Disputa por ICMS-Difal na base de PIS e Cofins gera limbo recursal

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O contribuinte e a Fazenda Nacional não têm a quem recorrer em Brasília quando querem discutir a inclusão do ICMS-Difal na base de cálculo das contribuições ao PIS e à Cofins.

O Supremo Tribunal Federal entende que não pode julgar o tema, por seu caráter infraconstitucional. E o Superior Tribunal de Justiça diz que também não, porque a causa tem contornos constitucionais.

O Difal é o imposto usado para compensar a diferença entre as alíquotas do ICMS quando uma empresa em um estado faz uma venda para o consumidor final em outra unidade da federação — situação que se tornou frequente com o crescimento do e-commerce.

O limbo recursal é causado pelo fato de o tema ser uma das teses-filhotes da chamada “tese do século” — aquela em que o Supremo retirou o ICMS da base de cálculo de PIS e Cofins, firmada em 2017 e modulada em 2021.

Decidir se as razões que levaram à fixação da “tese do século” se aplicam no caso do ICMS-Difal obrigaria o STJ a avaliar a argumentação constitucional.

Essa jurisprudência foi confirmada em setembro, com a publicação do acórdão do REsp 2.133.501, julgado pela 2ª Turma da corte superior. A 1ª Turma, que também se dedica ao Direito Público, adota a mesma posição.

Já no Supremo, ambas as turmas entendem que a questão da inclusão do ICMS-Difal na base de cálculo do PIS e da Cofins não tem natureza constitucional, ainda que ela tenha sido decidida em decorrência da “tese do século”.

Essa posição é embasada pela conclusão do Plenário no Tema 1.098 da repercussão geral. O objetivo do recurso era decidir se é viável excluir da base de cálculo de PIS e Cofins o montante correspondente ao ICMS destacado nas notas fiscais ou recolhido antecipadamente pelo substituto em regime de substituição tributária progressiva.

“De se ver que a ratio decidendi daquele precedente vinculante é integralmente aplicável a este caso, porquanto o exame da controvérsia relativa à inclusão do montante correspondente ao ICMS-DIFAL na base de cálculo da Contribuição ao PIS e da COFINS também demanda o exame da legislação infraconstitucional de regência”, diz um acórdão da 1ª Turma do STF.

Repasse fiscal

Com isso, quem dá a palavra final, até o momento, são os Tribunais Regionais Federais. E há divergência entre eles, já que há registros de recursos rejeitados tanto da Fazenda Nacional quanto dos contribuintes.

Para Leonardo Roesler, tributarista do escritório RMS Advogados, a complexidade do tema, que envolve princípios constitucionais e os relaciona com a “tese do século”, torna mais indicado que o STF assuma a competência para resolvê-lo.

“O Difal é uma obrigação de equalização fiscal. Ele não compõe o faturamento ou a receita bruta da empresa. Logo, inclui-lo na base de cálculo dos contribuintes implicaria fazer a cobrança sobre um montante que não representa acréscimo patrimonial real.”

Na visão do advogado, a posição defendida pela Fazenda contraria os princípios da não cumulatividade e da capacidade contributiva, uma vez que a empresa não obtém benefício financeiro ou econômico com o recolhimento do ICMS-Difal.

“Ao contrário”, alerta Roesler, “está apenas cumprindo uma exigência de repasse fiscal. Isso pode resultar em uma distorção da tributação, criando um efeito cascata que agrava a carga tributária sobre os contribuintes.”

Luis Claudio Yukio Vatari, do Toledo Marchetti Advogados, entende que o aumento da carga tributária ao consumidor final por causa da inclusão do ICMS-Difal na base de PIS e Cofins é da ordem de pouco mais de 1%.

“Apesar de parecer pouco, se multiplicarmos o valor por todas as operações ocorridas desde a criação da sistemática fica claro que tais valores seriam significativos. Inclusive, uma decisão como essa afeta o fluxo de caixa dos contribuintes e do governo federal, que tenta equilibrar o orçamento.”

Limbos em extinção

Até o momento, outras causas de limbo recursal tributário entre STF e STJ foram resolvidas pela corte responsável por interpretar a lei federal.

A mais relevante é recente: a autorização conferida à Fazenda Nacional para adequar sentenças definitivas anteriores à modulação da “tese do século” pelo Supremo, restringindo o aproveitamento dos créditos de PIS e Cofins.

Como mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico, as ações rescisórias abriram um novo assalto na disputa sobre esses valores.

Inicialmente, o STJ indicou que não poderia analisar esses casos, já que envolviam a aplicação do Tema 69 do STF. O Supremo, por sua vez, recusava-se a julgá-lo porque o uso da rescisória é disciplinado no Código de Processo Civil, que é lei federal.

Outro caso de limbo recursal tributário foi o de verbas incluídas na base de cálculo do Pasep. A disputa era pela classificação de valores como receita. Esse conceito jurídico-financeiro é infraconstitucional — consta da Lei 4.320/1964.

Por outro lado, haveria também violação do artigo 110 do Código Tributário Nacional, segundo o qual a lei tributária não pode alterar conceitos presentes em outros ramos do Direito para definir ou limitar competências tributárias.

Há, portanto, o conflito entre uma lei ordinária (Lei 4.320/1963) e uma lei complementar (CTN), tema que não pode ser analisado pelo STJ por ter índole constitucional.

1ª Turma do STJ resolveu essa questão em abril deste ano: a sorte superior pode julgar casos que se baseiam no conflito entre lei ordinária e lei complementar, desde que a primeira tenha como fundamento de validade a segunda.

REsp 2.133.501

RE 1.454.941

RE 1.456.703

Danilo Vital – Correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.

Fonte: Revista Consultor Jurídico – 01/10/2024


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