Trabalho a distância - O princípio do contrato-realidade, adotado pelo direito do trabalho, ainda sobrepõe-se às fórmulas jurídicas

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Por: Almir Pazzianotto Pinto
SÂO PAULO

A recente Lei n. 12.551, de 15 de dezembro de 2011, possui dois artigos. O primeiro altera o art. 6º da CLT. Onde se dizia “desde que esteja caracterizada a relação de emprego”, passou-se a dizer “desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego”. Esforço-me, mas não consigo atinar com os motivos determinantes da modificação, uma espécie de troca de seis por meia dúzia. O aspecto original da norma vem a seguir, no parágrafo único acrescentado ao referido art. 6º. Diz o texto: “Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para os fins da subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio”.

Tudo indica que o legislador procurou alertar, em linguagem obscuro-enviesada, que as regras de proteção ao trabalho se aplicam a empregados que trabalham a distância, sob ordens transmitidas pela telefonia celular, Internet e outros instrumentos gerados pela revolucionária tecnologia de informação. Se assim é, a lei parece-me inútil. Sabe-se que o trabalho desempenhado por pessoa física, de forma não eventual, em regime de dependência ou subordinação, mediante salário, no interior ou fora da empresa ou estabelecimento, ainda que sem registro e anotação da CTPS, encontra-se protegido pela CLT e legislação complementar. O princípio do contrato-realidade, adotado pelo direito do trabalho, sobrepõe-se às fórmulas jurídicas, daí porque quem é comandado a distância acha-se tão amparado quanto aquele cujos serviços são prestados no interior de fábrica, oficina, loja, escritório, agência bancária.

Sobre trabalho distante já se havia manifestado a Lei n. 3.207/1957, que regulamentou as atividades de empregados vendedores, viajantes ou pracistas. Posteriormente a Lei n. 6.224/1975 disciplinou o exercício da profissão de empregado propagandista e vendedor de produtos farmacêuticos. O vigilante, cujo serviço é desempenhado em estabelecimento alheio, tem a profissão regida pela Lei n. 7.102/1983. Essas e outras, como a do ferroviário e do aeronauta, colocam-se, habitualmente, fora do raio de controle direto do empregador ou seus representantes. Nem por isso, todavia, estão desamparadas. A CLT trata do trabalho fora do estabelecimento no art. 74, § 3º.

Também o fez a Portaria MTB n. 3.626. de 13 de janeiro de 1991, no art. 13, parágrafo único. Leis especiais, como dos empregados vendedores viajantes, vendedores e propagandistas de produtos farmacêuticos, vigilantes, têm em mira normatizar aspectos específicos, dos quais não cuida a legislação geral. Conquanto a Lei n. 12.551 padeça de falta de clareza, tudo indica que o autor visou dizer que quem trabalha à distância ou na residência goza dos direitos deferidos pelo art. 7º, XIII, da Constituição, isto é, limite semanal de 44 horas, ou no máximo de 8 diárias, com acréscimo mínimo de 50%, para pagamento das horas extraordinárias.

Como sempre, em matéria de administração da jornada as dificuldades de ambas as partes, empregador e empregado, consistem na produção de provas do trabalho excedente. Como fazer para que não haja prejuízos ou ganhos indevidos decorrentes da impossibilidade do registro do ponto? Para atividades internas, quando o estabelecimento possui mais de dez empregados, a CLT, no artigo 74, § 2º, permite que a anotação se faça manualmente, mediante cartão, ou equipamento eletrônico. No trabalho externo é fisicamente impossível a adoção de qualquer dos três métodos, daí porque, no mesmo artigo, diz o § 4º que, se o trabalho é executado fora do estabelecimento, o horário constará de ficha ou papeleta, que permanecerá em poder do trabalhador. Diante da dificuldade da prova, a Lei n. 12.551 é típico caso de muito barulho por nada. Ou, na expressão popular, chove no molhado. Para encerrar, lembro de situação análoga, resolvida pela Justiça do Trabalho, mediante a Orientação Jurisprudencial n. 49, que diz: “O uso do aparelho BIP pelo empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso, uma vez que o empregado não permanece em sua residência aguardando, a qualquer momento, convocação para o serviço”.

Fonte: www.panoramabrasil.com.br/trabalho-a-distancia-id79612.html (24.01.2012)


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