O Shopping D&D, em São Paulo, está promovendo uma ofensiva às lojas de decoração concorrentes que usam o termo "bota fora", registrado como marca pelo shopping no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), em abril de 2007 - expressão foi inscrita sem hífen no órgão. O empreendimento tem notificado extrajudicialmente as empresas do setor e propôs duas ações judiciais, uma delas em fase inicial, outra que já resultou em acordo.
Na tentativa de reverter o registro da expressão, usual no mercado para se referir a liquidações, a loja de móveis Sylvia Design (SD Comércio de Móveis e Decorações) entrou com um pedido de nulidade da marca no Judiciário. A 10ª Vara Cível de São Paulo, porém, negou a liminar por entender que o shopping seria o detentor da marca e teria o registro dentro da legalidade.
Segundo o processo, a SD Comércio de Móveis alegou que houve o registro indevido do termo "bota fora" como marca, pois seria somente utilizado como propaganda, o que é vedado pela Lei de Propriedade Industrial - Lei Federal nº 9.279, de 1996.
A defesa do shopping alega no processo que a marca não é usada unicamente como propaganda, mas também como denominação de evento de notório conhecimento entre os especialistas na área de design e decoração. Além disso, afirma que já teria prescrito o prazo de cinco anos para que haja a contestação do registro de marca.
O juiz da 10ª Vara Cível de São Paulo, ao analisar os documentos apresentados, concluiu que a marca "bota fora" é empregada para nomear evento de venda de móveis e objetos de design, realizado nas dependências do Shopping D&D, "o qual contou, inclusive, com alvarás de licença expedidos pela prefeitura do município de São Paulo para a realização e funcionamento", diz a decisão. Segundo o juiz, não há que se falar na ilegalidade do registro da marca. Por essa razão, a liminar não foi concedida.
O advogado Luiz Fernando Afonso, sócio do Marques Rosado Toledo Cesar e Carmona, que defende o D&D, afirma que o shopping tem notificado todas as empresas do setor que se utilizam desse termo "bota fora" e que tem entrado com ações, caso não retirem. "O que se teme é que essas lojas possam confundir o consumidor, já que o termo é conhecido e associado nacionalmente ao evento do D&D". O advogado afirma ter ajuizado uma ação em Diadema, grande São Paulo, contra uma loja, que resultou em acordo e que está com a petição inicial pronta para entrar com uma nova ação judicial contra uma grande loja de móveis de São Paulo, que teria utilizado a marca indevidamente. O shopping ainda detém o registro do termo "bota fora D&D", também concedido em 2007 pelo INPI.
Na opinião do advogado Franco Mauro Russo Brugioni, sócio do Raeffray Brugioni Advogados e especialista em propriedade industrial, o termo "bota fora" não seria uma marca passível de registro. "Esse termo sempre foi usado em todo tipo de liquidação e nunca houve um furor a respeito disso". Segundo Brugioni, como é de domínio comum, a Lei de Propriedade Industrial veda essa possibilidade no artigo 124 da lei. O dispositivo diz que "não são registráveis como marca sinal de caráter genérico, necessário, comum, vulgar ou simplesmente descritivo, quando tiver relação com o produto ou serviço a distinguir..."
O INPI, por sua vez, informou por meio de nota enviada pela assessoria de imprensa que só poderia comentar decisões judiciais após citação e análise interna. Porém, esclarece que um termo popular "pode ser registrado, caso ninguém o tenha feito antes para aquele segmento de mercado, desde que não tenha relação direta com o produto ou serviço para o qual se destina, conforme dispõe a Lei de Propriedade Industrial".
Procurada pelo Valor, os responsáveis pela Sylvia Design e o advogado da empresa no processo, Paulo Balsi Soares, não retornaram até o fechamento da reportagem.
Por Adriana Aguiar | De São Paulo
Fonte: Valor Econômico (21.01.13)