Pedido de produtores se apoia em plano para dar escala ao setor
Clarisse de Freitas
O pedido de salvaguarda ao vinho nacional, em estudo pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic), não é gratuito. Quem faz a ressalva é o diretor-executivo do Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin), Carlos Paviani. Segundo ele, a demanda apresentada há um ano e meio ao governo federal e publicada na quinta-feira passada no Diário Oficial é apenas a base para que o setor tenha tempo e condições de ganhar maior participação no mercado interno e fazer os investimentos necessários para ampliar a competitividade.
Paviani explica que, apesar do aumento do consumo de vinhos finos no País, que saltou de 68 milhões de litros em 2006 para 91 milhões de litros em 2011, a participação do produto nacional se mantém praticamente estável. Em 2006, os vinhos finos feitos por aqui tinham 18% do mercado e, no ano passado, a fatia foi de 19,5%. “A maior participação que já tivemos, nesse período, foi entre 2007 e 2009, quando chegamos a 21%, mas logo voltamos a cair”, afirma o executivo. No ano passado, 78,7% do consumo interno foi atendido por produtos importados (o equivalente a mais de US$ 261 milhões), sendo que, nesse montante, apenas 19% são de vinhos oriundos dos países-membros do Mercosul (majoritariamente da Argentina). Os grandes fornecedores de vinhos para o mercado brasileiro são o Chile, a Itália e Portugal. Para fazer frente a essa diferença, há três anos as entidades do setor começaram a estudar as medidas cabíveis, dentro das normas da Organização Mundial do Comércio (OMC).
O resultado dessa mobilização foi apresentado ao governo federal há um ano e meio, quando o Ibravin, a União Brasileira de Vitivinicultura (Uvibra), a Federação das Cooperativas do Vinho (Fecovinho) e o Sindicato da Indústria do Vinho do Estado (Sindivinho) pediram a adoção de salvaguardas do tipo que limita o volume de produto de cada origem que pode entrar no mercado brasileiro. Assim, o Mdic definiria quotas para as importações de terceiros países (os países-membros do Mercosul e Israel, por força dos acordos bilaterais de comércio, ficariam protegidos).
“A salvaguarda que limita a quantidade é mais efetiva, no caso do vinho, que a simples elevação do imposto de importação. Isso porque queremos ganhar participação no mercado ao longo do tempo”, disse Paviani. A expectativa é que, passado o período para manifestações (que segue à publicação feita no Diário Oficial), o governo conceda uma salvaguarda temporária, para que o ministério possa investigar os efeitos da medida no mercado nacional. Ao final dessa etapa, que pode levar cerca de dez meses, é que o Mdic irá se posicionar sobre a concessão ou não da medida de proteção à indústria nacional. Caso atenda à demanda, a salvaguarda definitiva terá prazo de três anos.
Nesse período, o setor deve enfrentar os três principais gargalos à comercialização dos vinhos finos brasileiros no mercado interno: o custo Brasil, a falta de escala e a inexistência de crédito adequado aos ciclos produtivos da vitivinicultura.
Em relação ao custo, Carlos Paviani afirma que a estrutura tributária do País difere muito da adotada nos países que exportam vinhos para o Brasil. “Todos os países latino-americanos, por exemplo, usam rolhas importadas de Portugal e da Espanha. Entretanto, só no Brasil esse produto paga imposto de importação e de produção. Nos demais, ela só é taxada quando já está tampando a garrafa. Também temos a guerra fiscal entre os estados e a diferença de tarifa entre os portos.”
Segundo ele, Santa Catarina é um exemplo de estado que desonera a importação de vinhos pelos seus portos, o que torna o custo dos importados menor do que o dos vinhos produzidos no próprio estado, com incentivos do governo local. “Com isso, quando o produto gaúcho entra em solo catarinense e paga 12% de ICMS, fica mais caro que o vinho local e muito mais caro que o importado”, detalhou o executivo do Ibravin.
Entidade que representa 130 importadores critica ação do governo brasileiro
Marcelo Beledeli
O processo de investigação iniciado pelo governo brasileiro para determinar se o comércio de vinhos estrangeiros vem causando prejuízos graves à indústria nacional é contestado pelas empresas importadoras. A Associação Brasileira dos Exportadores e Importadores de Alimentos e Bebidas (Abba), que representa 130 importadoras, afirma que o tipo de vinho que é objeto da investigação (vinhos finos) representa somente 15% da produção brasileira.
A entidade alega ainda que o preço médio da garrafa de vinho fino importado aumentou entre 2009 e 2011, ou seja, tornou-se menos competitivo no mercado interno. “Se há três anos cada garrafa foi importada, em média, por US$ 3,20, em 2011 o valor aumentou para US$ 3,60. Esse pedido não tem embasamento técnico”, disse Raquel Salgado, presidente da Abba. Hoje, o Imposto de Importação de vinho fino é de 27%.
De acordo com Leocir João Vanazzi, sócio-proprietário da importadora Vinhos do Mundo, de Porto Alegre, ainda que aprovada, a salvaguarda não deverá incentivar o consumo do produto nacional, mesmo que o preço dos estrangeiros suba com o aumento de impostos. “Quem escolhe o vinho é o consumidor, hoje ele está escolhendo importados, ele tem seus motivos; talvez a indústria nacional não consiga fazer um produto no mesmo estilo que os estrangeiros”, declarou. Os principais mercados fornecedores de vinho para o Brasil são Chile, Argentina e União Europeia. Na hipótese de salvaguarda, os argentinos ficariam livres da restrição porque são membros do Mercosul. Para os chilenos, porém, seria um forte golpe em suas exportações para o Brasil, que, no ano passado, somaram US$ 261 milhões.
Fonte: Jornal do Comércio (19.03.12)