A aparência é a mesma de qualquer fábrica de última geração: há tanques de aço reluzentes e um emaranhado de tubulações, monitoradas de perto por trabalhadores de uniformes brancos. Mas o que diferencia a planta de leite da Nestlé no México central é que ela funciona movida a água condensada do soro de leite ("cow water", de "condensate of whey water").
A multinacional suíça garante que a unidade, localizada em Lagos de Moreno, é a primeira do tipo no mundo a dispensar fontes externas de água. Em vez disso, recicla o fluido extraído do leite quando ele é transformado em pó, colocando-o de volta para trabalhar. "A água é a base da vida", diz o CEO Paul Bulcke ao "Financial Times". "Essa fábrica não tira nenhuma gota de água do chão para que o sistema possa funcionar."
Maior companhia de alimentos do mundo, a Nestlé diz que esse sistema permitirá uma redução do consumo total de água de suas 13 fábricas no México em 15% este ano. A companhia afirma que já reduziu seu consumo mundial de água em um terço desde 2005 e, segundo Bulcke, no caso das operações mexicanas, a queda foi de 50%. "Precisamos colocar essa questão bem alto na agenda da sociedade", acrescenta o executivo.
A fábrica de Lagos de Moreno, que começou a operar sem água em junho e foi formalmente inaugurada na semana passada, produz 60 mil toneladas de leite em pó da marca Nido [Ninho, no Brasil] por mês. É uma das marcas "bilionárias" do grupo, já que suas receitas anuais globais superam a marca de 1 bilhão de francos suíços (US$ 1,05 bilhão). Também fazem parte desse seleto grupo o café Nespresso, o chocolate Kit Kat e os temperos Maggi.
Mas produzir esse volume de leite em pó exige 1,6 milhão de litros de água por dia - mais ou menos a mesma quantidade usada para encher uma piscina olímpica, ou o total consumido diariamente por 6,4 mil pessoas.
A estratégia da Nestlé, criada em parceria com a GEA Filtration (empresa especializada em tecnologia de laticínios que faz parte da GEA da Alemanha) e com a Veolia Water (companhia francesa de tratamento de águas residuais), foi usar a "cow water", que tem cheiro forte, como um subproduto do processo de pulverização do leite. A multinacional suíça investiu mais de US$ 15 milhões na reforma da fábrica de Lagos de Moreno, que já opera há 71 anos.
A técnica contempla diversos estágios, que incluem osmose para a retirada de gorduras e sais e filtragem em torres de carbono para a eliminação de odores e cores insalubres. Os resíduos são mais purificados com luz ultravioleta, recebem dióxido de cloro e depois são remineralizados com a injeção de sais. Embora outras companhias também estejam explorando a tecnologia de "zero água", a Nestlé assevera que seu processo de tratamento seguido de filtragem é único.
Carlos Hernández, gerente da fábrica mexicana, afirma que a Nestlé extrai 1 litro de água de 1,6 litro de leite e que essa água, ser for tratada adequadamente, serve ao consumo humano. Na unidade, é usada no processo de fabricação, purificada em menor medida e aproveitada em processos que não entram em contato com produtos alimentícios, como a limpeza de fábrica.
Hernández afirma que o processo de "zero água" é um pouco mais caro que o uso da água de poço, mas que a diferença é compensada pela ausência de custos de transporte. A Nestlé pretende implementar a tecnologia em outras fábricas espalhadas pelo mundo, a começar pela unidade de laticínios de Mossel Bay, na África do Sul, país para o qual a companhia anunciou recentemente um plano de investimentos de cerca de US$ 180 milhões. (Tradução de Mario Zamarian)
Veículo: Valor Econômico