Varejo disputa vendas de carnes

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Por Luiz Henrique Mendes e Bettina Barros | De São Paulo

 

Para o sindicato que representa os açougues, foi o atendimento 'personalizado', e não os impostos mais baixos, que alavancou o crescimento da clientela


Com queda expressiva nas vendas de carne bovina nos últimos anos, grandes redes de varejo do país partiram para o contra-ataque na tentativa de reaver a participação de mercado de um dos segmentos mais prestigiados nas gôndolas - e responsável por 10% do faturamento de R$ 240 bilhões ao ano dos supermercados.


No centro do embate está a suspensão do recolhimento de PIS/Cofins da cadeia de produção de carne bovina no mercado interno, que transferiu os custos do tributo ao varejo e acabou tirando a competitividade dos supermercados. Por outro lado, os pequenos açougues de bairro, que são beneficiados por um regime diferenciado de tributação, vêm roubando clientes de grupos polpudos como Pão de Açúcar, Walmart e Carrefour.


Segundo a Associação Brasileira de Supermercados (Abras), as vendas de carnes despencaram até 20% nas grandes redes desde 2010, enquanto que nos açougues o movimento só tem crescido. Mais que isso: além do baque nas vendas, os varejistas alegam que a tributação menor também pode estar incentivando a informalidade na cadeia produtiva da carne, dado o menor poder de fiscalização sobre estes estabelecimentos [ler matéria ao lado].


"O que nós sentimos é que há uma queda nas vendas do setor de carnes nos supermercados e um avanço dos açougues", disse ao Valor Sussumo Honda, presidente da Abras. "Enquanto nossa participação cai, percebemos também o aumento do abate não fiscalizado que parece ser absorvido por esse tipo de comércio [açougues ou pequenos supermercados com alíquota diferenciada de PIS/Cofins]", analisa.
Basicamente, a Lei 12.059, sancionada em outubro de 2009, suspendeu a cobrança das contribuições de PIS e Cofins na cadeia da carne bovina no mercado interno, o que não incluiu o varejo e, portanto, os supermercados. De acordo com o advogado Fábio Calcini, do escritório Brasil Salomão e Mathes Advogados, os supermercados tinham direito ao ressarcimento de um crédito presumido de 9,25% de PIS e de Cofins até a publicação da legislação. Com o novo regime de tributação, os lojistas passaram a ter direito a apenas 3,7% de crédito presumido, sendo que o supermercado é obrigado a repassar integralmente os 9,25% de PIS e Cofins ao consumidor.

Para Honda, da Abras, o novo modelo de tributação fez com que os preços da carne bovina subissem 6%. "E isso se traduz em 25% de impacto na rentabilidade dos supermercados", diz. "Pra resolver o problema do frigorífico, o governo jogou o recolhimento do imposto no nosso colo".


Mas, segundo Calcini, a queixa dos supermercados é legítima. "O supermercado também tinha que entrar na cadeia da desoneração das carnes", afirma, citando o exemplo do segmento de hortifruti, em que toda a cadeia, da produção ao varejo, teve a cobrança da PIS e Cofins suspensa.
O advogado explica que os açougues de bairro ou mesmo pequenos supermercados não estão sujeitos à mesma base de tributação, porque podem ser enquadrados no Simples - sistema que contempla estabelecimentos cujo faturamento anual não ultrapasse R$ 3,6 milhões. No caso das empresas enquadradas nesse sistema, o peso de todos os tributos - e não só PIS e Cofins - ficam entre 4% e 11,61%, a depender do faturamento.


A maior parte dos açougues pode receber os benefícios do Simples. Pedro Cunha, diretor do Sindicato de Comércio Varejista de Carnes Frescas do Estado de São Paulo, afirma que a receita com vendas da maioria dos açougues não ultrapassa R$ 1 milhão. Ao todo, o Estado de São Paulo conta com 37 mil açougues, conforme a entidade de classe. Desse total, 80% faturam até R$ 240 mil por ano, enquanto a receita com as vendas de 18% desses estabelecimentos atinge no máximo R$ 1 milhão. Apenas 2% dos açougues paulistas têm um faturamento superior a R$ 2 milhões.


O presidente do sindicato dos proprietários de açougues, Manoel Henrique Farias Ramos, reconhece o avanço da categoria ao longo dos anos. Segundo ele, a participação dos açougues na venda de carnes no varejo atingiu seu pior momento nos anos 1990, justamente no período de consolidação das redes de supermercados. Naquela década, diz Ramos, os açougues foram responsáveis por apenas 30% das vendas de carnes, muito pouco se comparado aos 70% das décadas de 1970 e 1980. Nos últimos anos, porém, a participação dos açougues voltou a crescer, para os atuais 40%, conforme Ramos.


De acordo com o dirigente, o fator que alavancou o recente crescimento dos açougues não foi a tributação mais pesada de PIS e Cofins sobre os supermercados. "A vantagem do açougue é o atendimento personalizado. No supermercado, você se depara com aquela vitrine e não sabe o que fazer. O supermercado praticamente eliminou o açougueiro", afirma Ramos.


Além do atendimento diferenciado, explica Ramos, os açougues passaram a apostar num modelo de negócios em rede. "Nos últimos cinco anos, os açougues estão recuperando o espaço perdido na competição com uma capacidade de organização mais agrupada, criando escala de compra. Essa é uma tendência que deve se consolidar", diz ele.


De acordo com o presidente do sindicato, a participação dos pequenos açougues, hoje majoritária, deve cair bastante nos próximos anos. E no caso das redes de açougues, o dirigente acrescenta que o impacto da cobrança de PIS e Cofins é tão desastroso quanto para os supermercados.

"Nós também pagamos o imposto. Se o PIS/Cofins não for tirado, os açougues vão quebrar", ressalta ele, citando o início de uma campanha para alertar os consumidores sobre as distorções da tributação de PIS e Cofins. "O governo fez uma cortesia com o chapéu alheio, passando a conta para o varejo. Não queremos pagar menos. Queremos equidade", afirmou.

 


Fonte: Valor Econômico (04.06.12)

 


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