Diante da febre das compras coletivas pela internet no Brasil e da ausência de legislação federal que regulamente o tema, o Estado do Rio de Janeiro foi o primeiro a estabelecer regras claras para o setor por meio de uma nova norma, a Lei nº 6.161, publicada no dia 10 de janeiro. As empresas sediadas no Estado têm até abril para se adaptarem. As Assembleias Legislativas de São Paulo e Paraná chegaram a aprovar leis para regulamentar esse tipo de comércio, mas foram vetadas por seus governadores.
A lei do Rio obriga as empresas a fornecerem um serviço telefônico gratuito de atendimento ao consumidor. A página do site também deverá ter informações sobre a localização da sede física da empresa de vendas coletivas. Todos terão que discriminar a quantidade mínima de compradores para validar a oferta e o prazo de utilização, que deverá ser de três meses, no mínimo.
Além disso, para as vendas de alimentos devem ser fornecidas informações sobre o risco de alergias e na oferta de tratamentos estéticos, as contraindicações existentes. A lei ainda prevê que, caso a venda não atinja o número mínimo de pessoas para ser concretizada, o cliente tenha o dinheiro devolvido em 72 horas.
Desde a instalação do primeiro site de compra coletiva no Brasil, em março de 2010, com a criação do Peixe Urbano, houve um boom de empresas que se dedicam ao comércio. Hoje estima-se que já sejam cerca de dois mil no país. Nesse período, as reclamações contra as empresas também cresceram consideravelmente. Somente no Procon do Rio de Janeiro esse número aumentou em sete vezes no último ano. Em 2011, o órgão registrou 353 queixas de consumidores contra 49 em 2010.
Para a advogada do Procon do Rio, Camile Felix Linhares, a nova norma deve dar mais segurança para os consumidores fazerem suas reclamações. Segundo ela, a principal queixa tem sido sobre a inexistência do endereço da empresa ou telefone no site. "Com a previsão em lei, os sites terão que se adaptar", afirma. Outra grande fonte de reclamações, segundo a advogada, é o não reembolso de valores pagos em ofertas que não atingiram o mínimo de compradores. Agora a nova regra, traz o prazo de restituição em 72 horas.
O cumprimento da nova lei deve ser acompanhado de perto pelo Procon fluminense, segundo Camile. De acordo com ela, os consumidores poderão ligar para o número 151 para fazer denúncias. A partir disso, o órgão verificará o ocorrido. As companhias poderão sofrer multas que variam de 200 Ufirs do Estado do Rio - cerca de R$ 500 - até 3 mil Ufirs - aproximadamente R$ 6,8 mil.
As empresas, por sua vez, estão preocupadas com a nova lei, segundo o advogado Leonardo Palhares, do Almeida Advogados, vice-presidente e coordenador do Comitê Jurídico da Camara-e.net, que reúne as grandes empresas de compras coletivas, representantes de 80% no mercado brasileiro. Para ele, a regra sancionada pelo governo do Rio é inconstitucional, pois somente a União poderia legislar sobre as relações de consumo para um setor. "Já pensou se cada um dos 27 Estados institui regras diferentes? Isso seria uma loucura".
Ele acrescenta que, por esse mesmo motivo, projetos de leis semelhantes já foram derrubados em São Paulo e Paraná. Porém, com a sanção da nova lei no Rio, o advogado afirma que o Comitê de Compras Coletivas da Câmara deve reunir-se no fim deste mês para discutir quais medidas a serão tomadas. Para ele, não seria necessária uma nova regra para regulamentar a modalidade de comércio. "O Código do Consumidor já seria o suficiente".
Claudia Woods, coordenadora do Comitê de Compras Coletivas da Camara-e.net e diretora de Marketing do ClickOn, afirma que muito do que está disposto na lei do Rio já é prática das grandes empresas do setor. Segundo ela, há até um Código de Ética elaborado pelo Comitê, que em muitos aspectos é até mais rigoroso e eficaz do que a própria lei do Rio. O site Groupon afirmou por nota que seguirá todas as diretrizes da lei. Reforça, porém, que o site já atua dentro das regras do Código de Defesa do Consumidor.
Já para os advogados Fábio Korenblum, do contencioso cível do Siqueira Castro, e para Renato Opice Blum, coordenador do curso de Direito Digital da Fundação Getúlio Vargas (FGV), em São Paulo, e presidente do Conselho de Segurança da Informação da Fecomércio, a lei do Rio seria apenas uma norma complementar ao Código do Consumidor. Por isso, não pode ser considerada inconstitucional, pois não iria além do que já dispõe a regra geral. Para eles, a lei pode ser saudável ao mercado a medida que traz mais transparência para essas operações.
Adriana Aguiar - De São Paulo (Valor Econômico)
Fonte: Associação dos Advogados de São Paulo – AASP (02.02.2012)