Em um cenário de custos de produção elevados após a greve dos caminhoneiros, a Associação Brasileira de Laticínios (Viva Lácteos) reduziu a perspectiva de aumento na produção de leite no Brasil para este ano, de 3,3% para 1,5% a 2%.
No ano passado, a captação de leite foi de aproximadamente 33 bilhões de litros. De acordo com o presidente da associação, Marcelo Martins, a greve gerou prejuízos de R$ 1 bilhão e causou desde a falta de produtos para higienizar máquinas até a perda de leite que deixou de ser entregue aos laticínios durante e no período imediatamente após a paralisação. No Rio Grande do Sul, terceiro maior produtor de leite do País, 56 milhões de litros deixaram de ser entregues às indústrias em razão da greve.
“Hoje, todas as empresas estão trabalhando com margens muito curtas e com pouca disposição para investir”, diz Martins.
Ele explica que a indústria ficou sem estoques na sequência da greve, o que também deixou o varejo com menor oferta. O resultado foi o aumento dos preços do leite pagos ao produtor, que foram repassados ao consumidor nas gôndolas dos supermercados. “Isso gera uma demora para que o brasileiro volte a consumir os produtos nos volumes em que estava habituado antes do reajuste”.
Segundo a Viva Lácteos, outro custo que subiu foi o do frete, que está três vezes mais caro para o transporte de leite por trecho com o tabelamento do frete. Por se tratar de uma carga dedicada, não ocorre o chamado “frete de retorno” por questões sanitárias. “O impacto desse tabelamento pode chegar a 6% no valor final do produto ao consumidor.”
Segundo dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), em 2017 a variação entre o preço mínimo e máximo cobrado pelo leite UHT, no varejo, foi de 31,4%. Neste ano, a variação já alcança 55%.
De acordo com o Sindicato da Indústria de Laticínios e Produtos Derivados do Estado do Rio Grande do Sul (Sindilat/RS), a nova tabela publicada pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) em 5 de setembro apresenta “fragilidades de ordem jurídica e econômica.” Na avaliação da associação, o frete de produtos com controle sanitário, como lácteos, deve ter uma tabela diferenciada, segundo a Lei n° 13.703/2018.
“Por ser um produto vivo, entendemos que a tabela atual não se aplica ao transporte da matéria-prima do produtor até a indústria nem na distribuição dos protos, pois leite estaria subordinado a um tabelamento diferenciado e ainda não detalhado pela ANTT”, afirmou o diretor da entidade, Darlan Palharini.
Por outro lado, todos os insumos que chegam para as indústrias, como embalagens, terão que obedecer a nova tabela, o que deve ampliar os custos das indústrias.
Palharini ressalta que o setor está trabalhando com livre negociação com as transportadoras e que não foram cumpridas as tabelas anteriores.
Trégua
Para o produtor, a greve foi uma oportunidade de repor perdas depois de dois anos difíceis com preços de milho elevado em 2016 e baixa remuneração, o que levou a um menor investimento na atividade. “Especialmente para o produtor mais tecnificado, foi um momento de retomar o fôlego”, avalia a pesquisadora do Cepea, Natália Grigol.
Os preços pagos pelo litro ao produtor acumulam elevação de 50,2% de janeiro a agosto, enquanto no mesmo período do ano passado a queda foi de 4,5%. “Essa valorização é crucial, já que o produtor está desestimulado e há preços de milho em elevação”, explica.
A valorização do leite ocorre devido à entressafra no Sudeste e no Centro-Oeste, que deve se estender até outubro, mas também está relacionada à greve dos caminhoneiros, que acirrou a disputa pelo produto e levou as indústrias a firmarem contratos de três meses com os produtores para garantir a matéria-prima, o que deu sustentação aos preços.
A partir deste mês, a perspectiva é de que a cotação ao produtor recue com o aumento da produção. “Ainda não sabemos a intensidade dessa queda, mas a limitação da oferta pode impedir que seja grande”, avalia Natália.
Fonte: DCI