O ano de 2009 tem sido considerado por economistas do mercado como uma verdadeira incógnita para empresas que atuam na área de consumo, especialmente, varejo. Fatores como inflação em alta, aumento do endividamento da população e menor expansão do Produto Interno Bruto (PIB) e um possível agravamento do cenário externo têm levado a previsões pessimistas em relação ao potencial de crescimento. Essa realidade pouco parece afetar os planos do Grupo Pão de Açúcar, que ao completar 60 anos, prepara uma acelerada estratégia de expansão, com investimentos da ordem de R$ 1 bilhão para abertura de 100 lojas. Além de a consolidação de um projeto, desenvolvido durante todo o ano de 2008, que vai culminar a criação de uma área imobiliária.
Amparado em um grupo de economistas de peso que fazem parte do conselho consultivo da empresa, lê-se Maílson da Nóbrega, Fernando Dall Acqua, Yoshiaki Nakano, Roberto Teixeira da Costa, Luiz Carlos Bresser Pereira e José Roberto Mendonça de Barros, o presidente do conselho de administração do grupo, Abilio Diniz, garante que não há motivos para prever um crescimento menor para 2009. "Estamos trabalhando com um cenário de continuidade de crescimento, inflação em queda e PIB sob controle. Um cenário de tranqüilidade para se continuar investindo", afirma. Mas o bom senso deve prevalecer. "Tudo indicava que neste ano deveríamos acelerar, mas o bom senso empresarial mostrou que deveríamos reduzir os investimentos", afirma.
As projeções médias feitas pelos economistas à companhia mostram uma expectativa de crescimento de 4% no PIB. A empresa trabalha também com projeções para o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) de 5% ao ano, Selic em 13,8% e taxa de desemprego em 8,3%. As previsões estão em linha com os dados divulgados ontem pelo boletim Focus, do Banco Central, que mostra, por exemplo, alta de 3,6% no PIB e inflação de 5% para 2009. A diferença, afirma Enéas Pestana, diretor financeiro do grupo, é que o grupo trabalha também com metas agressivas de ganho de market share nas regiões onde já atua e em novos mercados para manter legitimar os investimentos.
"Estudo do Bolsa Família mostra que 87% dos recursos foram direcionados para a compra de alimentos", afirma Pestana. Isso, aliado a ascensão da classe C, traz uma modificação nos hábitos de consumo e um maior potencial de crescimento para os negócios da empresa. E é baseado nesse cenário que o Pão de Açúcar vai definir nesta semana o planejamento estratégico da empresa para os próximos três anos. "Vamos aprofundar o crescimento em áreas onde já atuamos, entrar em novas áreas e saturar em mercados que precisam de maior ocupação", conta Pestana.
O andamento dessa estratégia, que inclui também os planos para crescimento por bandeira, diversificação dos negócios e ganho de market share, ainda serão discutidos e detalhados nesta semana. Mas Diniz deixa claro que está satisfeito com os progressos feitos pelo seu time de executivos no processo de "adequação", como prefere Cláudio Galeazzi, atual presidente da empresa, de processos da companhia em busca de voltar à rentabilidade e manter um crescimento sustentável. E não se trata só de uma satisfação com metas financeiras. Diniz afirma que a estratégia de voltar às origens (back to basic) de Galeazzi já colocou a empresa nos eixo. O segredo foi deixar de focar em vendas para investir em um trabalho de adequação de sortimento, precificação, comunicação, serviços e gente. Este último quesito, aliás, vem merecendo maior atenção do principal acionista da empresa.
"Trabalhamos com uma equipe gerencial de grande competência, liderada pelo Cláudio que tem duas qualidades que mais valorizo na liderança: equilíbrio e humildade", afirma Diniz. "Hoje não passa pela cabeça de ninguém trazer alguém de fora para suceder o Galeazzi", diz o empresário, deixando claro que o próprio Galeazzi pode continuar no cargo, apesar de seu contrato terminar em dezembro de 2009. Galeazzi, por sua vez, já tem uma imagem clara do perfil de executivo que espera para seu sucessor: "Um generalista do varejo, que possa equilibrar tanto a experiência financeira com a operação de loja".
Após a experiência do consultor na reestruturação da operação da rede Sendas no Rio que trouxe, entre outras o modelo de descentralização das operações, que começa hoje a ser implantado em toda a rede, ninguém vai duvidar que Galeazzi já tem essas duas características. Galeazzi, inclusive, já fala como varejista. "O pessoal (do Pão de Açúcar) tinha se esquecido o que era o varejo", diz. Como exemplo, ele cita a estratégia da empresa de centralizar as compras sem levar em conta as diferenças regionais. "Os produtos que eram oferecidos na Baixada Santista (Rio) eram os mesmo das Zona Sul; até a comunicação era a mesma. Só o cliente era diferente". A empresa criou clusters de negócios baseados em perfis regionais. Agora, quatro diretorias regionais – Rio de Janeiro, São Paulo, Centro-Oeste e Nordeste – são responsáveis por dar autonomia para as unidades, atendendo melhor a demanda dos clientes.
Apesar do clima de ‘já ganhou’ que vive o Pão de Açúcar, Galeazzi é cauteloso. "Acho que a empresa ainda não se consolidou. Apesar de os resultados serem bons, eu prefiro ser mais conservador. O Abilio festeja mais porque conhece mais o varejo, eu sou mais inseguro", afirma.
Veículo: Gazeta Mercantil