Quase dois anos e meio depois de proibir a venda de medicamentos isentos de prescrição (Mips) fora do balcão das farmácias e drogarias, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) volta atrás e deve votar hoje o fim da resolução 44, que determinou que todos os remédios devem ser oferecidos ao consumidor pelo balconista.
A resolução 44, implementada em fevereiro de 2010, fez muito barulho na época, por ter sido questionada pelas indústrias farmacêuticas e as redes de farmácias, e rendeu à Anvisa cerca de 70 processos, informou ao Valor Dirceu Barbano, diretor-presidente da agência. "Recorremos de muitos deles, ganhamos alguns e perdemos outros. Foi muito desgastante."
De acordo com essa resolução, os medicamentos isentos de prescrição foram proibidos de ficar ao alcance das mãos do consumidor em farmácias e drogarias, com o objetivo de ampliar o controle sanitário. A medida obriga o usuário a fazer a solicitação ao farmacêutico para receber o produto com a orientação necessária. A Anvisa também alegava, à época, que implementou a resolução porque que boa parte dos medicamentos era consumido incorretamente e poderia provocar intoxicação.
Nos últimos meses, onze Estados, entre eles São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Mato Grosso, Acre, Ceará, Pernambuco, criaram leis estaduais e reverteram a decisão da Anvisa. Esvaziada e abarrotada de processos questionando a eficiência dessa decisão, a Anvisa voltou a fazer a partir de novembro passado consultas públicas e realizou estudos para medir o impacto dessa resolução junto ao consumidor.
Os estudos da Anvisa concluíram que o consumidor não foi beneficiado, como se esperava. Pelo contrário. "Os consumidores não tinham o direito de escolha", afirmou Barbano. Na prática, prevaleceu o que o setor farmacêutico chama de "empurroterapia". Barbano afirmou que a diretoria da agência se reúne hoje e tudo indica que a resolução será revertida. "A medida não atingiu seu objetivo."
Esse segmento de Mips, também conhecido como OTC (over the counter, na sigla em inglês), representa cerca de 30% do total de medicamentos comercializados no país, de acordo com a Associação Brasileira da Indústria de Medicamentos Isentos de Prescrição (Abimip).
Com a resolução, os usuários de medicamentos passaram a gastar mais nesse período. "O balconista empurra o medicamento que quiser, sem o direito de escolha do consumidor", afirmou Aurélio Villafranca Saez, diretor de relações institucionais da Abimip. "Se a Anvisa reverter, será muito positiva para o mercado. O consumidor vai ter oportunidade de comparar preço."
Os laboratórios com foco em produtos isentos de prescrição também estão em negociação com a Anvisa para a inclusão de novas classes terapêuticas no segmento. Atualmente, fazem parte dessa categoria os analgésicos, produtos fitoterápicos, medicamentos de uso tópico (como pomada, por exemplo). Na lista de pedidos de inclusão estão produtos para antialopécia (combate cálvice, por exemplo), antiácidos, antieméticos (combate enjoos), antifúngicos, anti-histamínicos (combate alergia), antissépticos, descongestionantes e expectorantes.
Segundo Barbano, essas discussões estão em andamento, mas ainda não avançaram. "Não podemos gastar nosso tempo e esforço em discussões sobre o que são ou não medicamentos isentos de prescrição. Temos de inverter a pauta e fazer um esforço em um país grande como o nosso sobre a venda de medicamentos com prescrição sem receita. Estamos buscando o apoio das indústrias farmacêuticas."
Por Mônica Scaramuzzo | De São Paulo
Fonte: Valor Econômico (25.07.12)