A operação-padrão de fiscais da Receita Federal e a greve dos funcionários da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) estão afetando o escoamento de mercadorias nos portos e levaram setores e federações da indústria à Justiça. A Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) entrou ontem na Justiça Federal com mandado de segurança contra a Anvisa para liberar toda a carga retida pela autarquia em portos, aeroportos e entrepostos comerciais fiscalizados pela agência. Medida semelhante havia sido tomada quarta-feira pela Federação das Indústrias de Santa Catarina (Fiesc).
Em Santos, principal porto do país, a operação-padrão da Receita provocou um acúmulo de cargas paradas, especialmente de contêineres. O Valor apurou que alguns terminais estão com baixa capacidade para receber novos lotes. Num deles, a folga nos pátios é de apenas 20%. "O ideal é que essa margem esteja em 60%", afirmou a fonte. Os fiscais só estão desembaraçando as cargas em dois dias da semana: segundas e sextas-feiras. Conforme outra fonte, um terminal, que liberava 7.500 processos por mês, já registrou redução de 648 processos. Cada processo diz respeito a um lote de contêineres, cujo volume varia.
O inspetor-chefe da alfândega em Santos, Cleiton Alves dos Santos João Simões, confirmou que os desembaraços estão ocorrendo apenas em dois dias, mas afirmou que nos demais os servidores estão trabalhando em serviços internos.
Em outro terminal de carga geral, o impacto ainda não foi tão brusco como em greves passadas de servidores da Receita. "Aparentemente a operação-padrão não atingiu o sistema de parametrização [que define o canal em que a carga cai]. Tradicionalmente temos 70% dos clientes em canal verde. Os 30% restantes têm levado o dobro de tempo para liberação", contou a fonte. De acordo com o inspetor da Receita, "as mercadorias perecíveis, entre outras, são liberadas com prioridade. Quanto às demais, está sendo seguida a normatização pertinente".
Ontem, a Justiça deferiu pedido do Sindicato das Agências de Navegação Marítima do Estado de São Paulo (Sindamar) determinando que a Anvisa em Santos adote todas as medidas necessárias para garantir a continuidade de serviços públicos prestados, independentemente do estado de greve. O diretor-executivo da Federação Nacional das Agências de Navegação Marítima (Fenamar), André Zanin, disse que a Anvisa já vinha cumprindo a emissão de livre-prática (autorização para o navio entrar no porto) em Santos. Mas espera que agora haja mais celeridade. Ontem, 83 navios aguardavam para entrar no porto de Santos e 41 estavam atracados.
Em Santa Catarina, a Fiesc espera que o pedido de mandado de segurança seja julgado ainda hoje. A entidade reclama principalmente da demora no desembaraço de produtos ligados à saúde. Os outros setores, segundo o presidente Glauco José Côrte, se queixam mais do atraso na liberação das importações em função da operação-padrão da Receita no porto de Itajaí. "Eles estão liberando cada hora um contêiner para uma empresa. O que está ficando crítico é o espaço no porto, já que as áreas onde ficam as mercadorias, estão praticamente no limite."
Depois de entrar com mandado de segurança em São Paulo, a Aliança Brasileira da Indústria Inovadora em Saúde (ABIIS) vai entrar na Justiça em mais cinco Estados hoje. O pedido de liminar será para garantir que os funcionários da Anvisa atendam aos pedidos de liberação de mercadorias do setor.
De acordo com Carlos Eduardo Gouvêa, presidente da associação, os empresários que importam produtos para a realização de diagnósticos e reagentes químicos usados em bancos de sangue são os mais prejudicados. As maiores dificuldades para o desembarque estão sendo encontradas em portos e aeroportos de Santa Catarina, Paraná, Rio, Minas e Espírito Santo, além de São Paulo. Segundo ele, as empresas trabalham, em média, com um estoque de um mês, que está em um nível baixo. "O setor de saúde está preocupado. Pensávamos que fosse ser uma greve de alerta, mas está ganhando força a cada semana", diz.
João Maria Medeiros, presidente do Sindicato Nacional dos Servidores das Agências Nacionais de Regulação (Sinagências), disse que está sendo mantida "a liberação de produtos excepcionais, principalmente os ligados à saúde, ou aqueles que possuem mandados." Segundo Medeiros, 70% dos servidores das agência reguladoras estão com os braços cruzados.
No Rio, a medida foi impetrada pelo Centro Industrial do Rio de Janeiro (Cirj), ligado ao sistema Firjan e que reúne cerca de 4 mil empresas industriais e comerciais. Caso a Justiça acate o pedido da entidade, a Anvisa será obrigada a liberar toda a carga referente a essas empresas. A Firjan não sabe estimar qual o volume de carga total retido no porto do Rio de Janeiro. Segundo a entidade, porém, a principal reclamação é feita pelo setor farmacêutico. (*Para o Valor, de Santos)
Por Rodrigo Pedroso, Fernanda Pires*, Rodrigo Polito e Francisco Góes | De São Paulo, Santos e do Rio
Fonte: Valor Econômico (03.08.12)