Consumo da bebida disparou no Brasil, principalmente nestes dois anos de pandemia
A maior oferta de vinhos mais robustos tem a ver com a mudança climática – que acelera o processo de maturação das uvas, aumenta a concentração de açúcar e o teor alcoólico – e com modas que seguiram o gosto do crítico norte-americano Robert Parker, que preferia vinhos mais fortes. Mas o gosto por vinhos mais leves pode estar mudando o mercado, segundo especialistas.
Com pontuação mais elevada dada por Parker, os vinhos mais alcoólicos vendiam mais e os produtores passaram a seguir a onda. Segundo o Australian Wine Research Institute, o teor alcoólico de centenas de vinhos subiu de 12,4% em 1984 para 14,2% em 2002.
Além dos Estados Unidos, vários países acompanharam a moda global, entre eles França, Espanha e Portugal. No entanto, para o “máster of wine” Dirceu Vianna Junior, os vinhos da era Parker estão gradativamente ficando fora de moda. “Tenho observado a busca por produtos com mais harmonia, mais frescor, mais elegantes e mais leves, mas está cada vez mais difícil produzi-los devido aos desafios climáticos”.
Ele diz que o setor precisa se empenhar em educar consumidores sobre os aspectos positivos do consumo moderado para a saúde e que sempre haverá um pequeno mercado para vinhos com alto teor de álcool, especialmente em países onde a cultura do vinho ainda está em fase de desenvolvimento. “Em países onde a comercialização e o consumo estão mais desenvolvida, como é o caso da maioria dos países europeus, é provável que os consumidores continuem reduzindo o consumo de álcool e, no futuro, a tendência favorecerá estilos de vinhos mais frescos, mais leves, mais fáceis de beber”.
“Eu chamo esses vinhos pesados de vinhos-pesadelo. Você tem o copo na mão e vai virando”, diz Dirk Niepoort, que produz em várias regiões portuguesas: Bairrada, Dão, Douro, Portalegre e Vinho Verde e, ainda, na Alemanha e Espanha. Sua empresa, a Niepoort, que exporta para 72 países, estará presente na 8ª edição do Vinhos de Portugal, evento que será digital pelo segundo ano consecutivo e terá a participação de 66 produtores.
Niepoort diz que seus rótulos seguem o estilo mais leve desde 2014 quando ele próprio assumiu a vinificação e contratou um novo enólogo. Mas comenta que muitos de seus concorrentes e colegas falam disso mas nada fazem. “Parece que o consumidor está mais avançado do que os engenheiros que fazem o vinho em Portugal e muitos não sabem fazê-lo. Para fazer vinhos mais leves é preciso um pouco menos de tudo. Menos maturação, menos vinificação, menos madeira”.
A mudança lenta também é observada por importadoras como a Grand Cru que nos últimos seis anos reforçou e ampliou seu portfólio de vinhos portugueses. O sommelier executivo da importadora, Massimo Leoncini, diz ter se empenhado na busca por mais elegantes, de teor alcoólico menor. Ele lembra que, atualmente, 87% das importações de vinhos portugueses no Brasil são de rótulos abaixo de R$ 100. Como o preço é mais acessível, em geral, são produtos de menor valor agregado e teor alcoólico mais baixo.
Outro dado interessante é que nos últimos quatro anos (entre 2017 e 2020) a importação de vinhos portugueses brancos aumentou 62%, a de rosés 226%, enquanto a de tintos apenas 26%. Leoncini atribui essa mudança ao clima quente e à chegada de novos consumidores, mais jovens, que tomam vinho em qualquer ocasião, com qualquer comida e até na balada depois dos drinques.
“A pandemia também mudou hábitos de consumo de vinho no Brasil”, avalia Leoncini. “A frequência passou a ser diária em casa de muitas famílias, o que levou a uma procura por vinhos mais leves e mais fáceis de beber”.
Fonte: Valor Econômico