Durante 2009 e em boa parte de 2010 tem sido amplamente noticiada e discutida a necessidade de termos no Brasil um marco regulatório para internet. O anteprojeto de lei, de iniciativa do Ministério da Justiça, foi discutido em audiências públicas, associações de empresas do setor, órgãos de defesa do consumidor e outros tantos foros dos mais variados extratos da sociedade. Embora alguns manifestem a opinião de que essa lei é de menor importância, sua urgência só faz ser reforçada a cada dia.
A internet é uma realidade cada vez mais presente na vida dos brasileiros. Estima-se que hoje 66,3 milhões de brasileiros têm acesso à rede e aos milhares de serviços e produtos através dela ofertados. Como não poderia deixar de ser, este acesso a novos serviços, produtos e novas formas de negociação são objetos de disputas no Judiciário.
Neste cenário, sem uma regulamentação específica sobre a responsabilidade civil de provedores de acesso, provedores de conteúdo próprio e/ ou de terceiros, o Judiciário utiliza-se das normas já existentes, do direito comparado e de julgados anteriores para proferir decisões sobre o assunto.
Até aí, nada de novo. Mas quando o assunto é internet e quais são as responsabilidades dos provedores de serviços de internet, a insegurança jurídica atinge níveis alarmantes.
Tome-se, por exemplo, o tratamento dado pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro ao tema da responsabilidade dos sites de compra e venda por atos de seus usuários. Na semana passada, o site Consultor Jurídico publicou matéria sobre o recente Acórdão proferido pela 5ª Câmara Cível do Tribunal que responsabilizou um desses sites por uma compra mal sucedida realizada a partir de um anúncio hospedado em sua plataforma.
A decisão contraria entendimento do próprio Tribunal do Estado do Rio de Janeiro proferido em outras Câmaras, a saber, as 4ª, 8ª, 17ª, 18ª Câmaras em julgados análogos. Por exemplo, em julgado da 4ª Câmara Cível, o desembargador Sidney Hartung entendeu que a isenção de responsabilidade dos sites de compra e venda, por culpa exclusiva do usuário, é o entendimento dominante do Tribunal, razão pela qual aplicou o artigo 557 do Código de Processo Civil e negou seguimento ao recurso em confronto com jurisprudência dominante do Tribunal.
Neste contexto, cita-se ainda os acórdãos proferidos nas Apelações Cíveis 0003275-04.2009.8.19.020 da 4ª Câmara Cível, Rel. Des. Sidney Hartung; 2009.001.36090 da 8ª Câmara Cível, Des. Orlando Secco e 2008.001.16030 da 17ª Câmara Cível, Des. Maria Inês Gaspar.
A insegurança jurídica criada por tal cenário inibe a inovação e pode terminar por colocar o Brasil em descompasso com a internet que existe em boa parte do restante do mundo, já que, atribuir aos provedores de serviços que transportam conteúdo de terceiros a responsabilidade por aquele conteúdo ou pelos atos dos autores do conteúdo poderá desaguar em censura, controle prévio, monitoramento excessivo, cerceamento à liberdade de expressão, alinhamento editorial e outros tantos efeitos deletérios que absolutamente não cabem na idéia que acostumamos a fazer da internet.
A regulamentação da internet certamente não trará fim às disputas judiciais, mas concederá ao magistrado um norte legislativo para que as decisões do Judiciário alcancem um entendimento pacífico sobre a matéria. O país agradece.
Fonte: Conjur – Consultor Jurídico (09.12.10)