A indústria paulista de vestuário já recebeu cerca de 200 autos de infração por trabalho ilegal nos últimos dois anos, desde quando foi iniciado um programa de fiscalização por parte da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de São Paulo (SRTE/SP). Essas irregularidades equivalem a multas de cerca de R$ 4,5 milhões que estão sendo cobradas de varejistas que contratam confecções para produzir suas peças.
A mais recente denúncia do Ministério do Trabalho envolve a varejista espanhola Zara, que tem cerca de 30 lojas no Brasil. Na confecção Aha, que presta serviços para a Zara, foram encontrados 52 tipos de irregularidades, que vão desde mão de obra infantil, falta de higiene, remuneração abaixo do piso até discriminação racial - a maioria dos 15 trabalhadores encontrados em situação irregular era de bolivianos de origem indígena. "Dos casos que flagramos até o momento, a Zara é a que mais apresentou irregularidades", disse Renato Bignami, assessor da Secretaria de Inspeção do Trabalho. A Zara será autuada em cerca de R$ 800 mil, mas pode recorrer.
A Inditex, controladora da Zara, informou por meio de comunicado que "exigiu que o fornecedor responsável pela terceirização não autorizada regularizasse a situação imediatamente. O fornecedor assumiu totalmente as compensações econômicas dos trabalhadores tal como estabelece a lei brasileira", informou a Inditex, por meio de comunicado. O grupo espanhol esclarece ainda que "as condições de trabalho dos terceirizados estão sendo regularizadas." A Inditex tem no Brasil cerca de 50 fornecedores fixos, que somam mais de 7 mil trabalhadores.
Outras grandes varejistas como Marisa, Pernambucanas e Collins também já foram autuadas por contratarem confecções que adotam práticas irregulares de trabalho em fiscalizações anteriores, segundo Bignami.
Marisa e Pernambucanas informaram, em reportagem do Valor de 7 de abril deste ano, que descredenciaram as confecções que trabalham ilegalmente. A C&A está em processo de investigação, não chegou a ser multada e informou que assumiu compromisso de não trabalhar com confecções ilegais.
Em maio, a Defensoria Pública da União em São Paulo ajuizou uma ação civil pública contra a Collins que mantinha como fornecedor uma confecção que funcionava em condições precárias. Foram encontrados 22 bolivianos que não podiam transitar livremente, cumpriam escala extenuante e recebiam apenas R$ 1 por peça, segundo o defensor público Marcus Vinícius Rodrigues Lima, titular do Ofício de Direitos Humanos. "A empresa não pode fechar os olhos para uma terceirização, que funciona nessas condições, com o objetivo de maximizar os lucros", diz Lima.
Nesses dois anos de fiscalização nas confecções, 84 trabalhadores bolivianos foram resgatados, segundo dados da SRTE/SP.
"Desde 2006, quando houve uma CPI do trabalho escravo nas confecções na Câmara dos Vereadores [de São Paulo], as varejistas paulistas estão sendo alertadas. Então, essa prática não é admissível", disse o representante do Ministério do Trabalho.
A Associação Brasileira da Indústria do Vestuário (Abravest) estima que 10% do setor trabalha de forma irregular, o que equivale a cerca de 2,5 mil confecções. "O problema é permitir a quarteirização. Perde-se totalmente o controle", disse Roberto Chadad, presidente da Abravest. A Aha, fornecedora terceirizada da Zara, subcontratava outras 33 confecções.
Veículo: Valor Econômico