A nova etapa da Operação Carne Fraca, deflagrada ontem pela Polícia Federal, adiciona tensão à crise da BRF e promete um novo impacto negativo para o mercado de carnes brasileiro, um ano após a primeira fase da investigação.
Batizada de “Operação Trapaça”, a terceira etapa da Carne Fraca apura a fraude de laudos laboratoriais pela BRF – maior player do setor de aves do País – para burlar a fiscalização do Ministério da Agricultura (Mapa) e ocultar a contaminação de carne de aves com a bactéria Salmonella ssp por meio da alteração de análises envolvendo empresas privadas e laboratórios ligados ao Mapa.
Na avaliação do presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Francisco Turra, a operação deve trazer prejuízos à imagem do País no mercado interno e também externo. No entanto, segundo ele, o impacto não deve se equiparar às perdas registradas no ano passado, quando o setor deixou de exportar o equivalente a R$ 150 milhões em carne de frango. “Acredito que o estrago será o menor possível”, afirma Turra. “Há um dano para a imagem [do produto brasileiro no mercado externo], mas não será maior porque as providências necessárias já estão sendo tomadas”, garantiu o dirigente. O Mapa informou que as quatro unidades da BRF envolvidas na investigação estão impedidas de exportar para 12 mercados.
Para a diretora da Agrifatto, Lygia Pimentel, o novo episódio deve ter um impacto menos intenso nas exportações se comparado com a primeira etapa das investigações. Após a deflagração da operação Carne Fraca, em 17 de março do ano passado, 70 países fecharam as portas ao produto brasileiro. “No ano passado, fomos pegos de surpresa. Agora, acredito que haverá uma capacidade de compreensão melhor por parte dos mercados”, avalia Lygia. Embora classifique a situação como “menos desesperadora”, ela não descarta a possibilidade de suspensão de importações. “Podemos esperá-las, mas com menos intensidade”, opina. Lygia pondera que os europeus podem utilizar a operação para obter mais vantagens no acordo em discussão com o Mercosul.
Na avaliação do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais Federais Agropecuários (Anffa), a operação coloca em xeque a intenção do governo de terceirizar o sistema de inspeção. “É mais uma prova de que o serviço precisa ser realizado por profissionais que tenham independência e autonomia. Não é possível ser feito por quem sofre influência econômica das empresas”, defende o presidente do sindicato, Maurício Porto, em nota.
O presidente da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), Antonio Camardelli, não espera que a operação afete as exportações de carne bovina. “É uma questão circunscrita a uma empresa”, justifica o dirigente. “Ainda assim, comunicamos aos mercados que o caso não envolve a carne vermelha”, complementa.
Crise interna
Diante das acusações de que executivos da BRF tinham conhecimento das alterações e atuaram para encobrí-las – o que levou à prisão preventiva do ex-diretor presidente da empresa, Pedro Andrade de Faria –, a situação do presidente do conselho de administração da companhia, Abílio Diniz, ficou mais delicada. A permanência dele no cargo é questionada pelos fundos de pensão Petros e Previ, que indicaram nomes para substituí-lo depois que a empresa anunciou prejuízo de R$ 1,1 bilhão no ano passado.
Ontem, as ações da BRF caíram 19,75% e o valor de mercado da companhia apresentou retração de R$ 5 bilhões, para R$ 20 bilhões. O movimento levou de arrasto as ações da JBS (-5%), Minerva (-0,43%) e Marfrig -0,95%).
“Trata-se de um cenário difícil para a companhia”, afirma o estrategista de investimentos da Upside Investor, Shin Lai. Ele explica que, por um lado, os argumentos contra Diniz ganham força. De outro, a empresa deixa de focar em uma recuperação para se dedicar à investigação em curso. “Ainda podem ocorrer desdobramentos sobre como os clientes vão avaliar a qualidade do produto e também se haverá alguma restrição ao produto brasileiro no mercado externo”, conclui.
Fonte: DCI São Paulo