Depois de alcançarem R$ 400 por saca de 60 quilos em fevereiro, maior patamar desde 2016, os preços pagos aos produtores de feijão do país caíram 45% em apenas um mês diante da proximidade da colheita da segunda safra desta temporada 2018/19 e tendem a continuar pressionados com a renovação da oferta. No varejo, porém, os consumidores só deverão sentir algum alívio em cerca de dois meses.
Entre dezembro e fevereiro, os valores oferecidos aos agricultores subiram 60% em decorrência dos problemas observados na primeira safra nas regiões Sul e Sudeste, onde uma prolongada estiagem prejudicou as lavouras. Como os estoques estavam baixos em razão de uma oferta menor que a esperada na terceira e última safra do ciclo 2017/18, estava criado o espaço para o salto.
Com pouca oferta e sem poder importar - o Brasil é o único país a produzir feijão carioca, o mais consumido no país - indústria e varejo repassaram imediatamente a disparada aos consumidores. Nas gôndolas, somente em fevereiro a alta foi de 51,58% segundo o IPCA. No período de 12 meses encerrado em fevereiro passado, a valorização acumulada chegou a 102,34%, sendo que o índice geral para o período atingiu 3,89%.
A colheita da segunda safra da temporada 2018/19 deverá começar em poucas semanas. Segundo estimativa da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a colheita do carioca deverá atingir 613,6 mil toneladas, 28,6% mais que no mesmo período de 2017/18. Somados todos os tipos de feijão produzidos no país (caupi, jalo etc), a produção deverá somar 1,36 milhão de toneladas, um avanço de 11,5%. No total, as três safras de 2018/19 estão projetadas em 3,07 milhões de toneladas, para um consumo de 3,15 milhões.
"Do produtor ao consumidor final tem a preparação do grão, embalagem e distribuição. Esse processo leva um tempo, por isso a queda dos preços nas gôndolas vai demorar um pouco mais", afirma Marco Aurélio Lima, diretor do GFK, empresa de pesquisa de mercado que faz o monitoramento de preços nos supermercados para a Associação Brasileira de Supermercados (Abras).
Lázaro Moreto, CEO da Broto Legal Alimentos, uma das maiores empresas do segmento no país, é mais otimista. Segundo ele, alguns varejistas poderão acusar já neste mês o efeito da queda de preços no campo e, assim, acelerar o repasse para o varejo. "O reposicionamento dos estoques do feijão é semanal, com o pagamento no início do mês. O varejo deverá renovar todo o estoque em breve", diz o executivo.
Mas Moreto reclama que o mercado de feijão continua complexo e difícil de gerenciar. "O melhor é conseguir planejar o médio e o longo prazos. Suplemento versus venda. Mas isso não acontece no feijão", afirma. "É como diz uma velha expressão que usamos nesse mercado: 'você pode dormir rico e acordar pobre', já que a mudança de preços é sempre muito violenta", completa.
Nesse contexto, um dos agravantes, tanto para a indústria quando para o varejo, é que não se pode estocar feijão, uma vez que o grão perde cor e qualidade - o que não acontece com o arroz, por exemplo. O CEO da Broto Legal lembra que, no ano passado, os preços despencaram em consequência do excesso de oferta, o que desestimulou o plantio na temporada 2018/19. Agora acontece justamente o contrário.
O presidente do Instituto Brasileiro do Feijão e Pulses (Ibrafe), Marcelo Lüders, afirma que, para se proteger, os produtores de feijão devem semear outras variedades além do carioca. De preferência exportáveis, como caupi, preto e jalo. Outros pulses, como grão de bico e ervilha, também são boas opções. "É preciso abrir mercado, assim o produtor terá colchão financeiro. E se os preços tiverem ruins aqui, é possível vender no exterior. É preciso que o mercado amadureça".
No tocante à organização do mercado, o Ibrafe tem participado de reuniões em Brasília com representantes do Ministério da Agricultura para mostrar os problemas do segmento. E, também nesse sentido, foi criado o Conselho Brasileiro do Feijão e Pulses, com representantes do Ibrafe, Câmara Setorial da Cadeia Produtiva do Feijão (Acebra), Sindicato Rural de Sorriso (MT), Aprosoja de Mato Grosso e empresas como Camil e Arbaza Alimentos.
Fonte: Valor Econômico