Simples: Inadimplência leva Receita a adotar medida polêmica

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Os 35 mil maiores devedores do Simples podem estar fora do cadastro da Receita Federal. A informação, divulgada há duas semanas, refere-se ao 3º lote de Atos Declaratórios Executivos (ADE), que levou em consideração débitos do Simples Nacional referentes aos anos-calendário 2007 e 2008. Atualmente, o número de empresas beneficiadas pelo Simples Nacional é de 4 milhões. Destas, mais de 560 mil estão em situação de inadimplência e irregularidades que geram um somatório de aproximadamente R$ 5 bilhões.

A exclusão terá efeito a partir de 1 de janeiro de 2011. O pagamento da totalidade dos débitos evitará que seja confirmada a exclusão, permitindo, assim, que a empresa permaneça no regime no próximo ano.  Não há previsão legal para o parcelamento de débitos, que devem ser pagos à vista.

Novos lotes de ADE podem ser anunciados e outros contribuintes excluídos do regime do Simples, conforme o disposto no artigo 5º da Resolução CGSN nº 15, de 23 de julho de 2007. Os Documentos de Arrecadação (DAS) referentes aos débitos identificados deverão ser gerados por meio do aplicativo Programa Gerador de Documentos de Arrecadação (Pgdas), disponível no portal do Simples Nacional na internet (http://www8.receita.fazenda.gov.br/SimplesNacional).

Não é a primeira vez que ocorre uma situação como essa. Em agosto de 2008 a Receita Federal emitiu ADEs intimando muitas empresas a regularizarem seus débitos no mesmo prazo de 30 dias. Na ocasião anterior, diversas entidades foram excluídas do regime tributário por irregularidades, como inadimplência do pagamento do Documento de Arrecadação do Simples Nacional (Dasn), divergência de INSS com os valores da Gfip e descumprimento de parcelamentos de outros impostos em opções anteriores. Por outro lado, muitas atenderam ao chamado da Receita e se mantiveram optantes até este exercício.

Segundo o supervisor de gestão e planejamento da TDF Assessoria Contábil, contador Willian Mariano, essa situação gera desconforto aos cofres públicos em virtude de este ser um benefício concedido pelo governo federal e não estar sendo utilizado da forma correta pelos contribuintes. A evolução tecnológica, através do cruzamento digital das informações do fisco, bancos e previdência, apontaram as irregularidades que tiveram como consequência a adoção de medidas alertadoras e punitivas para os contribuintes que não estiverem atendendo aos requisitos da Lei Complementar 123/2006.

Substituição tributária está entre as causas

O aumento da carga tributária sobre as empresas como efeito da cobrança antecipada do ICMS nas divisas estaduais e via substituição tributária pode ser um dos motivos que levaram as micro e pequenas empresas a terem dificuldades financeiras. Essa é a avaliação do gerente de políticas públicas do Sebrae, Bruno Quick.

A opinião do gerente do Sebrae é de que a cobrança antecipada do ICMS deixa as pequenas organizações empresariais em dificuldades porque, na prática, anula a redução tributária a que elas têm direito dentro do Simples Nacional. Em alguns casos o valor do ICMS que seria pago, como ele foi idealizado, acaba multiplicado sete vezes, afirma o gerente, ressaltando ser necessário cessar essa grave distorção praticada pelos governos estaduais.

A possibilidade de exclusão de empresas do Simples Nacional, conforme ele, é preocupante e reforça a necessidade de resolver problemas como esse. Outra preocupação é com o fato de que não há previsão legal de parcelamento para esses débitos.

A solução apontada por Quick está no Projeto de Lei Complementar 591/10, em tramitação na Câmara dos Deputados, que, entre outras medidas, resolve o problema da cobrança do ICMS e cria parcelamento automático de débitos para as empresas do Simples Nacional. Quick lembra que é preciso que o projeto seja aprovado e sancionado ainda este ano.

Não regularização deve elevar peso dos impostos em até 63%

Para o governo, além da arrecadação estimada de R$ 2,5 bilhões neste primeiro lote, a medida de retirar do cadastro os devedores do Simples significará uma recuperação de mais de 40% da inadimplência total existente hoje no cenário tributário brasileiro. Porém, há o risco de muitas empresas voltarem à informalidade, fato que foi praticamente sanado após a criação do Simples e do Simei, o Sistema de Recolhimento em Valores Fixos Mensais dos Tributos abrangidos pelo Simples Nacional, devidos pelo Microempreendedor Individual (MEI).

