Décadas atrás, a busca pela efetividade da prestação jurisdicional passou a admitir a intitulada penhora on-line. No desabrochar do século XXI o instrumento foi arrastado à banalização e tornou-se protagonista de torrenciais ilegalidades e instabilidade econômica, sob violação da segurança jurídica. O sistema jurídico exige que o pedido de penhora on-line e a decisão judicial de deferimento sejam fundamentados, respectivamente, nos artigos 282 e 283 do Código de Processo Civil e, sobretudo, no artigo 93, IX, da Constituição Federal.
Todavia, como não há um critério explícito de requisitos objetivos a serem preenchidos por aquele que pleiteia especificamente a penhora on-line, não raro, são formulados pedidos sem qualquer fundamentação ou sob base pífia, ou ainda o pedido de penhora é desprovido de qualquer documento particular ou público (como contrato ou estatuto social expedidos pela Junta Comercial), que possam comprovar de plano o alegado direito de exercer a penhora sobre patrimônio alheio, não participante do processo.
Não há qualquer dúvida quanto à obrigação do devedor adimplir os seus débitos, por força da penhora on-line. Entretanto, esse instrumento vem sendo malsucedido, sobretudo quando afeta terceiros não participantes do processo. A facilidade de seu manuseio culmina em frequentes desvios, sob lesão da própria razão de ser do instituto. Há casos em que ela é concedida sem a necessária fundamentação legal, e amiúde sem a efetiva intervenção do juiz, vez que o poder é delegado ilegalmente a um funcionário do cartório.
O que haveria de ser rápido, impõe brutal atraso ao processo, a provocar prejuízo ao credor (que não vê o seu direito efetivado) e causa dano irreversível ao suposto devedor (que se desvencilha da ilegal penhora, sob alto custo de tempo e dinheiro), cenário que pulveriza o descrédito ao Judiciário.
O sistema jurídico exige que o pedido de penhora on-line e a decisão judicial sejam fundamentados. Todavia, como não há um critério explícito de requisitos objetivos a serem preenchidos, não raro, são formulados pedidos sem qualquer fundamentação ou sob base pífia, ou ainda desprovidos de qualquer documento particular ou público (como contrato ou estatuto social), que possam comprovar o alegado direito de exercer a penhora sobre patrimônio alheio, não participante do processo. Sim, quando a penhora é disparada contra o devedor as chances de erro são diminuídas consideravelmente.
A facilidade de seu manuseio culmina em frequentes desvios
Contudo, quando a penhora on-line recai sobre terceiro estranho à lide como os homônimos, os ex-sócios ou ex-diretores da empresa executada, a situação é dramática. O homônimo terá de contratar advogado, seu patrimônio restará indisponível por longo período. Empresas com nomes semelhantes à executada devem comprovar a similaridade da razão social e, não raro, com ilegal inversão do ônus da prova, são obrigadas a comprovar que não fazem parte do grupo econômico executado.
Situação ainda mais abusiva é a posição ocupada por ex-sócios e ex-diretores de empresas executadas ao sofrerem os efeitos da penhora on line. Por absoluta falta de legislação específica que imponha critérios objetivos na formulação de pedido, os sujeitos têm suas contas bancárias, assacadas ilegalmente, máxime na área trabalhista. O primeiro impacto provocado é o afastamento de competentes administradores, advogados etc. dos quadros diretivos das empresas.
Note-se, a lei não exige dos juízes decisão liminar na defesa dos terceiros que muitas vezes aguardam anos e anos a fio para obter a liberação dos seus recursos bloqueados. Por isso, faz-se necessário prever, por texto legal, a condenação de sucumbência àquele que pede penhora on-line e sai perdedor (seara trabalhista).
Antes do pedido de redirecionamento da execução para os terceiros à lide, faz-se necessário o preenchimento de requisitos objetivos: (i) o pedido de desconsideração e a decisão deferitória devem ser fundamentados (art. 93, IX, da CF); (ii) o pedido deve demonstrar (e não só alegar) que houve o abuso da personalidade jurídica da empresa executada pelos sócios e deve comprovar o desvio de finalidade, ou a confusão patrimonial entre a empresa executada e os seus sócios (art. 50 do CC); (iii) o pedido deve demonstrar que os bens da empresa executada já foram executados (art. 596, do CPC); (iv) o pedido deve comprovar que o terceiro é sócio atual da empresa executada, ou sua retirada a menos de dois anos (art. 1.032 do CC).
O projeto do novo Código de Processo Civil traz avanços ao garantir o contraditório prévio à desconsideração da pessoa jurídica. A efetividade da rapidez jurisdicional é imprescindível no Estado de Direito. A penhora on-line é eficiente, sobretudo ao atingir o patrimônio do próprio devedor recalcitrante. Porém, a realização de penhora on line de forma afoita, sem o respeito às balizas legais já existentes e sem qualquer critério objetivo é manifestamente ilegal e prejudicial ao tecido social. O problema está no excesso do uso sem critérios.
Por Marcos Paulo Passoni
Marcos Paulo Passoni é advogado do escritório Suchodolski Associados, em São Paulo
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Fonte: Valor Econômico (06.06.12)