A necessidade de fixação de honorários advocatícios nos casos de extinção de execução fiscal devido ao cancelamento administrativo da dívida, apesar de não estar prevista em lei, não pode causar ônus excessivo ao poder público.
Com esse entendimento, a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso especial ajuizado contra acórdão que usou a técnica da equidade para reduzir os honorários devidos aos advogados de uma empresa de comércio de alimentos.
A empresa em questão foi alvo de execução fiscal, e os advogados interpuseram uma exceção de pré-executividade. A própria Fazenda municipal, então, cancelou administrativamente a Certidão da Dívida Ativa (CDA), e, por causa desse ato, a execução foi extinta sem resolução do mérito.
Pela Lei de Execução Fiscal, um caso como esse não geraria honorários de sucumbência. O artigo 26 prevê que, se antes da decisão de primeira instância a inscrição de divida ativa for, a qualquer título, cancelada, não haverá ônus para qualquer das partes.
No entanto, o STJ fixou jurisprudência segundo a qual é justo remunerar a defesa técnica apresentada pelo advogado do executado em momento anterior ao cancelamento administrativo da CDA. O entendimento gerou a Súmula 153 da corte.
Assim, a fixação de honorários no caso obedeceria a regra do artigo 85, parágrafo 3º, inciso II, do Código de Processo Civil de 2015, que prevê entre 8% e 10% sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido.7
Isso significaria, para os advogados da empresa de alimentos, R$ 107, 2 mil. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, porém, considerou esse montante abusivo, principalmente porque a extinção da execução fiscal sequer considerou a exceção de pré-executividade ajuizada pelos patronos.
Para evitar o enriquecimento sem causa dos advogados e verba honorária demasiadamente excessiva em desfavor da Fazenda, o tribunal de segundo grau deu provimento à apelação do município e reduziu o valor para R$ 25 mil.
Ônus excessivo
Relator no STJ, o ministro Gurgel de Faria observou que, apesar de o CPC de 2015 ter inaugurado uma exauriente disciplina para fixação de honorários, não foi capaz de evitar que sua aplicação, em algumas situações, acabe gerando distorções.
É esse o caso dos autos. Quando a Fazenda cancelou a CDA, toda a argumentação feita pela defesa do contribuinte perdeu qualquer utilidade e sequer pôde ser considerada na decisão de extinguir a execução fiscal.
"Não há, pois, objetiva e direta relação de causa e efeito entre a atuação do advogado e o proveito econômico obtido pelo seu cliente a justificar que a verba honorária seja necessariamente deferida com essa base de cálculo", concluiu o ministro Gurgel de Faria.
Por isso, segundo ele, é cabível o uso da equidade para fixação de honorários. Não seria razoável impor à Fazenda municipal, bem menos poderosa economicamente do que a Fazenda Nacional, um ônus financeiro tão grande por espontaneamente informar o juízo sobre o cancelamento da CDA.
Entender diferente, segundo o relator, vai apenas incentivar as Fazendas municipais a manter a litigiosidade mesmo nos casos em que, prematuramente, perceber que a dívida fiscal é infundada. Haveria, ainda, o esvaziamento completo do artigo 26 da Lei de Execução Fiscal.
Distinguishing
"Esses casos em que o trabalho prestado pelo advogado da parte vencedora tenha se mostrado absolutamente desinfluente para o resultado do processo, tenho que a sua remuneração não deve ficar atrelada aos percentuais mínimos e máximos estabelecidos no parágrafo 3º, devendo ser arbitrada por juízo de equidade do magistrado", afirmou o ministro Gurgel de Faria.
O voto destacou que isso não significa declaração de inconstitucionalidade ou negativa de vigência do parágrafo 3º do artigo 85 do CPC, mas apenas interpretação sistemática de regra do processo civil orientada conforme os princípios constitucionais da razoabilidade e da proporcionalidade.
O ministro também apontou que o caso não se enquadra na hipótese de aplicação da tese fixada pela Corte Especial do STJ que vedou o uso da equidade para fixação de honorários fora das hipóteses do artigo 85, parágrafo 8º, do CPC.
"A solução adotada no caso concreto decorre da interpretação do art. 26 da LEF, aspecto não tratado no precedente obrigatório, o que justifica a distinção. Diante desse contexto, deve ser mantido o valor dos honorários advocatícios estabelecidos mediante apreciação equitativa realizada pelo tribunal de origem". A votação na 1ª Turma foi unânime.
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AREsp 1.967.127
Danilo Vital – Correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
Fonte: Revista Consultor Jurídico – 11/08/2022