Sul deve perder 40% de seus suinocultores

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Com mais de 16 anos de atuação na cadeia da suinocultura brasileira, o produtor do oeste catarinense Marcos Spricigo resolveu deixar a atividade na semana passada, reflexo das crises vividas no setor, agravadas pelo embargo russo e ucraniano às exportações de carnes do País. Este é o exemplo que precede a quebradeira dos produtores de suínos nacionais, principalmente em Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul, que preveem a saída de aproximadamente 40% de seus suinocultores neste ano se a situação não for revertida nos próximos dias.

 

Enquanto o setor de carnes em geral está apreensivo em relação à resolução final da crise entre Rússia e Brasil, o setor produtivo de suínos está à beira de uma pane total. Isso porque o embargo, que afetou 85 frigoríficos brasileiros em três estados, manteve apenas um frigorífico embarcando a proteína para os russos, que consomem mais de 230 mil toneladas dessa carne do Brasil por ano.

 

Em Santa Catarina, a produção anual dessa proteína é de 700 mil toneladas, vindas de aproximadamente 12 mil produtores. Segundo o presidente da Associação Catarinense de Criadores de Suínos (ACCS), Losivanio Luiz de Lorenzi, o embargo "foi apenas a gota-d'água em um copo cheio", visto que as crises no setor estão mais frequentes e mais longas. "Os produtores de suínos brasileiros já sofrem com as crises anteriores. Esse embargo pode derrubar uma boa parte desses resistentes, pois eles vendiam no mercado regional, que já está sendo tomado por carnes das indústrias que não estão conseguindo exportar. Isso é uma cadeia", disse.

 

As agroindústrias do País já confirmaram que a medida a ser adotada é escoar sua produção no mercado interno, uma vez que não há outra opção no momento. Para o presidente da Aurora Alimentos, Mário Lanznaster, uma parte será estocada, e a outra, comercializada no próprio mercado brasileiro. "O Mapa demorou demais. Agora todos no setor pagarão o pato, e algumas empresas acabarão fechando porque não têm como sobreviver. Essas carnes terão de entrar no mercado interno, e vão tumultuar ainda mais os preços. Não temos como reduzir a produção de suínos de uma hora para outra, porque a criação é diferente. Além disso, teremos de estocar boa parte da produção, e isso é ruim, porque conservar carnes nas câmaras tem um custo muito alto", analisou ele.

 

Para o presidente da ACCS, a crise deve desencadear a mudança de atividade de 40% dos produtores da região, que já possuem altas dívidas e não suportarão mais tempo. "Estimamos que 40% dos nossos suinocultores estão na faixa de risco, e devem deixar a atividade. Irão sobrar poucos produtores no estado, caso a situação não mude nos próximos dias", enfatizou Lorenzi.

 

O produtor catarinense Marcos Spricigo não quis aguardar uma solução, e resolveu deixar a atividade na semana passada. Com perdas na casa de R$ 150 mil na semana seguinte em que o embargo russo foi anunciado, a decisão não poderia ser outra, afirmou ele. "Decidi fechar meu negócio por falta de viabilidade. Qualquer atividade depende de resultados positivos. Os produtores perdem atualmente uma média de R$ 80 por cabeça; como posso ver perspectivas futuras de continuar com uma atividade que dá tanto prejuízo? Esse embargo foi a gota-d'água para o fim da minha propriedade, pois, além da crise especulativa que enfrentamos diariamente, ainda pagamos as contas das crises anteriores. Assim não dá", comentou Marcos Spricigo.

 

Em Santa Catarina a situação é tão grave que alguns produtores já ameaçaram deixar seus animais soltos no campo, e nas ruas, por não ter como alimentá-los. "Já ligaram muitos produtores chorando, dizendo que soltarão seus animais no campo porque não têm como alimentá-los. Por isso precisamos de uma intervenção imediata do governo, para não começarmos a encontrar animais soltos pelas ruas, pois os produtores não têm mais dinheiro para comprar milho, que está muito caro", disse Lorenzi.

 

No Rio Grande do Sul a situação é a mesma: dos 10 mil produtores do estado, 35% devem deixar de produzir suínos este ano. Para o presidente da Associação dos Criadores de Suínos do Rio Grande do Sul (Acsurs), Valdecir Folador, a situação no estado é agravada pelo movimento das indústrias. "Está acontecendo um aproveitamento por parte do setor industrial, que joga os preços no chão, sem motivos aparentes. Os volumes embarcados para a Rússia e para a Ucrânia até a metade do mês foram bastante significativos, e elas não estavam com estoques tão grandes. Mas ainda assim as indústrias estão se aproveitando do momento para comprar barato e estocar para vender mais caro depois", contou o presidente da entidade.

 

Já o Paraná que possui uma grande quantidade de produtores pequenos de suínos, cerca de 30 mil, que produzem 500 mil toneladas por ano, quase 15 mil criadores devem deixar a atividade se uma solução não for apresentada nos próximos dias, estimou a Associação Paranaense dos Suinocultores (APS). Segundo Carlos Francisco Geesdorf, presidente da entidade, reabrir a África do Sul, aumentar os embarques para a Argentina, ou tentar vender no mercado paulista, que consome anualmente 270 mil toneladas, é uma saída momentânea. "O produtor ficará com essa produção na mão, pois os porcos não são como as aves, que é só interromper a incubação e pronto. Ainda vimos que estão tentando reabrir o mercado da África do Sul, que compra muito pouco, ou ampliar as vendas para a Argentina, que nem consegue consumir o que tem; isso não é saída definitiva", disse, e emendou: "A Rússia sempre foi uma bomba-relógio, pois comprava boa parte da produção brasileira, e quando parasse o prejuízo seria enorme. Agora, juntando a Ucrânia nessa conta, fica mais difícil."

 


Veículo: DCI


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