A substituição tributária do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) foi levada à Justiça por vários segmentos varejistas do Estado de São Paulo. O dispositivo questionado é o que tira o direito desse segmento comercial de ter a restituição do ICMS pago a mais quando as margens de lucro usadas para o cálculo do imposto antecipado dão origem a um valor maior do que o preço efetivo na venda ao consumidor final.
Foram à Justiça grandes varejistas como Wal-Mart e empresas ligadas ao grupo Pão de Açúcar - além da própria Companhia Brasileira de Distribuição, Sé Supermercados e Barcelona Comércio Varejista e Atacadistas, a rede Assai. O comércio do setor de veículos também questiona o assunto. Concessionárias procuraram individualmente o Judiciário e a Associação Brasileira de Distribuidores Volkswagen (Assobrav) ajuizou ação para pedir o direito à restituição do ICMS. A substituição também levou indústrias do setor de informática ao Judiciário. Elas querem prazo de 90 dias para a mudança no cálculo do imposto (ver texto abaixo).
Idealizada para eliminar a sonegação fiscal, a substituição tributária é um regime pelo qual a indústria antecipa à Fazenda o recolhimento de ICMS que seria feito normalmente pelos atacadistas e varejistas. Esse pagamento antecipado da indústria é feito com base em preços resultantes da aplicação de margens estimadas de valor adicionado. O fabricante antecipa o ICMS, que é adicionado ao preço da mercadoria adquirida por atacadistas e varejistas.
O problema ocorre quando o valor resultante da aplicação da margem é maior do que o preço efetivamente cobrado na venda ao consumidor final. Quando isso acontece, o recolhimento de ICMS é maior do que o imposto que seria pago com base no preço de venda do varejista.
Até o ano passado, essa diferença de ICMS pago a mais era restituída pela Fazenda. Mas uma lei editada em dezembro derrubou a devolução desses valores. Para os tributaristas, a nova regra prejudicou os varejistas. "Há casos em que as margens da substituição estão menores do que as praticadas. Mas na maioria das vezes o varejista perde porque as margens da substituição estão mais altas", diz Perón. Ele diz que o problema se agrava com segmentos varejistas muito competitivos, onde há frequente variação de preços e margens menores.
O Estado de São Paulo tende a concentrar as grandes discussões dos varejistas. "Em São Paulo pesam não só as margens altas mas também o alto nível de consumo", diz Júlio de Oliveira, do escritório Machado Associados.
Foi exatamente a representatividade no mercado paulista na venda total de veículos que levou a Assobrav, que reúne distribuidores da marca Volkswagen, a pleitear a devolução da diferença de ICMS na Justiça. O diretor-jurídico da associação, Mauro Imperatori, explica que o imposto por substituição sobre veículos é recolhido pelas montadoras com base na tabela de preços sugeridos pelo fabricante. "Em São Paulo o mercado é muito competitivo e frequentemente os carros são vendidos a valores abaixo da tabela", explica. Antes, lembra Imperatori, as concessionárias demoravam para ter o ICMS de volta, mas, agora, essa diferença virou perda definitiva.
Existem setores, porém, que preferiram mudar sua forma de organização e evitar o Judiciário. No caso da indústria de autopeças, a substituição provocou aumento do número de centros de distribuição pelo comércio varejista, numa tentativa de simplificar o planejamento tributário das revendas. George Luiz Rugitsky, diretor do Sindipeças, entidade que reúne indústrias do setor, explica que agora, com a substituição, o fabricante recolhe antes o ICMS e o distribuidor fica em desvantagem se for vender em outro Estado.
Otavio Fineis Junior, coordenador de administração tributária da Secretaria da Fazenda de São Paulo, diz que o Supremo Tribunal Federal tem várias decisões a favor do fisco concluindo que a substituição tributária é um instrumento legítimo e não cabe, em caso de diferenças de valores, restituição do imposto ou cobranças suplementares.
Ele diz que as margens para cálculo da substituição são definidas com base em pesquisas que indicam valores médios de mercado e, por isso, há situações em que a Fazenda recolhe mais e, outras, em que recolhe menos. "Dessa forma, na média, o valor transferido para o setor público é o justo."
Segundo Fineis, a restituição do imposto na substituição causava distorções no mercado. Os grandes supermercados que mantêm postos de gasolina, por exemplo, praticavam preços menores e compensavam o ICMS antecipado sobre combustíveis com o imposto devido sobre os demais produtos vendidos na loja. Os postos de gasolina que não estavam ligados a supermercados, porém, não tinham essa vantagem. Outro setor, é o de automóveis, diz Fineis. Segundo ele, as concessionárias manipulavam o valor do carro usado que era dado em troca. Assim, conseguiam baixar o preço declarado do veículo novo e ter direito a uma restituição maior.
Empresas de informática pedem mais tempo
Em uma frente de discussão diferente da dos grandes varejistas, algumas indústrias do setor de informática foram à Justiça de São Paulo para pedir uma prazo maior para a entrada da substituição tributária de ICMS sobre os produtos que fabricam. Dell Computadores do Brasil, Epson Paulista e Hewlett Packard Brasil pedem em ações judiciais prazo adicional para que a substituição seja aplicada nas vendas de suas mercadorias.
As três fabricantes conseguiram liminares que lhes garantem prazo de 90 dias contados a partir do decreto que incluiu alguns produtos de informática no regime de pagamento antecipado do ICMS. O decreto é de abril. As três indústrias passarão a aplicar a substituição, portanto, somente em meados do mês de agosto. A Secretaria da Fazenda havia determinado aplicação do regime a partir de junho.
No pedido de liminar, as empresas não questionaram o regime de substituição tributária em si, mas alegaram a necessidade de prazo mínimo de 90 dias antes da aplicação de mudança de norma sobre cálculo de impostos.
Na liminar concedida à Dell Computadores, a juíza Maria Gabriella Pavlopoulos Spaolonzi levou em consideração que as alterações estabelecidas pelo Decreto n 54.338, de 16 de maio, e pela Portaria n 95, de 23 do mesmo mês, passaram a vigorar a partir de 1 de junho. Para a juíza, não houve tempo hábil suficiente para garantir à empresa condições essenciais para a necessária adequação. Procuradas, a Dell e a HP não se manifestaram sobre o assunto.
Em nota, André Vaz, diretor de operações e finanças da Epson do Brasil diz que a empresa solicitou uma prorrogação apenas por conta das dificuldades que teve na adaptação do sistema à implementação. A empresa, porém, já está se adequando às mudanças. Ele destaca que a companhia apoia todo e qualquer projeto para redução de sonegação fiscal.
A Fazenda informou que desde janeiro vinha discutindo a substituição tributária no setor e, por isso, as empresas teriam tido tempo hábil para se adaptar.(MW)
Veículo: Valor Econômico