A presidente Dilma Rousseff vetou ontem o artigo 77 da nova medida provisória (MP) do Plano Brasil Maior, que reduzia tributos sobre os itens da cesta básica. Para contornar o prejuízo político do ato, Dilma publicou na sequência um decreto determinando a criação de um grupo de trabalho para definir uma nova proposta de desoneração e encontrar uma forma de dividir a conta com os estados. O grupo terá representantes da Casa Civil, dos ministérios da Fazenda, do Desenvolvimento Social e da Saúde, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e dos governos estaduais. Um relatório deverá ser concluído até 31 de dezembro.
O secretário-executivo adjunto do Ministério da Fazenda, Dyogo Oliveira, negou que o artigo tenha sido vetado por ter sido incluído na MP pelo líder do PSDB na Câmara, Bruno Araújo (PE), um parlamentar oposicionista. Segundo ele, o veto foi motivado “por questões técnicas”. A emenda isentava apenas os impostos federais: da Contribuição para os Programas de Integração Social e da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (PIS/Cofins) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).
“O texto estava mal redigido. Além de não especificar os produtos, não foi incluída a desoneração do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), de responsabilidade dos estados e com o maior peso nesses produtos”, afirmou Oliveira. Para ele, o impacto ainda seria mínimo e praticamente não haveria repasse ao consumidor. “Todos os itens da cesta básica já possuem isenção do IPI, com exceção do açúcar, e a maior parte deles tem créditos parciais de até 60% nos 9,25% de PIS/Cofins, como é o caso do leite, do feijão, do arroz, da farinha de trigo, do pão, das carnes e das massas”, completou.
Na opinião do senador Aécio Neves (PSDB), “a decisão mostra de forma clara a distância entre o discurso do PT e a prática política do PT. Essas propostas faziam parte do discurso do PT para atender população de mais baixa renda. No momento em que há recordes de arrecadação, o governo opta em fazer favores a grandes conglomerados econômicos, como na redução do IPI e, na hora de atender a população de baixa renda, veta a proposta que era do próprio PT”. O senador reforça que o PSDB reapresentou a proposta porque acredita em uma economia de 20% no valor gasto com a cesta básica pela classe mais baixa. “É mais uma incoerência do PT, contrariando discursos inclusive de campanha. O PT é um no discurso, outro na prática, e quem paga é a população de baixa renda”, destacou o senador.
PACOTE RECHEADO O veto da desoneração da cesta básica faz parte dos outros 17 itens que a presidente Dilma excluiu da Lei 12.715, sancionada ontem e que também amplia de 15 para 25 os setores beneficiados pela desoneração da folha de pagamento. Outros 15 setores entrarão em uma nova MP, sem data para ser publicada. Um ponto polêmico ficou por conta do veto da emenda que definia o termo receita bruta sobre o qual incide a nova alíquota para os setores beneficiados com a desoneração da folha. “O governo entendeu que não há necessidade dessa definição porque a nova alíquota sempre incidiu sobre a receita bruta, que é o termo técnico”, disse Oliveira. Segundo ele, a receita bruta engloba tudo, inclusive ganhos financeiros.
No entender da indústria, esses ganhos estavam fora da conta. Para a Confederação Nacional da Indústria (CNI), “o veto permite maior redução dos custo das empresas e o consequente aumento da competitividade”. Diante do impasse, o secretário informou que o governo pretende negociar com os setores contemplados para preparar uma nova MP com as definições sobre qual receita incidirá a nova alíquota. (Colaborou Leonardo Augusto)
Classe média poderosa
Se a classe média brasileira fosse um país, seria o décimo segundo maior. Dados apurados pela Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), ligada à Presidência da República, mostram que 53% da população — um exército de 104 milhões de pessoas — estão nesse nível sócioeconômico. Dez anos atrás, somente 38% encontravam-se no mesmo patamar. Desse crescimento, 29 milhões são decorrentes da ascensão de 29 milhões de pobres e outros 8 milhões da expansão natural da população do país.
As informações fazem parte da primeira etapa da pesquisa Vozes da Classe Média, que está sendo realizada pela SAE, no intuito de produzir conteúdo para que o governo consiga reformular suas políticas, de forma a atender as necessidades desse público emergente. No estudo, foram considerados pertencentes à classe média todos aqueles com baixa probabilidade de passarem a ser pobres no futuro próximo. Tratam-se das famílias que vivem com renda per capita entre R$ 291 e R$ 1.019 por mês. Abaixo de R$ 291, encontra-se a classe baixa e acima de R$ 1.019, a alta.
O documento, o primeiro de uma série que será elaborada trimestralmente pela SAE, apresenta dados a respeito do perfil dessa população que surpreenderam o próprio governo. A diferença, por exemplo, entre o percentual de brasileiros em cada camada da população que possuem casa própria não é grande: corresponde a 72% da classe baixa, a 75% da média e a 80% da alta. “Se a maioria das pessoas em todas as classes já possuem uma casa, faz mais sentido que se aumente a oferta de crédito para reforma do que para aquisição do primeiro imóvel. Também se torna mais importante investir em saneamento e energia”, avaliou a diretora da SAE, Diana Grosner.
Outro aspecto que surpreendeu os técnicos é que a classe média, que vem investindo em educação — especialmente, priorizando os cursos de nível superior — não considera que a elevação do nível de escolaridade vá produzir uma melhora de renda. “Isso pode significar que as pessoas consideram que é mais importante ter uma rede de relacionamentos do que uma formação, como o caso da pessoa que desiste de fazer medicina porque não está numa família de médicos”, afirmou Grosner.
Veículo: Estado de Minas