FERNANDO RODRIGUES
DE BRASÍLIA
O advogado-geral da União, ministro Luís Inácio Adams, defendeu ontem "regulamentar" a atividade do lobby no Brasil. "Pode ser um sistema de qualificação das demandas da sociedade", disse.
Em entrevista ao Poder e Política, projeto da Folha e do UOL, Adams afirmou ter tomado providências após a deflagração da Operação Porto Seguro, na qual a Polícia Federal descobriu um sistema de tráfico de influência para produção de pareceres dentro da Advocacia Geral da União.
Indagado se essas medidas seriam suficientes para barrar a promiscuidade dentro da AGU, respondeu: "Evidente que não. Não posso achar que uma norma vai resolver todo o problema do ponto de vista desse tipo de influência".
Para o ministro, o problema não está em receber pessoas interessadas nos pareceres, que entregam memoriais sobre o tema. "O problema é você, como servidor usar a sua função para promover o interesse particular. Aí é diferente".
Adams disse ser necessário reconhecer que "a sociedade tem grupos de interesse (...) faz parte do processo democrático, o Estado não se isola". O problema é como se dá essa interação. "Quando você usa mecanismos inadequados, impróprios e, às vezes, criminosos, para fazer valer o seu interesse".
Aí entra a regulamentação do lobby. "O lobby existe nos Estados Unidos regulamentado, existe em vários países", afirma o ministro. "É uma forma que a sociedade tem de, através de pessoas qualificadas tecnicamente, poder estruturar propostas e levar ao Estado".
Por que então os projetos dentro do próprio governo sobre regulamentar o lobby não andam? Adams responde que "aí é uma questão do processo político". Diz não saber "quais são as matrizes que movimentam isso agora".
A presidente Dilma Rousseff teria uma opinião formada sobre regular o lobby? "Não conversei com ela sobre isso", diz Adams, que fala quase diariamente com a presidente.
Ontem, antes de a entrevista terminar, seu assessor escreveu num quadro no estúdio onde era realizada a gravação: "Dilma te chama no Alvorada c/ urgência!". Assim que terminou a entrevista, Adams seguiu para o encontro.
O ministro enfrentou dentro da AGU uma sindicância que apontou "evidentes indícios" de irregularidades que teriam sido cometidas por ele próprio em conexão com os fatos do inquérito da Operação Porto Seguro -que indicou a existência de uma quadrilha negociando pareceres em benefício de empresas privadas.,
A Corregedoria Geral da AGU preferiu recomendar o arquivamento do caso. Agora, tudo está com a presidente da República, que pode ou não determinar a abertura de nova investigação contra Adams. Ele nega ter cometido infrações.
Quando se refere ao caso, o ministro demonstra confiança sobre a decisão final de Dilma. "Eu já comuniquei a ela, pessoalmente, o resultado da comissão. Mas eu não questionei ela sobre isso. Acho que não é a minha função. Essa é uma decisão dela, e a presidente, evidentemente, vai emitir seu juízo no momento em que ela tiver os elementos e a análise adequada".
Uma das ações da AGU para conter o tráfico de influência será a publicação das agendas de audiências, com a lista completa de quem é recebido e os temas abordados.
A divulgação desses registros terá ser imediata, diz Adams. "Não existe reserva nesse tipo de informação". No site da AGU, entretanto, tais dados ainda não estão à disposição dos interessados.
Acesse a transcrição completa da entrevista.
Fonte: Folha de São Paulo (06.03.2013)