Ao informarem o valor dos impostos pagos em nota fiscal, as empresas ganham um aliado em sua batalha por uma reforma tributária: o consumidor
Por Rafael Freire
O empresário paulista Ronaldo Veiga, 38 anos, assustou-se ao analisar a nota fiscal das compras que havia acabado de fazer em uma loja da rede de supermercados Assaí, na zona oeste de São Paulo. O comprovante de compra informava que, dos R$ 358 gastos basicamente com bebidas para abastecer a lanchonete de sua academia, na região central da capital paulista, nada menos que R$ 150,5 era a fatia relacionada aos impostos – 43% do total. “Fiquei revoltado, mas é importante que haja essa transparência”, afirma Veiga. A experiência do microempresário de saber para onde vai o seu dinheiro, agradável ou não, passará a fazer parte da rotina de todos os consumidores brasileiros.
Isso porque, desde o começo de junho, entrou em vigor a lei que obriga as empresas a divulgarem o peso dos tributos nas notas fiscais de produtos e serviços. “Essa transparência pode ser usada para criar um clima de cumplicidade entre a companhia e seu público-alvo”, diz João Sanzovo, vice-presidente da Associação Brasileira de Supermercados. O Brasil segue o caminho trilhado por alguns países, como os Estados Unidos, que divulgam há muito tempo o preço dos produtos e serviços com o valor dos impostos que incidem sobre eles. Nesse cenário, o consumidor brasileiro passa a ter clareza da complexidade do sistema tributário brasileiro e, principalmente, do tamanho da mordida do leão sobre o que compra.
As empresas, por sua vez, ganham um aliado em sua batalha para uma reforma tributária, uma demanda empresarial antiga que nunca saiu do papel. “Essa exigência traz muito mais transparência na relação com o cliente”, afirma Paulo Henrique de Toledo Farroco, diretor de tecnologia da informação da varejista Riachuelo. “Ele, agora, é o senhor da situação.” A rede passou a emitir os comprovantes com o peso dos impostos em maio deste ano, antes mesmo de a lei entrar em vigor. Na nota fiscal que o consumidor receberá, sete impostos serão discriminados.
São aqueles que incidem diretamente sobre a compra. Mas a teia tributária brasileira é bem mais complexa. O Brasil conta com 63 impostos das esferas federal, estadual e municipal, muitos deles incidindo em cascata. Em 2011, de acordo com a Receita Federal, a carga tributária brasileira representou 35,3% do PIB, a 17ª maior do mundo – o ranking é liderado pela Dinamarca. Um estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) calculou o índice de retorno dos tributos em relação ao bem-estar da sociedade e colocou o País na 30ª posição, atrás dos vizinhos Uruguai e Argentina.
“É uma iniciativa que insere definitivamente a população na briga pela competitividade de preços no Brasil”, afirma João Eloi Olenike, presidente do IBPT. Algumas empresas enxergam a legislação como uma oportunidade para reforçar seu discurso contra o mercado ilegal. É o caso da indústria de tabaco, no qual o cigarro, seu principal produto, recolhe 65% de imposto. “Agora, os riscos que a alta carga tributária pode gerar, estimulando o mercado ilegal, estão mais evidentes”, afirma Leonardo Senra, diretor de finanças da Souza Cruz. De acordo com o executivo, o Brasil deixou de arrecadar cerca de R$ 3 bilhões em 2012, por conta do mercado negro de tabaco, que respondeu por 30% das vendas do setor.
Veículo: Revista Isto É Dinheiro