Após anos de tentativas empreendidas por diferentes governos, o Congresso Nacional aprovou a criação de uma idade mínima para aposentadoria no Brasil. A mudança retira o País de um grupo restrito de nações que ainda permite a concessão do benefício considerando apenas o tempo de contribuição, característica que, segundo a área econômica, privilegia trabalhadores de maior renda.
A proposta garante uma economia de R$ 800,3 bilhões em 10 anos, caso o Congresso rejeite os quatro pedidos de mudança feitos diretamente no plenário do Senado. A votação do texto-base em segundo turno no Senado teve 60 votos a favor e 19 contra. A economia prevista com a reforma da Previdência foi "a possível", disse o ministro da Economia, Paulo Guedes, que visitou o Plenário do Senado pouco antes de o presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP) proclamar o resultado da votação do texto principal da proposta de emenda à Constituição (PEC). "O impacto fiscal foi o que era possível. Estamos muito felizes com o resultado. E estamos a caminho das próximas reformas", disse Guedes rapidamente antes de deixar o Congresso.
A aprovação final da proposta ocorre oito meses após o envio formal do texto ao Parlamento. A batalha, porém, começou em gestões anteriores. O País esteve perto de aprovar uma idade mínima para todos os trabalhadores no governo Fernando Henrique Cardoso, mas não conseguiu por uma diferença de apenas um voto.
Com o agravamento das contas públicas e o aprofundamento do déficit da Previdência, o governo Michel Temer apresentou uma ampla proposta de reforma em dezembro de 2016. A articulação, porém, naufragou diante das denúncias contra o agora ex-presidente. Neste ano, a previsão é que o déficit do INSS e dos regimes próprios de servidores federais civis e militares chegue a R$ 292 bilhões.
Em único ano, o governo precisa gastar o equivalente a 10 orçamentos anuais do Bolsa Família para cobrir o rombo nas aposentadorias e pensões. Segundo a equipe econômica, a reforma aprovada não vai acabar com o rombo, mas estancará o processo de aumento do rombo. Ela prevê que novos trabalhadores só poderão se aposentar com idades de 62 anos (mulheres) e 65 anos (homens), tanto na iniciativa privada quanto no setor público federal, com tempo mínimo de contribuição de 15 anos (mulheres), 20 anos (homens) e 25 anos para servidores de ambos os sexos. Professores, policiais e profissionais expostos a agentes nocivos (como quem trabalha na mineração) têm regras mais brandas.
Quem já está no mercado de trabalho poderá escolher a mais vantajosa entre as regras de transição. Durante esse período, o tempo mínimo de contribuição permanece em 15 anos para homens e mulheres.
Além de aumentar o tempo para se aposentar, a reforma também eleva as alíquotas de contribuição para quem ganha acima do teto do INSS. Os 1.142 servidores federais que ganham acima do teto remuneratório de R$ 39 mil, por exemplo, pagarão alíquotas crescentes, que chegam a 22% sobre a parcela que excede o limite salarial na União. Em contrapartida, quem ganha um salário mínimo (R$ 998,00) terá até um alívio na contribuição para o INSS. As novas alíquotas começam a valer em 1º de fevereiro de 2020.
As novas normas não valerão para os servidores estaduais e dos municípios com regime próprio de Previdência, uma vez que a Câmara retirou os governos regionais do alcance das novas regras. O governo ainda tenta aprovar uma mudança constitucional "paralela" para reincluir estados e municípios.
Após a votação do texto principal, foi dado início à apreciação de quatro destaques. O primeiro destaque, uma sugestão do PDT que tentava suavizar as regras de transição na reforma da Previdência, foi derrubado por 57 votos contrários e 20 a favor. Nos cálculos da equipe econômica, o impacto dessa manutenção seria de R$ 148,6 bilhões em 10 anos. Também rejeitado, o segundo destaque proposto pelo PROS tentava garantir aposentadoria especial para trabalhadores que comprovarem tempo de serviço por insalubridade. A tentativa foi derrubada por 57 votos a 19. Na avaliação da equipe econômica, a aprovação do dispositivo exigiria uma nova análise da Câmara dos Deputados. O governo alegava que a alteração resultaria em alta judicialização.
Já podia ter me aposentado,Como fica minha aposentadoria?
As pessoas que completaram os requisitos para a aposentaria pelas regras vigentes antes da promulgação da reforma da Previdência possuem o chamado direito adquirido. Por isso, não precisam correr para solicitar o benefício. Segundo especialistas em direito previdenciário, há casos em que pode ser mais vantajoso trocar as regras antigas por uma das opções previstas nas opções de transição. A questão deverá ser avaliada caso a caso.
Adriane Bramante, presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário), cita o exemplo real de um cliente que tem hoje 37 anos de contribuições e 58 anos e 11 meses de idade. Se der entrada no pedido de aposentadoria pelas regras atuais, com um fator previdenciário de 0,83, terá um benefício de R$ 4.681,00, considerando todas as contribuições pelo teto. Com a reforma, poderá optar por uma das regras de transição, com a soma de idade e tempo de contribuição de 96 pontos para homens e obter um benefício de R$ 5.025,00.
"Há vários casos em que, se aplicado o fator hoje, a pessoa pode ter um prejuízo. O segurado deve fazer um planejamento antes de dar entrada na aposentadoria. Mesmo que ele não requeira hoje o benefício, tem de ser mantido o direito adquirido dele."
Projeto de Lei dos militares está em fase de votação
A Comissão Especial da Câmara que discute a reforma da Previdência dos militares encerrou ontem as discussões do texto e entra agora na fase de votação do projeto. A proposta dos militares foi enviada pelo Executivo ao Congresso em março, um mês após o governo apresentar a reforma da Previdência que atinge INSS e servidores federais civis.
A proposta desagradou aos parlamentares por impor sacrifícios mais brandos aos militares, entre eles um pedágio menor - a exigência de tempo a mais de quem está na ativa é de 17% sobre o tempo que falta para a aposentadoria, contra adicionais de 50% a 100% no caso dos civis.
Além de aumentar as exigências para passar à ativa, também prevê reestruturação nas carreiras militares, com reajustes previstos até 2023 e adicionais por fatores como tempo de permanência nas Forças e realização de especializações.
Pelo texto, oficiais de alta patente podem alcançar um aumento de até 73%, enquanto um soldado não conseguirá reajuste superior a 12%. De acordo com cálculos do governo, a economia com a reforma dos militares será de R$ 97,3 bilhões em 10 anos.
Fonte: Jornal do Comércio RS, 22/10/2019