Os adultos do País têm mais contas que a Índia e a Rússia, e estão na frente da média dos BRICS. Porém, quanto à poupança, o Brasil fica na lanterna, em proporções 3 vezes menores que a China.
A população brasileira aumentou o nível de relacionamento com os bancos, está tomando mais empréstimos, mas ainda poupa pouco dinheiro, aponta Relatório de Inclusão Financeira (RIF) do Banco Central.
Segundo o documento, 84,5% dos adultos do País tinha algum contato com instituições financeiras em 2014, contra uma parcela de 74,3% em 2010. A quantidade de pessoas com conta corrente saltou de 56% para 68% no período analisado.
Quando comparado com outros países que compõe os BRICS, o Brasil fica na frente da Rússia (67%, em 2014) e Índia (53%) em número de contas, e perde para África do Sul (70%) e China (79%), conforme dados do BC e do Banco Mundial.
Observando a fatia da população que possui poupança nos bancos, no entanto, a situação muda, e o Brasil figura como lanterna da lista. Enquanto somente 12% brasileiros tem uma conta de reserva financeira, 14% dos indianos a tem, 16% dos russos, 33% sul-africanos e 41% dos chineses (mais que o triplo em relação ao País).
De acordo com Manuel Enriquez Garcia, professor de economia da Universidade de São Paulo (USP) e presidente Ordem dos Economistas do Brasil (OEA), a renda e a falta de infraestrutura em serviços básicos fornecidos pelo Estado, como saúde e educação, são os principais inimigos da poupança.
"Existe uma camada de brasileiros que 'vive na sobrevivência' e não tem capacidade de poupar. Uma segunda camada, que ganha um pouco melhor, foge das escolas e hospitais públicos e gasta o excedente de renda com escolas particulares e planos de saúde", afirmou. "Apenas a terceira camada, que consegue suprir as necessidades básicas com qualidade, tem margem para guardar dinheiro".
O Banco Central apontou, no relatório, que, apesar do avanço da bancarização, "uma fração significativa não faz uso desse relacionamento [com o banco]". "A população de baixa renda mantém saldos muito baixos em contas de poupança, o que sugere que essas pessoas não fazem reserva financeira, mesmo com um instrumento de aplicação [cadernetas de poupança] com pontos positivos", avaliou.
A autoridade monetária demonstrou ainda, preocupação com o desequilíbrio da evolução dos depósitos (mais lenta) e o avanço do crédito (mais rápido). Segundo o RIF, 12% dos adultos do Brasil possuem algum empréstimo nos bancos. Nesse indicador, o País aparece na frente da Índia (6%), da Rússia (10%) e, inclusive, da China (10%), e empata com a África do Sul (10%).
"De fato, desenvolver o hábito de poupar, em especial, com o objetivo de formar reserva financeira, é um desafio para inclusão financeira, para os próximos períodos", ponderou o regulador.
Garcia lembrou ainda que parte do funcionalismo público brasileiro ainda vai se aposentar com salário integral e, portanto, não tinha necessidade de fazer poupança. "Os novos servidores, que vão ganhar salário por tempo de contribuição na aposentadoria, terão que pensar em previdência com mais cautela", disse.
Qualidade do crédito
O relatório do BC mostra que o cartão de crédito, tanto o parcelado como o rotativo - linha de mais fácil acesso, mas que tem juros maiores -, é um instrumento usado, principalmente, pelas famílias que ganham menos de três salários mínimos (45% do saldo de crédito do parcelado estava nessa faixa de renda e 43% do rotativo, no final de 2014).
A inadimplência nessas modalidades também é maior nas rendas mais baixas: 47,1% estão atrasados com a dívida no rotativo. Os calotes médios dessa faixa são de 6,1%.
"O que aconteceu, nesses últimos anos, é que ocorreu uma inclusão financeira muito acelerada e boa parte das pessoas não foram ensinadas a usar o sistema bancário", apontou Garcia. "As pessoas entram no crédito e acabam se 'machucando' muito", completou.
De acordo com a autoridade monetária, o endividamento das famílias passou de 29% para 45,9%, entre 2007 e 2014. O BC destacou, contudo, que 27,9% do endividamento é formado por financiamento imobiliário que, na avaliação do regulador, é um crédito mais saudável, caracterizado por ser "mais longo, de menor custo, colaterizado (com garantias, no caso, o imóvel), e que forma patrimônio".
"O crédito imobiliário possui esses atributos, mas os desembolsos, naturalmente elevados, implicam prestações altas, pesando sobre o orçamento das famílias", pontuou.
O Banco Central ressaltou que ainda há espaço para o crescimento do sistema bancário, principalmente, por canais remotos (celulares e tablets), mas que essa expansão precisa ser acompanhada por "expansão do acesso à internet entre a população de menor renda".
Veículo: Jornal DCI