Sob pressão, secretários estaduais fazem esforço para chegar a acordo que acabe com programas de benefícios, mas há muito ceticismo
Pressionados pela perspectiva de o Supremo Tribunal Federal (STF) declarar ilegais todos os incentivos fiscais que concederam nos últimos anos, os Estados estão fazendo um esforço inédito para chegar a um acordo sobre o que fazer com os programas em andamento e acabar com os novos, assinando um armistício na guerra fiscal.
"É complexo, mas acredito que podemos fechar um acordo até o fim do ano", disse o coordenador do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), Cláudio Trinchão. Se os entendimentos caminharem bem, poderão culminar na grande reforma do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) que vem sendo tentada, sem sucesso, desde 1991.
Há, porém, muito ceticismo entre os secretários estaduais de Fazenda. Isso porque o Confaz, que reúne todos os Estados, só toma decisões por unanimidade. Basta um dos 27 Estados discordar das regras propostas para tudo ir por água abaixo.
"É difícil, mas eu nunca ouvi os discursos que ouvi hoje, no sentido que esse é um problema nosso e cabe a nós resolver", insistiu Trinchão na última quinta-feira, após reunir-se com representantes de todos os Estados. "Quem entende de ICMS somos nós, não é o Judiciário e não é o Ministério da Fazenda." Aquela havia sido a sétima reunião técnica para tratar do assunto.
Disputa. Nos anos 1970, os Estados das regiões mais pobres começaram a atrair empresas ao conceder descontos no ICMS. Essa disputa por investimentos é a chamada guerra fiscal.
Esses descontos não foram aprovados pelo Confaz, contrariando a lei. Mesmo sabidamente ilegais, continuaram a ser criados até junho do ano passado, quando o STF condenou 23 desses incentivos. Em tese, a decisão deveria cessar a guerra fiscal.
Porém, conforme publicou o Estado, o efeito foi o contrário. Os governos estaduais, ameaçados de serem definitivamente proibidos de conceder incentivos, trataram de criar novos benefícios e atrair mais empresas. Nesse frenesi, alguns ofereceram desconto de 100% na base de cálculo do ICMS.
Segundo Trinchão, o armistício em discussão prevê que os benefícios antigos terão de ser preservados, pelo menos por algum tempo. "Se não, em dez anos, não tem mais indústrias no Norte, Nordeste e Centro-oeste", disse. Mas os incentivos novos deverão ser invalidados.
O fim da guerra fiscal teria de ser compensado por um Fundo de Desenvolvimento Regional, que garantiria estímulos a que empresas investissem nos Estados mais pobres. Esses recursos viriam do governo federal. O valor dependerá da forma como os Estados eliminarão os incentivos da guerra fiscal.
O fundo foi prometido pelo governo federal aos Estados quando se discutiu a possibilidade de redução da alíquota interestadual do ICMS para todos os produtos - e não só para os importados, como a proposta que o Senado deve votar esta semana. É por isso que Trinchão acha que a tão falada e tão fracassada reforma tributária pode sair.
"Não tem chance", decretou o secretário de Fazenda do Paraná, Luiz Carlos Hauly. "O Trinchão está com muito boa vontade, mas o fato é que não estamos conseguindo um entendimento, a discussão da minuta de acordo não avança." Questionado sobre quem estaria emperrando a conversa, Hauly respondeu: "os de sempre e os que estão na moita." Ou seja, no fundo, nenhum Estado parece disposto a acabar com os próprios incentivos.
Nesse quadro, o risco de o STF editar súmula vinculante é um ingrediente novo. "Digamos que é um estímulo forte", disse Trinchão. "Torna mais premente a necessidade de fazer um acordo", afirmou Simão Cirineu, secretário de Fazenda de Goiás. Ele acha que um acordo é viável.
LU AIKO OTTA / BRASÍLIA - O Estado de S.Paulo
Fonte: Estadão.com.br (16.04.12)