Em 3 anos, renda deve amargar perda de 9%

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Entre 2014 e 2016, queda acumulada do PIB ‘per capita’ será a segunda maior em sete décadas, prevê FGV


“A indústria foi a primeira a sentir a crise. Agora, o setor de serviços sente os reflexos do desemprego, que vai piorar” Luis Otavio de Souza Leal Economista-chefe do banco ABC Brasil

Os três anos consecutivos sem crescimento econômico, que serão completados ao fim de 2016, resultarão na segunda maior queda na renda per capita dos brasileiros em 70 anos. O Instituto Brasileiro de Economia da FGV-Rio estima que o PIB per capita acumule retração de 9,1% no período. O cálculo foi feito com base num recuo de 3,2% do Produto Interno Bruto (PIB) previsto para este ano. Desde 1947, quando começa a série oficial do IBGE, apenas no período recessivo de 1981 a 1983 a renda encolheu mais: 12,4%. Em valores correntes, se o ano acabasse em junho, o PIB per capita seria de US$ 8.850. Menos da metade dos US$ 20 mil do mundo desenvolvido e bastante distante da melhor performance do país, registrada em 2011, quando ficou em US$ 13,2 mil.

Na prática, isso mostra que todos estamos mais pobres. Vamos levar anos para recuperar o pico atingido em 2011 e estamos cada vez mais distantes do valor considerado ideal para se ter bem-estar social — analisa Silvia Matos, economista do Ibre/FGV.

DESEMPREGO, INFLAÇÃO E CRÉDITO RESTRITO O empobrecimento da população explica a queda no consumo das famílias medido pelo PIB. O tombo foi de 5% no segundo trimestre de 2016, em relação a igual período de 2015. Frente ao primeiro trimestre deste ano, o consumo recuou 0,7% — a sexta retração seguida. A piora do mercado de trabalho, com o recorde de 11,8 milhões de desempregados, a alta da inflação e o crédito restrito corroeram o poder de compra dos brasileiros.

O professor Antônio Cláudio Menezes, de 49 anos, personifica esses números. Com três empréstimos consignados para pagar, além do financiamento do apartamento onde a ex-mulher e um dos filhos vivem, mais o seu próprio aluguel, o orçamento estava bastante apertado já no ano passado.

Ao ver os pagamentos salariais atrasarem e as férias e o décimo terceiro serem parcelados, já que é concursado do Estado do Rio, que vive uma crise fiscal sem precedentes, o tempo fechou de vez. Teve de vender o carro para pagar os empréstimos e entregar o apartamento que alugava no Humaitá.

— Estou vivendo de favor na casa de um amigo e não tenho dinheiro para oficializar a minha separação. Não sobra dinheiro mais nem para a cervejinha. Mas não dá para desanimar — conta.

Nos últimos 12 meses, o consumo dos brasileiros recuou 5,7% — o pior resultado da série histórica do IBGE, inciada em 1996. Se as famílias não consomem, cai o resultado dos serviços, que têm peso de 72% no cálculo do PIB. Na comparação com o primeiro trimestre, a atividade do setor recuou 0,8%. Essa é a sexta queda seguida, dobrando em relação ao primeiro trimestre, quando caiu 0,4%. Na comparação com o ano anterior, os serviços caíram 3,3% — oitavo recuo seguido.

— Os serviços são atrelados à indústria e às famílias, que continuam com dados ruins, apesar de serem menos ruins. É um processo natural: as famílias voltando a consumir, puxam os serviços e os empregos, já que este é o setor que mais emprega — aponta Silvia.

Economistas apontam que o consumo precisa ser impulsionado por uma combinação de ajuste fiscal, juros e inflação mais baixos. Não há entre eles, no entanto, consenso sobre quando haverá recuperação. Roberto Padovani, economista do banco Votorantim, acredita que as quedas do consumo das famílias e do setor de serviços devem se estabilizar no terceiro trimestre, estancando a recessão no período:

— O consumo está travado pelo mercado de trabalho e crédito. Mas acredito que vai se estabilizar no terceiro trimestre, influenciado pela melhora nas expectativas e na confiança.

Já o economista-chefe do banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, tem uma visão mais pessimista. Ele avalia que consumo e serviços vão piorar ainda mais antes da recuperação:

— Da mesma forma que os serviços demoraram mais para iniciar um ciclo de retração, eles devem demorar mais para voltar a crescer. Eles estão muito atrelados ao consumo, e não vejo perspectiva de crescimento deste a curto prazo com desemprego e juros altos.

INDICADORES DE CONFIANÇA MELHORAM O economista-chefe da LCA Consultores, Braulio Borges, acredita que já existe alguma reação no consumo das famílias, refletindo a melhora das expectativas dos consumidores. O Índice de Confiança do Consumidor, da Fundação Getulio Vargas, subiu em agosto para 79,3 pontos, a quarta alta seguida, para o maior nível desde janeiro de 2015. Ele cita ainda o Monitor do PIB, também da FGV, que calcula mensalmente o desempenho da economia e mostrou melhora no indicador de consumo ao longo do segundo trimestre:

— A inflação está desacelerando e comendo menos renda, o que deixa o consumidor menos pessimista. Depois que a recessão acaba, o desemprego continua subindo. É como uma âncora que dificulta o barco, mas ele já pode começar a andar. Quem vai começar a consumir é o resto dos trabalhadores, os que estão empregados, que terão menos medo de futuro.

Luis Otavio de Souza Leal, economista-chefe do banco ABC Brasil, também acredita que o consumo das famílias continuará piorando, assim como o setor de serviços. Isso porque a taxa de desemprego deve passar dos atuais 11,6% para algo entre 12,5% e 13% no primeiro trimestre de 2017, quando deve atingir o ápice:

— A indústria foi a primeira a sentir a crise e a primeira a fazer os ajustes. Agora, o setor de serviços sente os reflexos do desemprego, que vai piorar.

Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, diz, por outro lado, que o consumo das famílias vai começar a reagir já no segundo semestre deste ano. Ele cita o avanço do consumo de alimentos e bens não duráveis, por não serem dependentes de crédito:

— Mas a compra de carros e imóveis ainda vai demorar para reagir, já que depende de crédito e de emprego. E essas duas variáveis estão ruins.

Fonte: Portal O Globo


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