A China abriu o mercado à compra de derivados de leite, como leite em pó, queijo e iogurte do Brasil e até leite condensado, informou o Ministério da Agricultura (Mapa) nesta terça-feira (23/7). A medida foi comemorada pela Viva Lácteos, associação do setor, que espera vender ao país asiático, o maior mercado do mundo para produtos lácteos, pelo menos US$ 4,5 milhões até o fim de 2020. Se concretizada, seria uma expansão de pouco menos de 10% das exportações do setor, que somaram US$ 58 milhões no ano passado.
– A estratégia do setor ao mercado chinês será investir na venda de produtos de maior valor agregado, como os queijos – diz Marcelo Costa Martins, diretor-executivo da Viva Lácteos.
A notícia, embora positiva, está longe de equilibrar a balança comercial do setor. De acordo com dados da própria associação, o Brasil importou US$ 480 milhões em lácteos em 2018. A maioria das compras foi de leite em pó, uma matéria-prima de baixo valor agregado, de produtores dos vizinhos Argentina e Uruguai destinada à produção de alimentos com leite na composição.
A quantia é quase dez vezes superior às exportações brasileiras de derivados lácteos no mesmo período. Boa parte das vendas externas do setor foi de produtos especializados, como os queijos que o país busca agora vender na China, diz Martins, da Viva Lácteos.
Segundo o Mapa, a China habilitou 24 estabelecimentos para exportação de produtos. A certificação estava acordada com o governo chinês desde 2007, mas não havia unidade brasileira habilitada a exportar ainda. O Ministério não divulgou a lista dos estabelecimentos que receberam o sinal verde de Pequim para exportar para o mercado chinês.
Problemas logísticos
A China é o maior importador de produtos lácteos do mundo. Só em leite em pó os chineses compraram 800 mil toneladas em 2018 – 25% mais do que toda a produção brasileira no período. Em queijos, foram 100 mil toneladas. Para efeito de comparação, no mesmo período, as vendas de queijos brasileiros ao mundo somaram 3 mil toneladas, de acordo com dados da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).
A maior parte das importações chinesas de leite teve como origem a Nova Zelândia. O país da Oceania vende aos chineses mais de US$ 4 bilhões ao ano em leite em pó e derivados, o equivalente a 36% do mercado chinês, segundo a Fonterra, cooperativa de produtores neozelandeses dona do título de maior exportadora de leite do mundo, com 30% do comércio internacional de lácteos.
Na comparação com os números da Nova Zelândia, a expansão projetada com a abertura do mercado chinês é irrisória. Para Welber Barral, sócio da consultoria Barral M Jorge, especializada em comércio exterior, a notícia é uma ótima oportunidade para os produtores rurais brasileiros, mas o setor ainda precisa de ajustes para, de fato, ver um salto de vendas para o maior país do mundo.
– Há ainda problemas logísticos no caminho entre o produtor rural, as fábricas de beneficiamento do leite e os portos. A produção brasileira precisa ganhar produtividade – diz Barral.
Sem 'leite derramado'
Antes de chorar pelo leite derramado, o setor produtivo tem buscado maneiras de melhorar a eficiência para conquistar o mercado global. Desde o ano passado, técnicos da CNA circulam por regiões com forte produção de leite, como o interior dos estados do Sul e de Minas Gerais, para capacitar fazendeiros e gente da cadeia do leite a vender para fora.
– O objetivo é levar conhecimento sobre como atender exigências de consumidores internacionais, a exemplo dos certificados de vacinação contra doenças como a brucelose – diz Bruno Lucchi, superintendente técnico da CNA.
Para Paulo Martins, pesquisador de gado de leite da Embrapa, em Juiz de Fora (MG), a abertura do mercado chinês é uma notícia a ser celebrada num momento de perda de receitas no campo por causa da redução dos preços do leite, que caíram R$ 0,30 por litro nos últimos meses por causa da demanda enfraquecida com as incertezas da economia.
– O consumo brasileiro de leite está andando de lado e estacionou em 166 litros por habitante ao ano, ainda aquém do padrão de economias desenvolvidas, que é de superior a 200 litros. Já o mercado da China cresce a passos largos junto com a expansão do PIB daquele país. A abertura daquele mercado cria um novo vetor de demanda aos produtores brasileiros – diz Martins.
Visita da ministra à China
Em maio, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, se reuniu com autoridades e investidores da China para tratar do assunto. No próximo dia 17, a ministra embarca novamente para o país asiático para estreitar as discussões já iniciadas e também para negociar o aumento do número de frigoríficos habilitados a exportar para o país.
No próximo dia 17, a ministra embarca novamente para a China para estreitar as discussões já iniciadas e também para negociar o aumento do número de frigoríficos habilitados a exportar para o país.
Mercado chinês
O Brasil exportou no ano passado quase US$ 64 bilhões para a China. A soja lidera a lista de produtos vendidos para os chineses (43% das exportações), seguida por óleos brutos de petróleo (23%), minério de ferro (17%) e celulose (5,4%).
Atualmente, há 1,2 milhão de pequenos produtores de leite no Brasil.
As negociações para a abertura do mercado de lácteos se arrastam desde 1996. Em 2015, a então ministra da Agricultura Katia Abreu chegou a anunciar o avanço nas negociações entre os dois países, mas a abertura não chegou a ser efetivada devido às exigências do governo chinês, informou o Ministério da Agricutlura em nota publicada no site da pasta.
Fonte: O Globo