Processado pela Justiça paulistana sob acusação de crime contra as relações de consumo (artigo 7º, inciso II da Lei nº 8.137/90), o comerciante W.M.N. impetrou, no Supremo Tribunal Federal (STF), o Habeas Corpus (HC) 109353, pedindo, liminarmente, a suspensão do processo e, no mérito, sua anulação e a declaração de competência de Juizado Especial para julgá-lo, porque o delito em questão seria de menor poder ofensivo.
De acordo com o artigo 89 da Lei nº 9.099 , “nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Código Penal)”.
O caso
O comerciante é acusado de “vender ou expor à venda mercadoria cuja embalagem, tipo, especificação, peso ou composição esteja em desacordo com as prescrições legais, ou que não corresponda à respectiva classificação oficial”, crime este punido com pena de detenção, de um a cinco anos, ou multa.
Ainda antes da Justiça paulistana analisar o recebimento da denúncia feita pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP), a defesa de W.N. requereu que o feito fosse redistribuído ao Juizado Especial Criminal da capital paulista, por entender que o delito imputado, por cominar pena alternativa de multa, caracterizaria infração de menor potencial ofensivo. Alternativamente, pediu ainda que o MP-SP formulasse proposta de suspensão condicional do processo.
Entretanto, o MP-SP se manifestou contra essas pretensões, o juiz recebeu a denúncia e indeferiu o pedido. Dessa decisão, a defesa recorreu, sucessivamente, ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP), que negou a ordem, e ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).
No STJ, a ministra relatora concedeu liminar, suspendendo o curso do processo. Entretanto, quando do julgamento de mérito, a Sexta Turma do STJ concedeu a ordem apenas parcialmente, para que o MP-SP se manifeste acerca da proposta de suspensão condicional do processo.
Em sua decisão, a Sexta Turma do STJ aplicou jurisprudência daquela Corte segundo a qual o critério eleito pelo legislador para definir a competência dos Juizados Especiais Criminais “é o quantum máximo da pena privativa de liberdade abstratamente cominada”, apesar da previsão de pena alternativa de multa.
Assim, como no crime imputado ao comerciante a pena máxima abstrata é de cinco anos, não está caracterizado, no entendimento da Turma daquela Corte, o constrangimento ilegal sustentando pela defesa pelo fato de o processo tramitar na Justiça comum.
No STF
Ao se insurgir contra a decisão do STJ por meio do HC agora impetrado no STF, a defesa afirma que “a possibilidade de aplicação isolada da pena de multa significa que o desvalor atribuído à ação típica é inferior aos casos em que a lei penal comina privação de liberdade como sanção exclusiva, uma vez que, por óbvio, a multa é a mais branda das espécies de sanção penal previstas no ordenamento jurídico”.
Além disso, segundo os advogados do comerciante, se é possível o cabimento da proposta de suspensão condicional do processo em infrações cuja sanção penal mínima envolve pena privativa de liberdade superior a um ano (na qual se comina, alternativamente, pena de multa), o mesmo raciocínio deve ser aplicado no que diz respeito ao reconhecimento da competência dos Juizados Especiais Criminais para processar infrações com pena máxima superior a dois anos, às quais se aplica pena alternativa de multa, consoante a inexpressividade do delito.
Assim, segundo a defesa, “levando-se em conta os princípios da equidade, razoabilidade e proporcionalidade, todos com assento constitucional, deve-se, necessariamente, estender o alcance da transação penal aos crimes que possuem menor grau de reprovação social – portanto, menor potencial de ofensividade – como é o caso do delito imputado ao comerciante, tendo em vista a cominação de multa alternativa como sanção exclusiva possível”.
FK/CG
Fonte: Supremo Tribunal Federal – STF (18.07.11)