O mercado de sorvetes desacelerou neste ano. Além das chuvas e temperaturas mais baixas no primeiro semestre, a economia não ajudou. A renda disponível para compras de impulso, como o picolé, está mais escassa. No bolso do consumidor, o sorvete, que ficou quase 13% mais caro neste ano, disputou espaço com o telefone celular.
O crescimento do volume vendido neste ano não deve chegar a 5%, marca registrada no ano passado, quando a indústria produziu 1,16 bilhão de litros. O setor, que reúne cerca de 10 mil empresas, incluindo as informais, faturou R$ 4 bilhões em 2011. "Nosso maior inimigo é o celular, que disputa o dinheiro disponível no bolso do consumidor", diz o presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Sorvetes (Abis), Eduardo Weisberg.
Ainda assim, o setor achou espaço para reajustar preços. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), que mede a inflação oficial do país (IPCA), o preço do sorvete subiu 12,68% entre janeiro e novembro - no mesmo período o IPCA subiu 5,01%. No ano passado, quando o IPCA teve alta de 6,50%, o preço do sorvete deu um salto de 16,41%.
Nesse cenário de preços mais salgados, as sorveterias regionais crescem mais do que a média do setor. O mercado é dominado pelas multinacionais Unilever, dona da marca Kibon, e Nestlé, que juntas detêm mais de 70% do mercado. Mas as regionais, de menor porte, conseguem fortalecer suas operações com produtos mais baratos e sabores diferentes como castanha, tapioca, bacuri, taperebá.
A Zeca's, marca pernambucana, com 37 anos de mercado, aumenta presença em oito dos nove Estados do Nordeste. "O poder aquisitivo melhorou na região. Os potes de sorvete de dois litros e as sobremesas geladas passaram a fazer parte das compras semanais", diz o empresário Paulo Oliveira, proprietário da Zeca's há 21 anos. Neste ano ele lançou dez sabores de sobremesas geladas. E seus preços são menores do que os dos sorvetes vendidos por Nestlé e Unilever.
"A gente acredita que existe muita oportunidade que não foi explorada pelas grandes marcas, como por exemplo oferecer produtos de qualidade com preço 25% menor do que os das marcas líderes", diz o presidente executivo da Jundiá, César Bergamini, marca paulista que atua nos mercados de São Paulo e Rio e estima deter 6% do mercado. A Jundiá tem em seu portfólio o sorvete Max, semelhante ao Magnum da Kibon, e ao Mega, da Nestlé.
A Jundiá, com sede em Itupeva (SP), prevê inaugurar sua nova fábrica, no primeiro trimestre de 2013. O faturamento, de R$ 90 milhões em 2011, deverá crescer 15% neste ano. Atualmente a Jundiá, com 25 mil pontos de venda, planeja chegar a 40 mil em cinco anos. "O consumidor tem que ter acesso fácil ao sorvete", diz.
A distribuição é um fator crucial nessa indústria. Ter o controle sobre os caminhões refrigerados a 35 graus negativos que saem da fábrica em direção ao ponto de venda é importante. A Unilever, dona da marca Kibon, líder com mais de 50% do mercado, segundo a Nielsen, decidiu, em julho eliminar os distribuidores nas praças mais importantes - São Paulo e Rio - para aumentar sua margem de negociação com as grandes redes. A Nestlé enfrenta problemas em Natal e João Pessoa (ver nesta página).
A Zeca's tem uma frota própria de 82 caminhões e mais de 280 funcionários. Seus vendedores, além da negociação no ponto de venda, limpam cada freezer, mantido em regime de comodato, e conferem a qualidade dos produtos. "O sorvete tem que ter acompanhamento. Quanto maior a distância, pior o negócio", diz Oliveira. Ele estima que no mercado do Nordeste esteja à frente da Nestlé.
Para este ano, Oliveira prevê um aumento entre 27% e 30% no faturamento e 18% na produção. Ele tem 7,8 mil clientes. As redes varejistas Walmart, Pão de Açúcar e G. Barbosa encomendam a ele seus sorvetes de marcas próprias.
Nos supermercados, o pote de dois litros ainda é o líder de vendas. Kibon e Nestlé lançaram três novos sabores neste ano, cada uma. No Walmart, segundo o diretor de perecíveis Luciano Nunes, as linhas premium, light e à base de iogurte estão ganhando espaço nos carrinhos de compras.
Produto premium atrai investimento
Sorvetes mais sofisticados, de melhor qualidade e preço entre R$ 5 e R$ 9 - o picolé ou o copinho - são um nicho dominado por fabricantes de menor porte e iogurterias. Mas as líderes do mercado, Unilever e Nestlé, também estão investindo nesse segmento.
Pietrangelo Leta, diretor comercial do Zona Sul, uma das maiores cadeias de supermercados do país, com 31 lojas no Rio, diz que há espaço para as marcas premium crescerem na categoria porque esse segmento ficou "deixado de lado" pelas grandes fabricantes durante alguns anos.
Leta diz que Diletto, marca lançada há 3 anos no país, "entrou em nicho premium que as grandes empresas deixaram, como Kibon e Nestlé". Ele diz que "a Kibon tinha uma linha premium suíça [Mövenpick], não era o foco e parou de vender. A Nestlé trouxe o Heaven da Argentina e parou de vender". Na rede, o produto premium é quase 60% das vendas de sorvetes.
Agora, as multinacionais voltam a focar nos produtos mais caros. Uma das prioridades para a Kibon, da Unilever, é o Magnum, que custa entre R$ 5,25 e R$ 9. O Mega, da Nestlé, é comprado por mais de R$ 5 em supermercados. O preço de um picolé simples gira em torno de R$ 2.
No Grupo Pão de Açúcar e no Walmart, os sorvetes mais caros ainda vendem menos do que os potes de um ou dois litros, mas ganham espaço nos carrinhos de compra. No Walmart, a linha de sorvete de iogurte cresceu mais de 60% e dobrou sua participação na categoria de sorvetes entre janeiro e novembro em relação a 2011.
Segundo Lea Xavier, gerente de congelados do Pão de Açúcar, os sorvetes especiais são 12% das vendas totais da categoria e o preço é, em média, 10% acima dos tradicionais. "Nos últimos cinco anos o portfólio mudou: as embalagens de um litro não deslancharam. Os pacotes com picolés estão deixando os freezers e abrindo espaço para marcas regionais e sabores especiais", diz.
Marca mais vendida no Zona Sul, a Diletto cresce a índices "estratosféricos", diz Leandro Scobin, sócio da Diletto. A empresa inaugurou na semana passada uma loja no bairro Jardins, área nobre de São Paulo. A algumas quadras, a Kibon abriu recentemente uma loja do Magnum.
Investir nessas unidades é uma forma de se apresentar ao cliente de alta renda. As lojas têm atendimento personalizado e chefs que preparam as sobremesas usando frutas, caldas, licores. Segundo Isabel Masagão, gerente da Kibon, a experiência de personalizar o sorvete ajuda a aproximar o consumidor da marca.
Este ano, o volume de sorvete consumido no país deve crescer menos de 5%, mas nos últimos oito anos aumentou 70%, chegando a 1,16 bilhão de litros em 2011. E um dos segmentos com mais força é o das iogurterias. Desde 2009, foram abertas 23 redes que vendem produtos feitos à base de iogurte. Segundo o diretor da Associação Brasileira de Franchising, Ricardo Camargo, o faturamento das redes deve crescer entre 18% e 20%, mais do que o mercado de franquias de food service, cuja expansão projetada é de 14%.
Veículo: Valor Econômico