte: Revista Consultor Jurídico – 20/10/2022