Índice de Preços ao Consumidor Amplo para o mês foi maior no país e em BH. Mas em 12 meses cede e fica abaixo de 6%
Belo Horizonte e Brasília – Pelo segundo mês consecutivo, a inflação acelerou no país e, embora o governo mantenha o discurso de que ela está sob controle, a alta dos preços segue preocupando. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ganhou força de agosto para setembro, passando de 0,24% para 0,35%. A leitura positiva dos números divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) é que pela primeira vez no ano a taxa acumulada em 12 meses — 5,86% — ficou abaixo de 6%.
Em Belo Horizonte, o IPCA subiu 0,30% em setembro, contra 0% em agosto, e a região metropolitana teve a quarta maior alta entre as capitais pesquisadas. Com isso, os resultados acumulados nos nove primeiros meses de 2013 atingiram 3,92% e o acumulado em 12 meses, 5,54%, ficando abaixo dos 6% assim como no país. Em setembro, seis do nove grupos pesquisados apresentaram elevações de preços. Mas o destaque foi para o de alimentação e bebidas, que passou de -0,64% em agosto para um aumento de 0,17% no mês passado.
O comportamento dos produtos dependentes do trigo tiveram forte contribuição na alta da Grande BH. Entre eles, o macarrão, que os preços aumentaram de 0,66% em agosto para 1,80% em setembro; a farinha de trigo, de 0,09% para 1,84%; a massa semipreparada de 0,32% para 2,82%; e o pão francês de 0,21% para 1,78%. Já a carne de porco também apresentou alta nos preços de 0,39% para 5,48% e, além dela, o frango inteiro que passou de -0,72% para 4,51%. Na RMBH, o grupo de transportes apresentou o mesmo movimento. Os preços das passagens aéreas passaram de uma queda de -2,12% em agosto para alta de 10,22% em setembro. Já os ônibus urbanos de -1,85% para a estabilidade de 0%.
O analista do IBGE em Minas, Antonio Braz, lembra que o aumento nos derivados do trigo indicam o impacto da alta do dólar, já que grande parte do cereal é importada de países como a Argentina. Já o reajuste nas passagens aéreas, segundo ele, pode ser justificada pelo fato das companhias aéreas sofrerem com a alta nos custos dos combustíveis e terem de repassar o aumento ao consumidor. “Os preços são transferidos com alguma rapidez para o consumidor, mas essa é mais uma questão de economia do setor e das políticas das empresas”, justifica. Já os preços dos ônibus, que, segundo ele, ficaram estabilizados, não pressionam a inflação.
De acordo com Fernando Moraes, proprietário da padaria Pão de Casa, que fica no Funcionários, a inflação no trigo já chegou ao bolso dos empresários do setor que estão pagando mais pelo saco da farinha. No entanto, ele adverte que a escassez do grão no mercado internacional tem pressionado mais os preços que a alta do dólar. “Eu comprava o saco de farinha de trigo a R$ 80 ou R$ 85. Hoje pago de R$ 100 a R$ 110”, lembra. Para não perder a clientela, mesmo com a alta, ele conta que tem mantido o preço do quilo do pão francês a R$ 11,49. “Segurei o preço, mas não sei se aguento até dezembro. Uma vez por ano faço um reajuste pequeno, de cerca de 10%, porque, se fosse acompanhar o preço da farinha, o aumento seria de 25%”, comenta.
Entre os consumidores, no entanto, a alta dos preços tem sido sentida não somente no pão, mas em todos os itens de alimentação. Para a médica Eleonora Lima os preços dos produtos de padaria podem ser considerados “astronômicos” e “o valor do quilo de pão comparado ao preço do quilo do filé”. “Não sei se a culpa é só da farinha. Todo o processo, serviços, mão de obra, impostos e encargos custam muito caro e quem paga por isso na ponta é o consumidor”, lembra. De acordo com o também médico Marcos Antônio Ribeiro Mendes, a alimentação, incluindo a fora do lar, tem pesado no bolso do consumidor. “ Acredito que há um reflexo que acaba atingido os outros produtos.”
Para Celso Grisi, diretor presidente do Instituto Fractal de Pesquisas de Mercado, os números da inflação não arrefeceram e a alta já era esperada. “A alta na taxa de juros é o grande segredo para segurar a inflação que veio ruim”, afirma. Até o fim do ano, para o especialista, a inflação deve continuar fazendo pressão, mas nada que possa assustar o mercado, permanecendo abaixo dos 6%.
Alerta contínuo
No país, os vilões de setembro, segundo o IBGE, foram a tangerina (25,97%) — novidade nessa lista — e, mais uma vez, as passagens aéreas (16,09%). Para outubro, analistas acreditam que a tendência de alta dos preços prevaleça, com o IPCA acelerando algo em torno de 0,50%. “Os dados analíticos indicam que o processo inflacionário requer cuidados. A inflação continua um problema”, comenta o economista-chefe do Banco ABC Brasil, Luís Otávio de Souza Leal. O governo espera fechar 2013 com inflação menor ou igual à do ano passado, ou seja, 5,84%, algo que só seria possível, em tese, sem aumento de combustível.
Ainda que esteja bem distante do centro da meta, que é de 4,5%, a inflação atual parece não incomodar o Planalto. A divulgação de ontem satisfez o ministro da Fazenda, Guido Mantega, e a ministra do Planejamento, Miriam Belchior. Ele defendeu ser preciso continuar alerta para “impedir que a inflação volte a subir e a atrapalhar o consumidor brasileiro”. Ela classificou o resultado de setembro como bom e insistiu que a inflação “não está acelerando”.
A despeito da avaliação da ministra, o preço dos itens de vestuário, por exemplo, avançou: de 0,08% para 0,63%. O gerente-executivo de política econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flávio Castelo Branco, lembrou que os preços dos serviços estão ainda muito resistentes. “Não dá para comemorar”, sublinhou.
O recuo da inflação no acumulado de 12 meses, sustenta o estrategista-chefe do Banco Mizuho do Brasil, Luciano Rostagno, não permite concluir que o índice se dirige para o centro da meta da governo brasileiro. “Ciente da estreita margem para absorver qualquer novo choque sobre os preços, o Banco Central deverá continuar aumentando a taxa de juros, apesar de enfraquecimento da atividade econômica”, completa.
Em vez de comemorar a pequena queda no indicador anual, o governo deveria concentrar esforços para levar a inflação ao centro da meta, no entendimento do economista da Fundação Getulio Vargas André Braz. “É isso que a equipe econômica precisaria perseguir de verdade, para poder cuidar de outras coisas importantes, como o crescimento da atividade e a criação de empregos”, analisa. O cenário atual, com o IPCA de 12 meses abaixo dos 6%, pode favorecer, segundo ele, o aumento dos combustíveis.
Veículo: Estado de Minas