Lidar com sazonalidade na receita é rotina para o comércio. Após o forte ciclo de vendas do Natal, o desafio dos empresários é segurar as rédeas no primeiro trimestre e criar oportunidades. Vale aproveitar o período para estruturar as lojas, planejar o ano, inventariar e saldar estoques, reformar, treinar equipe, apostar em ações de relacionamento, visitar feiras e eventos e até descansar para renovar ideias e energia. Mesmo com a força dos negócios de verão, ligados ao turismo e à volta às aulas, o varejo vê o faturamento cair, em média, 20% em janeiro (na comparação com dezembro anterior), segundo levantamento do Provar - Programa de Administração de Varejo da Fundação Instituto de Administração (FIA).
"A regra é a mesma para todo o ano. Não existe consumidor inativo e sim aquele para o qual não estou vendendo", afirma o Claudio Felisoni de Angelo, professor da Universidade de São Paulo (USP) e presidente do conselho do Provar. A época é, portanto, de arregaçar as mangas. Na visão dele, e de outros consultores, o primeiro trimestre tem de fazer parte do planejamento anual.
Entre as estratégias para contornar a falta de movimento, Felisoni cita a classificação dos clientes e inventário de estoque, separando os itens de maior rentabilidade. Essas medidas permitem que o lojista monte ofertas especiais com produtos de maior margem para sua carteira ativa. Ou seja, até as promoções têm de ser estudadas e direcionadas. "É um esforço que vale a pena. O consumidor quer ver suas necessidades atendidas e aprecia quando o comerciante entra em contato com ele para dar um desconto em um produto do qual ele gosta."
Angelina Stockler, sócia-diretora da consultoria especializada em varejo Ba}Stockler, completa: "Há um tabu sobre os primeiros meses do anos. Mas para quem planeja, as oportunidades surgem e as vendas respondem bem". Para ela, a cultura de simplesmente queimar o estoque tem de mudar. O período de menor pressão nas vendas é uma boa oportunidade para fidelizar clientes, promover experiência com a marca e mostrar para o consumidor que preço não é tudo. "O futuro do varejo passa pelo coração das pessoas. O comprador quer atenção", comenta.
Na rede de restaurantes China House, a aposta para o período de calmaria está na oferta de pratos individuais. "No verão, é comum o pai (ou a mãe) deixar a família na praia e voltar para trabalhar. Neste período, pede comida, mas em porções menores", explica Jorge Torres, franqueador da marca que possui 17 unidades no país. Essa é a característica das vendas de segunda a sexta. "No final de semana, o movimento normaliza", comenta. Ele - que administra cinco lojas próprias - admite que a estratégia ajuda a segurar as vendas, mas o movimento cai mesmo. Nessa hora, aproveita para programar as férias da equipe, promover treinamentos e planejar o ano.
Na rede de produtos de beleza Mahogany, o primeiro trimestre é tão estratégico como o final do ano. "É uma época extremamente ativa. Aproveitamos para juntar e avaliar as informações, melhorar a estrutura de atendimento e motivar as equipes de vendas", comenta Peter Schmidt, diretor de franquias. Nos primeiros quinze dias de janeiro, a equipe sai em férias e volta afiada para comandar o planejamento até março. Entre os aprendizados da rede, ele destaca as campanhas promocionais do começo do ano. A rede trabalha com uma combinação de produtos ofertados com descontos que chegam a 30%. "Descontos excessivos podem prejudicar a marca e fazer o consumidor tradicional sentir-se prejudicado", diz Schmidt.
Os planos para a temporada de férias devem incorporar as características do negócio e das cidades em que estão. "No litoral, as vendas explodem entre janeiro e fevereiro", explica Adalberto Belluomini, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV). "Quem tem uma rede de lojas, precisa ainda deslocar o estoque para unidades onde o movimento aumenta. A gestão apurada de estoque e demanda faz a diferença na hora do balanço."
Veículo: Valor Econômico