A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reduziu em 50% a multa devida pela Ril Brasil Comercial e Importadora (representante oficial da marca Reebok no Brasil) a Aurélio Fernandez Miguel, atleta ganhador de duas medalhas olímpicas. As partes celebraram contrato de autorização para uso de imagem, o qual foi parcialmente descumprido pela empresa.
Conforme combinado, o contrato teria duração de um ano, prorrogável automaticamente por mais um (salvo expressa manifestação de uma das partes, até 30 dias antes do término do primeiro ano). O atleta deveria receber R$ 66.960 por ano, em 12 parcelas mensais de R$ 5.580 (valor bruto). Para as hipóteses de descumprimento contratual (por qualquer das partes), foi fixada multa também no valor de R$ 66.960.
Embora tenha ocorrido a prorrogação automática, que já era prevista, a empresa cumpriu suas obrigações somente até o mês de junho de 1998. Diante disso, o atleta ajuizou ação de rescisão contratual, acrescida de cobrança das parcelas não pagas.
Rescisão
Em primeira instância, o pedido foi parcialmente concedido. O juiz rescindiu o contrato e condenou a empresa ao pagamento da multa prevista no contrato, no valor de R$ 66.960. A empresa apelou ao tribunal de segunda instância, que deu parcial provimento ao recurso, apenas para reduzir a verba honorária.
No recurso especial direcionado ao STJ, a Ril Brasil alegou violação ao artigo 924 do Código Civil (CC) de 1916, segundo o qual, "quando se cumprir em parte a obrigação, poderá o juiz reduzir proporcionalmente a pena estipulada para o caso de mora, ou de inadimplemento".
Afirmou que o atleta recebeu, durante 18 meses, o pagamento mensal de R$ 4.500 líquidos, ou seja, o contrato foi parcialmente cumprido durante o ano de 1998. Por esse motivo, entendeu que a multa contratual não poderia ser aplicada por completo. Pediu então a sua redução para 50%.
Para o ministro Paulo de Tarso Sanseverino, relator do recurso especial, "a regra contida artigo 924 do CC/1916 deve ser interpretada no sentido de ser possível a redução do montante estipulado em cláusula penal, sob pena de legitimar-se o locupletamento sem causa".
Faculdade ou dever?
Ele mencionou que o dispositivo, pela redação contida no código de 1916, facultava ao juiz a diminuição proporcional da cláusula penal no caso de descumprimento parcial da obrigação, para não violar o princípio que veda o enriquecimento sem causa.
Explicou que o novo Código Civil, de 2002, passou a determinar que o juiz deve (no lugar de pode) reduzir equitativamente a penalidade prevista no contrato, se parte da obrigação já tiver sido cumprida, ou se o montante da pena for manifestamente excessivo.
Segundo o ministro, os dois dispositivos têm certa correspondência, porque mesmo antes da entrada em vigor do CC/2002, tanto a doutrina quanto a jurisprudência evidenciavam evolução na interpretação do artigo 924 do CC/1916, no sentido de reconhecer como um dever judicial, e não apenas como uma possibilidade facultativa, a redução da cláusula penal nos casos mencionados.
Para o ministro, ainda que o contrato tenha sido celebrado antes da entrada em vigor do novo CC, a regra anterior deve ser interpretada de modo a recomendar ao juiz a redução da cláusula penal, para preservar a função social do contrato, afastando o desequilíbrio contratual e o enriquecimento sem causa.
Necessidade de redução
De acordo com Sanseverino, tendo sido comprovado que houve cumprimento substancial do valor devido no segundo período de validade do contrato, é "inegável a necessidade de redução do montante contido na cláusula penal".
"A redução deve ser no percentual de 50%, pois o contrato celebrado entre as partes pelo prazo de um ano fora renovado automaticamente pelo mesmo período, sendo rescindido na metade do segundo ano", disse.
A Terceira Turma deu parcial provimento ao recurso especial para determinar a redução da multa para 50% do valor previsto no contrato, com incidência de correção monetária e juros de mora. Cada parte deverá arcar com metade das custas e com os honorários do procurador da parte contrária.
Fonte: Superior Tribunal de Justiça - STJ (03.08.12)