Segundo o supervisor de gestão e planejamento da TDF Assessoria Contábil, contador Willian Mariano, as entidades que continuarem excluídas do Simples a partir de 2011 e não regularizarem seus débitos poderão elevar a carga tributária brasileira em até 63%. Isso inclui os fatores previdenciários, que são um dos principais ganhos hoje na opção deste regime diferenciado. Será um impacto significativo na economia, tanto para o governo quanto para os contribuintes, afirma.

Os contribuintes excluídos passarão a recolher o Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) como qualquer contribuinte, além de outros reflexos nos fatores previdenciários (INSS empregador) e demais componentes tributários que hoje são minimizados pela opção do simples. Devido ao impacto gerado na gestão e fluxo de caixa das empresas excluídas, não é vantajoso para as empresas deixarem que a exclusão aconteça.

Segundo ele, é importante que o contribuinte faça o pagamento até o encerramento do ano calendário, incorrendo em reinclusão em janeiro do ano subsequente, para continuar se beneficiando desta opção. Se forem excluídas mesmo assim, as empresas poderão novamente projetar se adequar em exercícios futuros ao simples nacional, exceto casos em que forem excluídas por 3 ou 10 anos (art. 29 da lei complementar 123/2006).

A inadimplência brasileira chegou a esses níveis porque o menor impacto tributário e o entendimento de que é injusta a alta carga exigida para todos os contribuintes é uma constante, diz Mariano. Diversos pareceres de que os impostos pagos ao governo não retornam em benefício para as empresas são indícios da maior causa para inadimplência tributária, mesmo daqueles que optam pelo Simples Nacional. Fatores como deficiência técnica no planejamento estratégico e tributário das empresas e altos índices de sonegação de âmbito nacional agravam a situação de quem busca regularidade fiscal.

Divergências do movimento bancário e cartões de crédito em comparação aos valores oferecidos à tributação apontam que mais de 60% da sonegação de impostos está nas empresas que integram o regime do Simples. O fato prejudica a busca de uma gestão qualificada e transparência nos dados. A aproximação e atenção dos gestores a seus contadores, dedicando tempo ao planejamento estratégico e tributário, pode reduzir a inadimplência, conclui.

Medida pode refletir em desemprego e fechamentos

A medida tomada pela Receita Federal trará alguns prejuízos para as micro e pequenas empresas que faturam até R$ 2,4 milhões por ano. Na opinião de Charles Tessmann, diretor-geral da T&ssmann Assessoria Empresarial, deixar de utilizar esta forma de tributação poderá trazer o fechamento destas empresas e consequentes desempregos e curto e médio prazo. Segundo ele, os empresários que forem notificados pela Receita devem, primeiramente, regularizar seus débitos referentes 2007 e 2008. Porém, já existe uma corrente de empresários que está se organizando para barrar esta exclusão.

De acordo com Tessmann, a inadimplência motivou a Receita Federal a tais exclusões porque o índice de não pagamento tem aumentado gradativamente, uma vez que os empresários abrem seus negócios neste regime pela aparente facilidade e economia. Falta, na opinião dele, planejamento e estudo antes de abrir as empresas, além do cumprimento de suas obrigações fiscais. A inadimplência também se dá por uma cultura do brasileiro, pois sabe-se que, de tempos em tempos, o governo lança um programa para saldar dívidas, de forma que já contam com estas medidas para pagarem seus impostos em atraso.

Tessmann atribui à alta carga tributária em relação ao PIB o fato de as empresas brasileiras terem chegado a este nível de inadimplência. O fato, segundo ele, obriga o empresário a deixar os impostos de lado para saldar seus outros compromissos. Para quem for excluído, o assessor empresarial dá a dica: deve-se fazer os cálculos junto à consultoria contábil para a escolha da melhor opção tributária: lucro real ou lucro presumido. Deve-se ponderar todos os impactos que estas novas opções poderão afetar a sua empresa, levando em conta o ramo de atividade, faturamento, numero de colaboradores, custos, despesas etc.

Jornal do Comércio: Lara Ely

Fonte: JusBrasil (29.09.10)


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