Serasa detecta aumento da inadimplência nas classes C e D e alta preocupa analistas

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Em meio à euforia com a recuperação econômica e à fartura de crédito, acendeu a luz amarela entre especialistas. Após duas elevações seguidas da taxa básica de juros (Selic) e com a perspectiva de novas altas até o fim do ano, o que encarece os empréstimos, a taxa de inadimplência deve ter um repique em junho. A Serasa Experian vem detectando o avanço, puxado por consumidores das classes C e D, que receberam benefícios do governo para a compra de produtos da linha branca e veículos e, agora, não conseguiriam honrar seus compromissos.

 

- Podemos dizer que a curva de queda, que vinha ocorrendo desde outubro do ano passado, está no fim. A renda não deve crescer tanto no segundo semestre, gerando um descompasso que pode causar problemas para a inadimplência - afirmou o economista Luiz Rabi, gerente de indicadores de mercado da Serasa. - Normalmente, os consumidores mais pobres não estão acostumados a lidar com o crédito. Eles têm pouca habilidade para gerenciar dívida, praticamente não têm poupança e acabam inadimplentes.

 

O primeiro sinal de alerta apareceu em maio passado. Na maior alta desde outubro do ano passado, a inadimplência do consumidor deu um salto de 1,9% no mês, na comparação com maio de 2009. Em relação a abril, a variação chegou a 4,3%. Na próxima semana, a Serasa Experian vai divulgar a sua pesquisa referente a junho (e ao fechamento do primeiro semestre). Dificilmente a taxa repetirá os patamares críticos registrados no fim de 2008, quando estourou a atual crise global, mas os índices deixarão de ser tão baixos como foram até abril.

 

Para a Serasa, o maior problema a curto prazo estaria na administração das dívidas no cartões de crédito, que subiram 14% em abril e 26% em maio, na comparação com o mesmo mês do ano passado. Rabi diz que essa alta deve permanecer no segundo semestre. O valor médio dessas dívidas é hoje de R$ 392,49, contra R$ 373,12 um ano atrás. Crescimento mais forte foi registrado no valor médio dos cheques não compensados por falta de fundos, que pulou 42,7% desde maio de 2007 (de R$ 855,83 para R$ 1.221,03).

 

Desaceleração da economia contribuirá

 

A Tendências Consultoria também estima que a taxa de inadimplência de pessoas físicas chegue ao fim do ano em 7,2% e acelere ainda mais, para 7,6%, em 2011. Pelos dados do Banco Central (BC), o índice - que considera o percentual de empréstimos com atrasos acima de 90 dias frente ao total de crédito - foi de 6,8% em maio (último dado disponível), o mais baixo desde março de 2008 (6,85%). A taxa recua desde maio do ano passado, quando atingiu 8,5%.

 

- Deve ocorrer uma reversão da trajetória de queda na inadimplência a curto prazo. A alta de juros deve provocar piora nas condições de pagamentos, com aumento nas taxas finais e encurtamento dos prazos dos créditos - diz o economista da Tendências Alexandre Andrade, destacando que o impacto deve ser maior no próximo ano, por causa do período de defasagem entre a alta de juros e o impacto na economia.

 

Ruy Quintans, professor de Economia do Ibmec/RJ, concorda:
- A inadimplência deve parar de cair. Vivemos um momento de transição entre a euforia e a depressão no varejo e no custo do dinheiro.

 

Para o professor da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA/USP) Fabio Kanczuk, haverá alta da inadimplência, associada à esperada desaceleração da economia.
- O mais provável é que aumentem os atrasos nos pagamentos de dívidas. A subida dos juros e a atividade econômica em desaceleração contribuem para esse cenário - afirma Kanczuk.

 

Na opinião do professor da Universidade de Brasília (Unb) Jorge Pinho, a melhora do mercado de trabalho tem contribuído para o aumento do endividamento.
- Com notícias positivas, o trabalhador se sente mais seguro e tende a se endividar mais. Mas, com alta nos juros, a tendência é de maior inadimplência a médio prazo - diz Pinho, especialista em mercado de trabalho.

 

Em relatório recente, a agência internacional de classificação de risco Moody's também chamou a atenção para o perigo das dívidas. Ao analisar as condições de crédito para o mercado bancário brasileiro, a agência afirmou que a situação é estável. Porém, o forte crescimento da economia e a expansão do crédito, especialmente para as classes C e D, podem levar a um aumento da inadimplência dos bancos nos próximos 12 a 18 meses. Até março, os balanços publicados apresentaram resultados positivos, com queda da inadimplência e das chamadas provisões para devedores duvidosos.

 

O economista-chefe da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), Rubens Sardenberg, porém, acredita que a inadimplência no setor só subirá em caso de estagnação econômica.
- Não é isso que vejo no nosso horizonte hoje. Ao contrário, existe até a preocupação se haveria um superaquecimento da economia.

 


Veículo: O Globo


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